MARANHÃO, Haroldo. Chapéu de três bicos. Rio de Janeiro: Estrela, [1980]. 43 p.
tenso,preocupava-me o sepultamento da mão, a sua certidão de Óbito, sem a qual não h~ veria funeral veraz. Na praia, clandesti namente, num subúrbio à noite, ou no relva do de jardim público, repelente a idéia p~ recia-me, porque a mão, rompida do todo, corpo era. Mais me afligiam as implicações jurí dicas do Óbito. Porra: não se devia jogar a mao pela janela, a mão desgarrada e n~ grana rua, sujeita a ser pisada, atropel~ da como frango batido na grelha. Atirá-la pela lix~ira ligeiro seria; enterrá-la sem rito nenhum, assim como quem cava bura coe enterra um rato:sacanagem. Seria gro~ ~ sa sacanagem com a mao. Puta que a pariu: seria sacanagem sem tamanho. Caralhoporr~ pica: a mao, a minha mão, que é minha, era minha, por ela clamo e postulo: merecia compatíveis exéquias. Porque houve ou não houve um Óbito, merda? A mão morreu, al i ás há muito tempo que vinha morrendo; os de dos não se mexem, murcharam como pau deve lho engelhado. vê-se que está encarquilha~ do-se, não é que feda, não apuro o cheiro, mas tangível é a precipitada forma ção de espécie de capa enrugada e lívida, quando ainda há pouco era pele viva, embora cornos 44
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