CELINA, Lindanor. Breve sempre. Belém, PA: Governo do Estado do Pará, 1973. 167 p. ISBN (broch.).
Subiu às carreiras. Angela na porta do quarto. - Você ia sair? Assim tão cedo? Aonde que vai? - Ao aeroporto. Entraram no quarto, ela pegou o telegrama de cima da mesinha de cabeceira e lhe deu, sem uma palavra - lembrou-se, no momento, de que ele não lia o português, mas aquilo era tão claro, necessidade alguma de explicar, claro demais . - . . .Ele? quando? - Mas agora, estou te dizendo. É agora que ele chega, dentro de duas horas, no máximo. - Duas horas - Peter completamente aturdido . . . mas nós temos de qualquer forma duas horas, Angela, temos ainda esse tempo . . . - Mas infeliz, não compreendes que tenho de partir neste momento, devo ir até à Praça da Itália, tomar o ônibus para Orly, tu estás me ouvindo? Ele ficou palidíssimo. Vinha-lhe aos poucos uma es– pécie de resignação fanática, o ar messiânico da hora em que se separaram em Amsterdam, hora de sua partida para Deurne, via em tudo aquilo, sem dúvida, a mão de Deus, não se revoltava, não reagia, nenhum ímpeto, nem um movimento para disputá-la ao outro (c'est de la rnerde), e acabou por confessar, num cansaço: "E eu aqui desde ontem, telefonei, você havia saído, a camareira me tomou por não sei quem, acabou por me dizer umas coisas, aos gritos." - Tu?! Tu estás em Paris desde ontem! - Angela perdia a cabeça, louca, louca. Ah, é demais, a que ponto se pode ser infeliz, é demais, que fizemos para merecer isto, me diz? Você em Paris ontem à tarde, então foi você quem telefonou, mas, em nome de Deus, porque não insistiu, fiquei sozinha toda a noite, te escrevi uma carta imensa e sem nenhum sentido, estava doida, perdida, o telegrama, eu encontrei quando voltei da rua, Bete me deu, a carta que te escrevi, olha, toma (abre a bolsa, tira a carta, dá a ele), ia pôr no correio agora mesmo, aí defronte. Mas me diz, por que você não insistiu, por quê? Afinal, voltei para casa cedo, oito e meia, teríamos tido a noite, Peter! · - Estava cansadíssimo, e depois, disse a mim mesmo: teremos tempo (sempre o mesmo, oh, sempre o mesmo, teremos tempo), Angela voltará tarde, deve estar com sua 164
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