MARANHÃO, Haroldo. Flauta de bambu. Rio de Janeiro: MOBRAL, 1982. 64 p.

roía o couro do amigo. O resultado deve ter sido emocionante, porque mal o obteve se enfiou num carro a catar o homem das leis, a quem foi encontrar cumprindo seus encargos forenses. Foi logo lhe comunicando, sem poder ocultar o júbilo, que as perebas eram raríssimas perebas, as maiores perebas do mundo! Entrou a detalhar explicações, que não saberia eu resumir, e mediante as quais ficava a saber-se que o germe da apostema era bicho difícil de capturar nos bípedes, pois de ordinário prolifera nos quadrúpedes. A situação permanece assim: a vítima teve as mãos fotografadas a cores e Evilásio Altamirando exibe as cópias como peças de museu. A fortuna, enfim, concedeu-lhe a felicidade de pôr-lhe sob os olhos as maiores perebas do mundo. Sabe-se que um cientista alemão, avisado pelo seu colega Alta– mirando, está vindo por aí para manusear as feridas insignes. O proprietá– rio destas já não sabe se deve considerar-se um homem feliz ou simples– mente um homem apepinado pelas comichões que dia e noite o afligem O ,médico proibiu-lhe a administração de qualquer remédio, pois poderá suce- der o infortúnio de que murchem as perebas e cicatrizem. Duas vezes ao dia pelo menos defronta-se Evilásio Altamirando com as mazelas maravi– lhosas e deixa ficar-se sorrindo, como se ao invés de feridas o advogado mostrasse na concha da mão pepitas de ouro. Cochicham-me que o portador da enfermidade começa a sobressaltar-se por dúvida insidiosa, e pela qual vacila em admitir se estarão mais enfermas suas mãos ou as idéias do esculápio. Registro o fato mas não o avalizo, pois seria rematada imprudência deste repórter, que mal e tolamente costura suas palavras, imiscuir-se em perigoso território: o território das perebas e dos miolos moles. 36

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