O Liberal: jornal da amazônia. Edição n° 22.571. Segunda - feira, 05 de fevereiro de 1990.

- - --,--~---------::::::::.;~~ ~~--~--/ 5 de ~vereTro de 1990 OIS SEGUNDA-FEIRA e1euoTECA PUSL,CA DO PARÁ 1 Seccao de, Ob•e-, do Par• . -~-º-- L!BERIL iu~~t~;~d~~~s~~:i:fs~: :o';~ó:~~eo d10 7, quarto-feiro, às 2d horas no ,,bar-teatro Morocoibo, no musi~ol Mancho de Boton''. com O otriz e Ci'f) Pi~(<(/)º . cantora Suzy_<?uintello. Num misto de te_ª!'º e mus,co, Suzy vai mostrar mus,cos de Billy Holliday, Caetano Veloso e Cozuzo, entre outros. ' ra aor1J e o ano de 1988 come- • E çara lfmido. Havia uma preo- t cupação no ar, além 1esta, 1 havia um medo pecuhar a - uma estréia. Um artista que j sobe pela primeira vez em um palco pa· j ra apresentar-se a uma seleta a_uc!iência, '" sente esse Crio de medo, um fno interno que só não sentem os incom~tent_es. Na Fundação Carlos Gomes, havta, mJStura• do ao medo, ao frio, um "frisson" que de– notava uma alegria contida, timida, mas uma alegria. Formava-se a orquestra de câmara da fundação. A orquestra aben• ~da pelas mãos do maestro Carlos m;:ra Glória Caputo, aquele instante era mais que a concretização de um _so– nho, era sim o inlcio ~e um outro 1!1a1or, significava que aproJUmava-se mais um pouco, da realização da for_mação de uma orquestra sinfônica. Um dia eles chega~ a ter uma, mas a orquestra de câmara Já representa um grande orgulho. Bastana dizer que quando acompanhavam Antoruo dei Claro, este proferiu: "Tenho a impres– são de estar tocando na Sulça". Mas não é só isso que a pequena or– questra, iniciada com oito alun~ e coor– denada por quatro professores vmdos da Bulgária, acumulou. Ela acumulo~ várias menções honrosas, verbais ou nao, ac~– mulou o sucesso de levar um grande pu– blico às suas apresentações e, principalmente, conquistou o prestígio de :~:r,~~cd:S~:'1~!~1::~:::-:~~ a professora Glória Capulo, não mencio– narem o fato com facilidade. ~ porque eles compreendem que prec_isam ter ::1~ J>::i~~!To';~e~~~::~h:!i:;: ção. Mas já são jovens músicos continuan- do ~ ~~~~~:1~~~:i:~i,nf~:~~al · 1sso em terras brasileiras, principalmen– te nas do norte do pais. Para começar é surpreendente notar que os instrumentos · por eles utilizados não são os melhores, tão pouco estão em bom estado para o exercício pleno da música. Seria incrível se pudessem contar com instrumen~ ma1S gabaritados e em ~el_hores condi– ções. o entanto, como mus1cos que sen– tem o fervor da criação e sem ter condições financeiras de adquirir um bom violino, um bom cello, utilizam-se dos que possuem, criam se não os possuem e se– guem de ônibus, como na maioria das via– gens que fizeram para levar o ''som" deles para ~\?:i~esdeºià1':~~!1~i~~tübro de 88, rumo ao Rio para uma apresenta– ção na Sala Cecilia Meireles. "O público que compareceu gostou muito. Não_ foi um grande público em face da pouca divulga– çãoque tivemos", Glória explica com oor- . ~~ ~1a~':~~'.~~~m1'a~n:!g~~: 91ies, hotéis de 3, 2, 1, uma ponta de estre– . la mas fizeram o som deles triunfar. até mesmo quando depois de três dias e duas noites de viagem, apresentaram-s_e no dia seguinte, conscientes de que devenam dar de tudo para deleitar a quem os ouvia. E ia o repertório aumentando, alargando-se como um rio que se afasta para o mar. E o número de pessoas que ~~bf!~r~~~~d~o~i J'J;!~~ !~t\~u~~ ram pelas estradas, para o ordeste em 89. Ainda em 88 depois da apresentação na "Cecília Meireles", apresentaram-se no MASP, em São Paulo, é claro. E sem– pre, por onde iam deixavam a marca do Estado do Pará. É curioso observar que a orquestra é única no Brasil por formar-se única e ex- ~:i~:;:~~~~ c!!s~~: si~~ª~~º~~~ pais, por exemplo, importam músicos de outros Estados ou mesmo de fora pa(a formar ocorpo. Ada Fundação Carlos Go– mes, não, é formada por jovens daqui do Pará mesmo. Olhando-se para ela, percebe-se o traço da nossa região. Foi i~~ª!i:1ecfJi,r~iv~~f~d~e!11tr~:~ ~~ reconhecimento de muitas pessoas. Por exemplo: oAntonio dei Claro comentou a execução dos jovens musicistas lá fora e estes foram convidados para se apresen- OGuerreiro eoSanto Aquele que estava condenado a uma ta ra professor (de índio e de colono), da breve aqui na terra devido a graves médico (conhecia os segredos da cura pe:. problemas pll!ffiOnares que sofria, chegou las ervas aprendidos no trato com os in- a viver maJS de 60 anos dos quais mais de dios), orientador espiritual, sacerdote, 40 passou-os no Brasil. Teve tempo mais dramaturgo, poeta e ainda achava tempo do que suficiente para arregimentar toda para, junto com Manuel da Nóbrega pro- '~mTs~~a ~~~~to com as gentes ~% c;;::r~ !c~:;e~º:~a~ a~~~!~~ chie~ 5 :~~~~i~~~o~~~d~ec!~ ~:l~J'; ~~/:~e: 0 p~~l:~o~: o Governador Geral do Brasil Duarte da vencer o próprio Jesui ta dos ideais Costa. A partir daí iniciou um trabalho gi- humanitários da Catequese e 'tg~~~~Jsfc~.nada condizia com sua :.~c:~~'.iíttºa~ed-::eri~~~b~~~ Se hoje fazemos referências à exten- árduo. alo territorial brasileira como algo in- Os arquivos da Companhia de Jesus ~:uít:~:crt~f~~':vfct~~ ::~~~~~lti:rata;,s~~:!ór~~!ii~r; quenez _dos meios de cor:numcação. Ape- que comprovam a incansáve_Iat~açãodes- sar disso, malas, igarapés, nos ta criatura entre nós no pruneiro século caudalosos não representavam obstáculos de nossa colonização. As angústias, desâ- para este homem que buscava energias nimos, queixas, tudo relacionado com o não sesabede onde. Quando Anchieta foi trabalho dele constam nesses arquivos. superior dos Jesuítas no Brasil (em 1578) Aliás é uma das poucas fontes de doeu- tudo estava sob seu controle: o trabalho mentos do século XVI aqui n9 Brasil. da Catequese, as construções de Colégios, Neste período não havia preocupação rtajudaaogentio, etc. tantoquesedi.zque em registrar fatos e acontecimentos, in- de Olinda ao Tietê tudo ficou sob seus clusive nem de assinar obras. lsto, alia- olhos; é comodiz Jorge de Lima: Anchie- do ao gosto que nós brasileiros temos de ta conheceu "todas as picadas de todos os criar mitos foi suficiente para que come- mosquitos, o frio de todos os invernos e o çassem a circular histórias maravilhosas sol de todos os verões. Campeão de nau- sobre a vida de Anchieta: milagres, cu- frágios, virou piloto, aprendendo as ma- rasque realizava corriam de boca em bo- nhas do mar como tinha aprendido as ca; mesmo quando estava no limite de manhas dos índios... Se não fosse Jesuita suas forças e recolhido ao Colégio de Re- poderia ter sido, de tanto lidar com a fili- ritiba, conta-se que ele aparecia ao mes- bustaria de todas as cores, o maior estra- mo tempo em vários lugares, distantes legista entre os gaviões do oceano." entresi - oque era fisicamente impossf- Sua aparência ffsica era terrlvel. vel. Depois de morto estas histórias se Conta-se, inclusive que, em 1578, o então multiplicaram e delas ficou a idéia de que Provincial Tolosa levou-o à Bahia, ao Co- Anchieta era o consolador, o ajudante, o légio de Salvador e quando foi galgando conselheiro, o curador dos males ffsicos. a porta ~o Colégio famoso o magro José Paciência e doçura de Anchieta, (!Uealém da magreza arras- Tem-se a impressão de que Anchieta lava uma batina esmolambada,balançan- era sempre a paciência, a doçura, a com- do acima da corcunda, um irmão que preensão personificadas. Esta impressão f1:Cebeu aquele morto-e-vivo pe_nsou: Q~e fica mais nflida quando se aprecia os poe- virá fazer este camarada aqui? Anchre- mas escritos para ensinar a doutrina cris- ~;f:~:~ ~::,~~~ ~r::ur~~~;;.a~~~: ~q~a~~~-a~i~:dx~~~; :e:ttnd~~~ De que valho eu com esta cara e este cor- assume um caráter relativo· Anchieta po inúti!? a~rda r:ná ~~a~ência foi um ama os lndios porque tem u~a tarefa a dos ma15 ativos provmc1a1s J!,lSUftlls aqui executar tarefa esta que vai lhe garantir :~~d~~:~~~!~~~~ d~\1!~~: ~~:J f~~~to~= ~~~t~~~~: tão sum!das. . ra a Catequese, como uma forma de Aqw ele foi de tudo: além de catequis- conquistar mais ovelhas para o rebanho tar no Teatro Amazonas, patrocinado por estrangeiros que costumam aportar por portos brasileiros em um magnifico na– vio, fazendo turismo. Tudo pago por tais senhores, a orquestra retornará a Belém, a bordo do navio, apresentando-se neste. Profissionais, recebem uma remane– ração dividida por mãos milagrosas de Glória Caputo. "Não há porque reclamar", ela explica, "nós temos de viver a n~ssa realidade. Claro que serra melhor se lrves– semos mais condições, seria fantástico, mas a gente consegue levar desta maneira". E foram, então, já formada a orques– tra por 13 músicos, apresentar-se em Po– ços de Caldas. Encerrariam a apresentação do festival. Estavam as de Deus; reconhecemos que foi funda– mental a defesa que fez dos índios contra a es~a=~ fef~~~~~ J~%j!t~~~c ca- lequisar são muito discutidos em suava– lidade literária dado o seu comprometi– mento com a causa religiosa. Entretanto não se pode negar a simplicidade, singe– leza, espontaneidade de produções como "Do Santlssimo Sacramento" ou ''A San– ta lnes". Neles não há grande variedades de imagens, ao contrário, os elementos em cima dos quais Anchieta constrói sua ima– gfstica são simples e pertencem à reali– dade do lndio. E fica a dúvida : a simplicidadeadvém de resquícios da poé– tica medieval como querem alguns, ou de– corre dos fins utilitários a que se propõe o autor? Já dissemos que o trabalho da Cate– quese não foi um trabalho fácil. As pri– meiras tentativas falharam redonda– mente. E os Jesultas deduziram que an– tes de o lndio compreender a religião ele deveria gostar da religião. Daí passaram a observar os modismos, usos, costumes, gostos e preferências que os índios apre– sentavam para dai extrair as estratégias :~i~~ug~~~~!r~~e~~r::!~~r: eram muito onomatopaicos, gostavam da dança e apresentavam uma preferência desusada pelos discursos. Com base nis- uestrado Um orgulho de Glória Caputo: a formação da Orquestra de Câmara da Fundação Carlos Gomes mais variadas pessoas e autoridades; es– tudiosos e apreciadores de música, aman· tes desta, tietes, todos lá. O ministro da Cultura, o representante da Funarte,_o~ in– tegrantes da orquestra destro-harmomca. Havia um concurso para uma bolsa na llália. Havia tudo e todos e de tudo e de todos a orquestra saiu surpreendendo. Foi ·um s~cesso. Foi a assinatura que faltava para que lodos tivessem a certeza abso– luta de que o caminho estava correto, es– tava certo. Um sucesso que eles curtiram com sorrisos úmidos de lágrimas há tan– to guardadas. Então um convite tiara um vldeo q~e seria aprese!IIBdO pela T.V. Cultura de Sao Paulo. Convite para se apresentar na ~1e– nal, no Rio de Janeiro; na sala Ceeiha Meireles; em 91, no M1ssoury, nos Esta· dos 8:::di!balho que se iniciou_alravés_de concurso. Um trabalho que exige ensaios diários das 9 às 12 horas, ensaios estes abertos ao público, (vá lá ouvir). "Um tra- ~1~fei.~Juctfi:í~::is'~di~~~ó~?a~~•~le°:- tivando nossos músicos". Os nossos mus1- ~~~~~~i;~o~~1Ji i: ra::o i:q~~~:'itJ; O importante, agora, é darmos todas so os Jesuítas estavam a um passo da poe– sia e do teatro. Por isso eles optaram por ensinar a doutrina cristã católica através de poemas comuns, ou poemas musicados e ainda através de peças de teatro - tu– do escritoespecialmente para as ocasiões. E o índio cantando, memorizando as poe– sias ia repetindo os pontos básicos da dou– trina, ou então representando cenas da vida de Cristo ou da vida de santos ia me– morizando o papel desses fatos na doutrina. € claro que os Jesuítas tiveram que f!~~~:~I~~ô~~~~~ ~:~r~:Rs i~: índios, ou de idumentária dos mesmos; era muito comum ver S. José cachimban– do nos intervalos das peças ou S. Jorge ou– vindo relatos guerreiros, encantado. Estas concessões valeram sérias advertências aos Jesuítas pela Santa Sé. A preocupação e importãncia que os índios davam a honra, valentia e força fí– sica também foi aproveitada para impin– gir a noção de pecado e de penitência - através da força e valentia eles venceriam o diabo e os maus instintos. E o indio aos poucos foi aprendendo a religião. Um outro dado que lemos a conside– rar é a ascendência de Anchieta. Nasci– do nas Canárias seus ancestrais eram nobres da província basca; os Anchieta e os Loyola eram familias que passavam tempos se amando (pelo casamento de seus membros) e tempos brigando. Para eles, amor e luta se completavam. Da fa– mflia Loyola veio Sto. Inácio, da família Anchieta veio José de Anchieta. Espfrito guerreiro lnácio e José eram primos dai ambos possuírem o espirita guerreiro, ardente, impulsivo e empreendedor de sua gente. ~ºl~&:;~ti S: 1 Je~~~ªcr~~â~~s: ~~~~~~ cio) pois era uma ordem religiosa para combater, era uma companhia de assal– to da millcia de Jesus e, como tal, condi– zente com a sua maneira de ser. O trabalho da Catequese pode t r si– do também para Anchieta uma forma de extravazar toda sua valentia e tática guer– reira que nele eram hereditárias. Aqui no Brasil, em todos os momentos era como se estivesse rodeado de inimigos (de den– tro de si e de fora de si) : a debilidade, a fraqueza flsica, pecado, os colonos, o cle– ro corrompido, os maus costumes, etc. Os dois poemas escritos em Latim bem comprovam o temperamento aguer– rido de Anchieta. Mesmo do "Poema da Virgem" que é um poema-meditação so- as condições possíveis e imaginárias pa– ra que a orquestra continue ativa e agr~- ~t~~imcf~~~rt~s~~r;i:i;~?n~~ ~~~ ra terras outras. O importante é ficar e criar em Belém um ambiente musical ;rJit~~~t;:~ ~~~~~~~~i:~u~:eci1i~ daqui nada conhecem. Material n~o fal– ta. Algumas instituições promovem a or– questra, através de financiamentos para suas apresentações, como o BASA. Cabe ao público responder em unissono, lotan– do as casas onde a orquestra se apresen– tar, porque assim, acostumam-se os músicos a tocar para muitos e acostuma– se o povo a ouvir boa música. Qual o próximo passo, o próximo so– nho? Uma sinfoneta. "Faltam os sopros". explica Glória. Depois, quem sabe, se nós todos ajudarmos,.uma orquestra e sinfô– nica e até mesmo uma ópera, inteiramen– te paraoara. bre os principais passos da vida da Vir– gem Maria, ele reverbera de forma violenta contra os detratores dela. o Canto II ele se refere a Calvino: metaforizando-o num dragão de peito es- ~!~~si ~~::s~eaªrf~~s~ro 1 -~d:i1~\~;, 1 ~:~~ peste lançada pelo inferno". De imediato estas passagens um tan– to violentas contrastam com outras onde ele expressa todo seu amor e veneração pela Virgem Maria, e quesão de uma sua– vidade e delicadeza sem par. O "Poema de Mem de Sá" pela sua própria essência se apresenta condizen– te com as descrições de batalhas, matan– ças, carnificinas; o que causa espanto é a meticulosidade e a exploração das mi– núcias de tais cenas que parecem não con– dizerem muito com a condição de jesuila de Anchieta. Aessência épica justifica a presença do herói, suas posturas e convic– ções também. O herói é Mem de Sá. As lulas que aparecem descritas são para pacificar os indios. E os indios aqui nãosão mais aque– las criaturas pacificas esperando a fé cristã; são "lobos vorazes" que espreitam para devorar os "tenros cordeiros". Avisão do indio que fica em decorrên– cia deste poema não é positiva. Ao contrá– rio, o indio aparece em sua plena prática de selvagerias entre as quais a mais evi– denciada é a antropofagia. Dá para se perceber também o ponto de vista do herói quanto às guerras e às matanças. Guerras e matanças são justi– ficadas na medida em que são compará– veis às Cruzadas. Sim. pacificar os indio . conquistá-los para os e.xércilos de Cristo era como ir para a Guerra anta e a mor– te em combale possibilitaria alcançar de imediato os reinos dos Céus. De novo vê-se lado a lado o amor e a lula. Aexperiência brasileira de Anchie– ta que possibilitou que ele encarasse fren– te a frente seus inimigos (tanto os internos quanto os externos>. Esses inimigos ti– nham contra si, como diz o Pe. Simão de Vasconcelos, "um único homem de esta– tura mediocre, de cor trigueira e diminu– to de carnes" - mas dentro de si tinha todos os guerreiros, seus antepassados da região basca, E assim ele vaivém. vence Cunhambeba (no episódio de lperoigl usando dP pura lática guerreira: é conse– lheiro de Mem de á aconselhando-o quanto às medidas a tomar para moderar os costumes na Colônia e quan(o às estra– tégias a assumir na luta contra os in– vasores. Enfim. nele o guerreiro e osanto con– ·viveram harmoniosamente.

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