CELINA, Lindanor. Breve sempre. Belém, PA: Governo do Estado do Pará, 1973. 167 p. ISBN (broch.).
- Mas um montão de vezes, a última creio que tu Ja vinhas aí pelo . bulevar, foi justo antes de entrares, a última, quando lhes casquei a língua com vontade ... digamos, entre oito e meia e nove horas, se eu soubesse que irias ficar nesse estado, que o telegrama te faria semelhante efeito, eu lhes teria pedido que viessem, sair um pouco contigo, escuta, e a família francesa, teus ami– gos que te convidam vez por outra a St. Fargeau, queres que lhes telefone? Me dá o número. - Mas não, mas não. Não compreendes que desejo é ficar sozinha - diziam os gestos fatigados da outra. - "Vai indo, mana, te agradeço, mas isso passa, tens razão, olha, não preciso nem de comida, talvez mais tarde, se me der fome, desço, vou ao bar, por ora nada, francamente, nada, mas sossega, de qualquer forma dormirei, tomarei a pílula, prometo, pronto" - esforça-se por sorrir, para que a amiga se vá, quero ficar só, só escrever, escrever! Escreveu uma carta que não acabava mais. Vou regis– trá-la amanhã, à hora em que sair para o aeroporto, mando expressa, com vinte e quatro horas ele recebe. Era uma carta compridíssima, mas dizia quase nada, tudo sem nexo, sua cabeça oca, as idéias se repisavam, tudo era acabado, acabado, tudo não passou de um sonho, o mais bonito sonho da minha vida, o mais belo que me deste, Peter (preciso telefonar, saber o horário desse avião ainda esta noite, e me informar sobre o ônibus, devo tomar o ônibus na Praça da Itália, é isso, para se ir a Orly, Praça da Itália) . Dormiu sob o efeito da droga, mas levantou cedo. Tomou banho, arranjou um pouco o quarto. Estava um sol, mas sentiu frio, preciso de uma xícara de café bem quente, ou um grogue, um chá que me esperte. Já havia posto o tailleur e estava escovando os cabelos, quando o telefone chamou, no andar inferior, ainda algum dominicano, mas a esta hora (em geral essa raça dorme tardíssimo, só acorda pelo meio-dia)? Desceu. - Ângela, sou eu. - Peter?! Onde que você está? Em Amsterdam? Em Deurne? - Mas estou aqui embaixo, no seu hotel! Posso subir? - Você?! Você aqui (Ângela gritava)?! - Claro que sou eu. . . mas o que você tem? Não está doente, não? Chego já, estou subindo! 163
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