Estrela do Norte 1865
.4 ESTRELL.I. DO NORTE. ·188 Hosalia ou O PODE!l DO AMOR FILIAL. I A MAI E A FILHA, ( Continuação. ) Ros alia àeu gritos de espanto e de dôr, vendo sua poJ)re mãi inanimada ; e ten– do-lhe cerrado brandamente os olhos, ca– hiu n'um desespero triste e silencioso. Foi nes te estado que .ella acompanhou a Veronica ao jasigo final. Jeronimo que ha muitos dias não havia reapparecido, decidiu-se a en trar outra vez na cabana. Rosalia foi-lhe ao encontro soluçando : tanto a orphã necessitava de consolação! Mas nem caricias nem animações obteve do pai, em cujo semblante, mais que nunca, ostava impressa a brutalidade. Facil era de notar que á algum se dava nelle uma lucta interior e violenta. Au– sentando-se de casa passava noutes in– teiras na devassidão, procurando assim abafar a poderosa voz da con.sciencia. Quanto á sua profissão de pescador, des– presava-se elle inteiramente depois da morte de Veronica. chorava noite e dia pela mãi a desgra– çada menina, e até parecia não notar a completa miserla em que vivia. Condoí– dos pela presença de tão grande infortu– nio consolavam-na os caritativos visi– nhJs, e lhe faziam aceitar parte de suas comidas. Jcronimo foi por seus excessos abys– mado em breve em profunda miseria. Preciso foi vender-se sua pobre cabana, e 0 bocado de terreno contiguo a ella, fruc– to do trabalho e economia de Veronica, para pagar as m~merosas d_ividas que el– le havia contrah1do. Jerommo tomou lo- ~ um partido: possuía uma bella voz, g t cava soffrivelmente gui!arra. Pens.ou e na occasião da despedida derramou bas– tantes lagrimas. Eil-os percorrendo juntos, cidades e aldêas. Deleitava Jeronimo com sua gui– tarra e realisava uma boa receita; mas sobretudo encantava os ouvintes a voz sonora e doce da pobre Rosalia, obrigada a acompanhar os cantos do pai. o resul– tado comtudo estava longe de enriquecer a Jeronlmo : a necessidade em que se achava de violentar seu caracter brutal, a alegria que devia fingir irritavam mais que nunca este malvado, que despendia á noute em devassidões o fructo amargo do trabalho diurno. Era Rosalia muitas vezes victima do genio irascível do pai; mas a lembrança das dôres e do amor de sua piedosa mãi lhe dava forças para sup– portar tudo, e contra os ataques do vi– cio preservara-a a memoria desta mu– lher, que lhe tinha dado o exemplo d'u– ma sublime abnegação. Todos os dias rogava ella a Nosso Senhor que inspiras– se melhores sentimentos no coração de seu pai, cujo ímpeto e violencia procu– rava moderar por uma inalteravel bran- dura. Promettia nunca separar-se delle, considerando que n'um ou n'outro dia elle podia cahir no mais cruel abandono. Uma manhã achava-se Jeronimo e Ro– salia no jardim d'um botequin!, que fi– cava á pequena distancia da cidade de Latania. N'aquelle instante tinha acaba– do a feira, e a receita dos ambulantes ha– via sido maior que de ordinario. Ao lado delles achavam-se um peloti– queiro e sua mulher. Nicolas, assim cha– mava-se elle, era um habil gatuno, que•. como Jeronimo ia de feira em feira exer– cendo seu triste offlcio. Havia elle nota– do que o bolso do cantor estava bem re– cheado, e convidou-o para jogar. Ceden– do o pai de Rosalia á sua paixão domi– nante, acceitou com ancia a partida. A menina retirou-se e foi assentar-se n'um banco á sombra de altas arvores. O menino Jorge, filho do estalajadeiro, correu ao jardim, e trou.xe flores de que formou Rosalia alguns lindos ramalhetes. e . 0 em abraçar a profissao de musico &~bulan te, .e com effeito, era e~la be_m conducente a seu caracter de ~ad10 edis– sipado. .Assiqt metteu elle mao obra, e disse a nosalla que se prep_a~asse para a partida. Prevendo '\Hna. v1S1nha tudo que a desgraçada memn~ ia ~ofl'rer, su~– plicou a Jeronimo que Ih a dmxasse, obri– gando-se ella á adoptal-a como filha. Com grande surpresa de todos i:ecusou o_pes– cador separar-se de Rosaha, que vm-se assim obrigada a abandonar esses log3:– res quo Jhe eram tão caros, e onde d~~– xava os preciosos r es tos de sua bôa ma1; -Mas, disse-lhe então o pequeno Jor– ge, quantos ramalhetes vais fazer? Um dois, tres, quatro, cinco. Porque não fi~ zeste de todos estes um só ? - Cada um destes ramalhetes tem seu destino, disse Rosalia ; o que formei de lyrlo e de rosas é p~ra Nossa Senhora; os narclsos e o cravo sao para Santa Rosalia de Palermo minha boa patrona; as sau– dades e as rosin]1as brancas, off'ereço-as á minha cara m~i ; o~ golvos vou levai-os a meu pai ; os Jasmms e as boninas são para ti.
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