CELINA, Lindanor. Breve sempre. Belém, PA: Governo do Estado do Pará, 1973. 167 p. ISBN (broch.).
"Madame não quer ver coisas especiais?" Da primeira vez, indagou: "Que coisas, monsieur? Ele, baixinho, cúmplice, cúmplice: "Homem com homem, mulher com mulher, mu– lher com animais" - o olhinho dele faiscava, te juro. - E que lhe respondeste, menina? - Nada, merci, monsieur. E segui em frente. Não, não fui. Depois, era caro demais. Súbito rumor de vozes no bar, alteradas vozes lá den– tro, eram uns marinheiros, exaltavam-se, "mana, será a nossa tão esperada encrenca?" Haviam jurado não voltar sem um bom rififi, não se contentavam com os pederastas se acarinhando, com as :mulheres fazendo convites osten– sivos, nem com o caften que as fiscalizava, às suas meni– nas e, dando pela falta de uma, num instante virou bicho: "Cadê Marielle?" - as outras, se mijando de medo, igual– zinho num filme de Raymond Pellegrin, só faltava a bofe– tada, será que ele vai dar a bofetada na cara da môme? Mas o maquereau só rosnou qualquer coisa, quando as outras, três ou quatro, apavoradas, lívidas e lindas, res– ponderam, trementes: "Ela está cansadíssima esta noite." "Mer<le, alors! - que ele falou - e vocês então, ao tra– balho, circulem, ao trabalho!" - Viste? Viste?! - as três vibravam, então não era mentira nenhuma, era vir a Pigalle, ter uma paciência, andar, escutar, saber ouvir . - Mas isso existe em todo canto - concluía Franca - só não é reputado. Pois agora, o berro, não mais disputas, mas um berro: "Foi para isso que meu pai morreu na Resistência - urrava o marinheiro - por uma puta como você!" - e a garrafa já voava? Deus, um crime, elas por testemunha, lá se iam para o distrito - a moça, o pivot, agachada por detrás do balcão, a patroa protegendo-a: "Se acalme, moço, se acalme, nom d'une pipe!" A custo dominaram o violento, dizia-se explorado pela mulher, explorado - que ele ur– rava -, mas como? - pela mulher que já se escapulia, saía por uma outra porta, enquanto a patronne, os garçons, tentavam sojigar o furioso que contava com mais uns quatro ou cinco marujos do seu lado. "Pelo amor de Deus, implorava a dona do bar, olhem os flics, a polícia, vocês me desgraçam!" O garçom que servia as três, veio lá de dentro, melífluo e tremendo um pouco: "As senhoras não 94
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