CELINA, Lindanor. Breve sempre. Belém, PA: Governo do Estado do Pará, 1973. 167 p. ISBN (broch.).
muito dinheiro, fez menção de abrir a bolsa, ele riu, já em blague: "Merci, Mademoiselle, hoje estou rico." Riram, e foi bom, aliviou em parte o peso que ambos traziam no peito. Levantaram-se, seguiram pelo bulevar, sós no mun– do. Uma hora da manhã. Sós, no falso éden momentâneo, onde já se sentiam intrusos. Na esquina do Bulevar Pasteur com o de Vaugirard, ela teve um susto, quase um grito abafado, os olhos des– mesurando: "Ali, na sombra, na porta do hotel, pois não é o Cheng!" "O seu cambojiano?" - voz dele traía um ciúme? Mas que novela de quarta ordem, esse menino é doido, doido. Eles vinham de mãos dadas, passou o enge– nheiro brasileiro, morador do mesmo andar, que iria pen– sar, que ela tinha um amante. Mas enfrentar o cambo– jiano à uma hora da manhã, ele na certa iria chorar: "Você e seu padre, só amizade, hein? Eu vi, vi, vocês são amantes, a-man-tes, et moi não passo de um escravo, você é de uma crueldade." "Je suis votre captif" - que ele lhe dizia, mal levantando os olhos, nos corredores da Aliança, em direção ao refeitório, ou justo na saída da aula. "Mas Cheng, sou noiva, meu noivo um dia vai chegar, Cheng, eu lhe quero tanto bem, não estrague isso, lhe peço." Agora está ali, na sombra da porta do hotel, desde que horas, tocaiando-a? Peter falou: "Vamos lá, os dois." "Era só o que faltava. Fique aqui. Melhor, vá-se embora, eu sei como falar com ele." "Não, isso é que não. Se não quer que a acompanhe, fico, até vê-la entrar, fechar a porta, esses orientais, nunca se sabe." Na missa, cedinho, manhã seguinte, se acusava: "Por que lhe disse do meu amor? Por quê? Fiz mal, eu sei. Porém ela estava tão infeliz. É a culpa desta cidade, desta Paris que tanto amamos. Desta doença que me faz tão frágil. Desculpas, desculpas. Mas então amar é isto. Estas mãos, que tocaram o rosto dela, que ela cobriu de beijos e de lágrimas, vão segurar teu corpo, Senhor, sim, por que não, se não estou em pecado? E em pecado não cairei, porque Tu me sustentarás, Angela não é uma perdida, é apenas uma moça solitária nesta cidade cruel e, adorável." "Notre cher Paris - que eles se diziam, cada vez:que saíam, juntos, e contemplavam as ruas, os eais do Sena:, e mesmo os mendigos da Rua Mouffetard, os clochards e as elo,.. chardes trocando injúrias, palavrões. Viam tudo com olhos encantados" mas iá numa tristeza, pondo em tudo um
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