Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1949
\ ,--r:z«srrr!'"''r,:;,:: St 1 AR l [ J .LITERATURA Pará-Be16m Domingo, 10 de julho «le 194, No. 128 1 ' MODÉSIIA A PARTE ... DA· ·VILA EU sou li '. Admiro o sr. Marques Rebelo llesde a minna inJancia. Seus contes foram uma grat-i dcsco• l>erta de minha adolescen<'ia, e 1,6 foram empanados pela ex– ti·aordinária ~1escJhcrta de .. A .estrela sobe", que é a n1eu vt.r ll ponto culminante de sua car• teira. Em uma noite o. "cont_eur'' e romancista Marques Rebelo contá a história de sua vida - "Tudo que faço é auto-biográfico" - : O modernismo· e os seus frutos - "Proclamo que existe uma verdade literária, pela qual eu sofro, padeço e morro", afirma o autor de "A Estrela Sobe", para concluir dizendo: "Tenho · um grande respeito pela baixeza humana" - Os introspectivos imitam um ti- me de futebol, e foi o mais útil. Senti que era mau e comecei a fazer diferen– te. MELOD IA MODERNISTA E O PINCE-NEZ SCHMIDTIANO Prosseguindo, declara : -UDOIVO-- - Nessa época, deflagrava-se no Brasil o movimento moder– ..nista. Insensivelmente, fui ar– rastado pela admiração a essa ; Conve1·sar com ele! durante uma noite inteira, e falar de 11ua galeria romanesca que tan– lo me seduz,. e procurar V"" ~ ais claramentQ o esplrlto ae m artista que conhece, como ucos. o terreno em que .:;:e mo.. .Foi :uma oportunidade que Mar• ques Rebelo teve de ter sempre professores muito bons, entre eles Maria Barreto, seu mestre particular de po,·tuguês durante · composições foram sempre dois anos. O autor de "Oscari- giadas peló velho mestre, na " · deve-lhe sua definitiva in• o animou a prosseguir no clináção para as letras, pois suas minho. • · elo– que ca- Marques Rebelo me diz: - Nessa ocasião, eu lia como um cavalo, do bom e do mau. O mau e que me serviu mais, . gente. O fato de Márlo Barre• to -criticá-los me fez perceber mais claramente que os moner– nistas t_inham grande importan– c1a, pois meu professor, sendo um grande filólogo, não era um espirita muito sensível às ma– nifestações da arte. Fiquei lei– tor de todas as revistas moder– plstas, e comecei a ligar-me aos rapazes. Destes, o que conheci em primeiro lugar foi Augui;to Frederico Scbmidt, que usava pi~ce-nez só para in1pressionar. pois não tinha miopia nenhu– ma. Também me liguei a Fran– cisco Inaclo Peixoto, e ao grupo da revista "Verde", de . . ; ,Em seu apartamento, da praia De Botafogo, entre livros e qua– ~ros, o autor de "Três cami• b.hos" começa a narrar sua his– tória. Sua língua. tão temida pelos não talentosos da litera– tura. não para um instante. ·Oec:ididamente, falar mal dos outrns .é um dos prazeres mais delici~sos a que nós, pobres r:norta,s, podemos aspirar. ,----·-·--•-·-·--·-----·-·--··----·------·7 t ■ · A conversa se estende e são ~ltados os imitadores do 'sr. Lu– c10 Cardoso, que roubaram atl> as coleções que rolam na obra do romancista mineiro. Vários 111ovos, como Xavier Placer . e l>aulc M. Campos, são elogiados l)elo "conteur" que em seguida me mostra uns originais do seu romance "O espelho partido", ,que sofre retoques diarios há l i • , ~ b®C~ i t . 1 ~- . i Cataguazes. . "OSCARINA" .varjos anos. . , Mostra-me os resulta<Jos de sua 'triagem de intercambio cultural ;ao Prata : são resultados sóll- 1,los, _de que sabe fazer a polltl. /oea da inteligencia e da cultu– ',ra. 1 '1 • e 1: 1 I· r -. Eu não fazia llteratura. O amb1~,:ite de caserna é- que foi deflmt1vo para a minha realiza– ção Hteraria, Quando voltei a ser civil, trazia comigo uma cader– neta militar e uma novela. - Mas como é que você, com essa altura, foi convocado ? Marques Rebelo se levanta, abre uma gaveta, e exibe-nre .1ua caderneta ,de reservista . Vfl' 1: f · /:._Vagueio pelo apartamento, fo– YJneio inúmeros livros, e con~ l:i-rerso sobre autores de sua pre– l~lleção. Falamos mal novamen– fl"e dos escritores e nos voltamos 1 ~ ara _ a entrevista · propriamen– ;,;e dita. Marques Rebelo, cujo nome verdadeiro é Eddy Dias fila Cruz, nasceu no Rio, a 7 de ,janeiro de 1907, _ sendo filho de Manuel Dias da Cruz Neto e ;Rosa Dias da Cruz. li . • i!: . Explicando-me a razão de seu pseudonimo, declara que na fa. ►.mm;i de sua mãe há Rebelo. : Procurou, então,· arranjar um ;· DOme que rimasse bem com es– ~e e deEcobriu um cronista por– iiluguê~ chamado Marques Re– ' belo.. . - Como, apesar de. tudo, o · nome era desconhecido, resolvi 1 dar-lhe nova oportunidade llterá- • ITJa, e aqui estou . Logo nos primeiros anos de aua vida, o menino Eddy viveu · 1 en:, Minas, obrigado por en!er-– m1dades na familia. Certamente · , :la e voltava, mas na verdade a · , permanencla, até os 14 anos, 1· nas Alterosas, deu à sua perso- Jlahdade um complexo mineiro de grande importancia em· sua biografia. 1 Sorrindo, afirma: , - Assim, consigo ser o maior ~scritor de Minas e do Rio, duas :praças muito boas. Marques Rebelo fez o curso 11ecundario no Rio, e em 1925 se platriculou na F aculdade de Me– llicina da Praia Vermelha, que .abandonou logo, para ganhar a vida trabalhando no comercio. Depois foi sorteado e deixou de yender geladeiras. , - Foi a coisa melhor do ,nundo. No tempo em que estava no .curso secundario, não havia au– ~as obrigatorias. Cada um aprendia com o prof. que bem queria e no fim do ano fa• ·;zla exames no Colegio Pedro II. l i ; . 1 1 Publicamos um capitulo do romance inédito de Marques Rebelo "Espelho partido", que o grande escritor, vém escrevendo há. mais de dez anos. Pinga-Fogo deu um bote de gato e· · tritou: - Apanhei! . A rã estava segura na sua un_ha. Saímos em tropel do esconderijo, com a eaixa de papelão pronta para receber a J)re~ia. · - Abra a tampa co_m jeito, Gilber- io, senão ela foge. Um pouquinho só... - Assim? - - Assim. - O bicho deu uns pulos lá dentro, depois se aquietou como se compreen– desse a inutilidade dos seus esforços. Madalena estava entusiasmada: - Grande, não é ? . ......: Regular. . . respondeu Pinga-Fo– go . Tenho apanhado muito maiores. · - Mentira! Pinga-Fo$o não deu resposta. Ela UM CAPÍTULO DO "ESPELHO.PARTIDO·" Fogo ! :Você está todo molhado, _Pinga– E'. Resvalei um pouco na água. Mas não tem importancia . Agora mes– . mo seca·. Vou estender a camisa no sol. . Tirou a camisa - o peito nu tem tons vermelhos e dourados - e esticou– u sobre · uma pedra: ~ Naturalmente! disse Pinga-Fo– go. Ela não é paralítica ... -· Ah ! ah ! ah ! rimos, eu e Ema- nuel. · Madalena fechou a cara: - Não vejo graça nenhuma. - Eu nãq disse para fazer graça, l\·Iadalena. EJes estão rindo de bestei- ra. - Agora mesmo está sêca. O sol está_fofte. Vamos sentar um pouco para E o bem-te-vi veio cantar bem em espffi'ar ? · cima das 110:,,~as cabeçd.S . E-isrietamos os Sentamo-nos na pedra ao lado, olhus no alto inutilmente . abrigada· pela figueira enorme . Vem -- Vo-:ê está vendo, P.inga-Fogo ! uma umidade refrescante do riacho que perguntou ela. escore como um cochicho. Fulguran- Estou . tes, as lavandeiras cortam a superfície Mt•ntira ! ela ág)lâ com a renda faiscante das Na ponta daqc.ele galho, e apon- snas asas multicores . A caixa, como tou-o. . um tesouro, repousa no colo de Mada- Lá estav~ o pássa, a, belisçando as lena, que por precaução a amarrou com penas do papo, sacudindo as penas do barban,t~.. · · papo, sacudindo as asas . Deu um olhar - Eu acho que ela está mexendo em torno e partiu num vôo ~sado e rifico: 1,62. • Conttnuando, ele diz: - Em 1931, essa novela apa– receu em livro, acompanhada de uma série de · contos escritos de 1927 a 1931. O êxito !Jterario foi grande. Explico isso porque havia uma falta absoluta de contistas. · Basta dizer que o maior "con– teur" daquele tempo era Mon– teu·o Lobato, que eu coni,idero um pobre diabo, primo de ca. milo Castelo Branco, contador de anedotas - baratas, uma espé– cie de Maupassant de Cascadu– ra. E' verdade que havia um contista q u e · possuía muitas qualidades. Era Ribeiro Couto, e certamente teve grande influ– encia no que eu ia fazer. O 1·es– to não interessava. Eram qua– se todos figuras que estavam en– volvidas no movimento rooder• · nista, que em vez de serem es– critores eram apenas modernis– tas , O que aéonteceu foi isso1 os que apareceram depois, fru• tos do moderni~mo, compreendi• am o papel de renovação desse movimento que apenas limpara ,, caminho e preparara o terre- º"· Falo a Marques Rebelo dos ctntos de Antonio de Alcantara M11chado. -· Sim, ele é um contista de prilo.eira ordem, mas tem todos os cacoetes do movimento mo– dert ista. Lt-•anta-se, acende um cigar• ro e afirma : - J"'rocurei voltar a uma trá– dição literária que só o movi– mente modernista per m itia . LEI fURAS DA INFANCIA lnstar.tes depois, Marques Re– belo m~ mostra um livro onde o tem~ deixou inquietantes si• nais. - Estt, vendo ? E · o primei– ro livro uue eu li. " O coração", de Edmu. ido de Amicls, em boa tradução ,!e João Ribeiro . Foi em 1917, r • meu livro de escola (Continúa na 2ª. Pag.) - Eu v:m,taria ·de ter um bem-te– vi, falou Naó.alena. - Não· aguentam gr;.iol~. logo, iu!or:nou Pinga-1"ogu. Morrem Mas e11 gostaria de ter um. - Vou ,;er se pago um para você. - Para morrer logo é maldade ! protestei. Matar borboleti1s também é mal– dade, retrucou ela, e voct · tem cole– ção. Tenho, mas não matei nenhu– ma! Encontrei todas mortas. Todas 1 Vá contar essa a outro! ... - E' verdade ! - Se você é tão bondoso, por que está . caçando rãs com a gente ? Elas também vão morrer:. Não respondi. Pinga-l''ogo sorria. para Madalena, admirando-a. O sol adiantina-se no céu de vivo azul. Ema– nuc-1 coçou o pescoço - os mosquitos importunavam. Pinga-Fogo com um· tabefe esmigalhou o borrachudo que lhe sugava o braço : - Este foi! Má.,,_...,L<õli,..._....,.. c.UU" '""'-
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