Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1949

JR TE .'(./ .. a . UTER IUR • ...1: . )i:l ·+ -"), ;1?s~,ov--:1, • . ·r.-·---------,------~--------,..--------,---- 1 Pará-Belém Domingo.' 12:de junho de 1949 . No. ·126 bbras Primos Desconhecidos Do. Conto Brasileiro . . . )ALGUNS MOMENTOS DE PALESTRA COM GRACILIANO RAMOS - CRITICA LITERARIA NA LIVRARIA -- 1 COELHO NETO E' UMA DROGA - · UM CONHECEDOR ·DE LOBATO ·_. ·OS GRANDES CONTOS BRASlLEI- ·- ROS QUE NINGUÉM CÓNHEGE ~~ GRACILIANO COMO PESQUISADOR HISTôRICC - . . . . . . . . . . _ --..d OTTO MARIA CARPEAUX Nos fundOil 'da Livraria Jo- como por exemplo "Joaquim ,. , , . não quer . admitir, por amor ao paradoxo". mais que todos os outros con– .tistas brasileiros .não prestam. Alciqes Maya é fraco. Coelho Neto é uma droga. Do Al– câ1;1t!l,l'a M~chàdo perdoam.::se algumas páginas, tal;véz "Car– mela ", mas o resto . não vale nada. Os contos de Mário de ·Andrade · são ruins como to- ,ié ólympio, · escura @- quente, Mironga"; depois, "Duelo de - João Alphonsus tem bo~ .coi- .do que as afamadas histórias existe um bª'1!quinho, incô- farrapos" e mais um ou dois sas: "SardanBipalo", "Noite de de Lima Barreto". · modo como banco dos réus, . . de Simões Lopes · Neto. Os conselheiro". · Entre os vivos, "Deixa.em pàz o Lima Bar– eis. o lugar preferido do mes- .chamados contos de Arthur aprecio muito à arte de Mar- reto .. Na minha tábua de · ruY- Ai o velho Graça perde a paciência.· "Acham paradoxo· quando digo a verd~de''. Tira o paletó, como se. quisesse ir à luta corporal. "Digo a Vo– cê, que Lima Barreto, que foi muito mais sincero do que Machado, ·não presta. Digo : tre Graciliano Ramos, teatro Azevedo ~o apenas crônicas ques Rebelo, arte de trans- mirações . ele 'vem .logo depois :·c1e conversas saborosas. Jé. se bastante frivolas. Mas João formar em delicado e delicio- de Machado de Assis. Me pa– . formou uma •"legenda negra" Ribeiro poderia ter sido autên- so lirismo as safadezas da ca- . rece aliás que Você também : em torno dessas conversas tico ·contista como se revela nalha carioca. Os contos de . sente certa ternura pelo mu– . cada vez mais "pessimistas"; na "Floresta de · Exemplos". ~arques são muito melhores ·Jato. genial e .infeliz, apenas : por exemplo, eµ _teria dito, ao NOVA IORQUE,· via rádio - dos os diabos" . CONVERSA DE DIABOS na defensiva, apesar.dos avan- Já dizia eu que as frases de– ços espetaculares de teoria de cisivas de Graciliano Ramos que foi Edward de Ver-e, Con- terminam sempre com "todos de de Oxford, quem escreveu os · diabos" 1· Jà o ouvi dizer tudo O que· atribuimos a Sha- que ele odeia osjesuitas e ou- entrar: '<i3<>Di ' dia!", .e Gra• cilianÓ teria· respondido: "Vo- Preparava-me para escrever cê acha ?" São lendas, nas mais um artigo acerca da in– quais, hé. porém, como e_m to- terminãvel polêmica sobre das as lendas, um grao de Shakespeare quando me che-· · ve1·dade; Ali se fala mal do gou a noticia da morte de · mundo . O mestre Graciliano, Maurio.e Maeterlinck, chama– ' não raramente, · fala mal da do por alguns "o Shakespeare :·literatura br~eira. Jé. é co- da Bélgica". Maeterlinck es– . nhecida· sua respoS t a ª um creveu um famoso ensaio so– ; :rapaz que defendeu .certo es- bre "O Re1· Leªr" e. tr- :>uzi·u ' critor cearense · cuja vida te~ R ..., ria sido superior à · sua obra: . "Macbeth". .. "Qualquer vida teria sido s~- Éu o vi pela última vez perior i!, sua· obr~"..- Os visi- aqui .em Nova Iorque, hã .uns tantes da provinc1a assustam- quatro anos, na companhia da se sobretudo da irreverencia .bela e simpãtica atriz Renée 'de Graciliano cóm respei~ ª Dahon, com quein se casou.de – Machado de Ai;sis; mas nao ~ pois do seu divórcio de Geor~ tanto ~ssim - gette Leblenc, .Um .poeta que lJM INlMIGO .DE MACHA- parecia escrev.er- num mundo DO DI!.: ASSIS ? seu, ·quase de mistério, .não se · "- .Machado· de Assis é sentia muito a gosto num a– grande escritor''; ·me diz Gta- partamento do Hotel Plaza no · ciliano Ramos, "apenas não é coração desta nietrópole, sim- 1 romancista. Dó ponto de vis- bolo das suas aversões: a me– ,ta da técnica novelistica, to- cãniea e O sistema. Embora 'ôos os seus romances são de- · · ficientes. São misturas de não estivesse em seu ambien- crõnicas, ensaios, aforismos, te nas coisas prãticas, Mae– meditações, contos, sobretudo terli~k, então refugiadÓ e de contos; o ."Bra:z; Cubas" pobre, havia sabido como a não é outr~ coisa senão uma sua produção literária havia )lar.ração incoerente, com uns do usada livremente na Amé– Jontos interpolado.s. Magníficos rica · 1 ,at1.na . como i.e fosse contos, aliás, pois Machado é grande nesse gênero, o maior entre os .brasileiros. Como contista, o autor de "Trio em lá-menor." e da "Causa se– ;creta" seria grande em qual– ,quet lingua. Você não a- r{)ha? ". . · • , 'os GRANDES CONTISTAS , DO MUNDO ; "- Acho. Você sabe como .admiro o velho. A última pé.- 1gina do "Velho Senado" afi– ~-a-se-me como a maior pá– ·gina de prosa portuguesa es– ~rita no Brasil. Mas gostaria. fpe saber algo dos critérios em . ~ que ·você apoia .seu julgamen- . to. Há quem aponte Maupas- · :;ant, Kipling e Tchekhov co- · 1tno os contistas-modelos. Vo- ' 1cê concorda com isso ? ". " - Gosto de alguns contos de Kipling, apesar da aversão · t ideológica que o imperialista. : t inglês me inspira. Admiro Boccaccio e outros italianos d::i, Renasc.ença, . admiro ·muito o rRinconete y Cortadillo" de ' ~Cervantes. Você se lembra do · 1málogo? "Es vuesa merced, 1 i r ventura, ladrón ? - Si, i spondió él, para servir a. os y a las buenas gentes". ; epois, há Gogol, há Dos- ; ~ ievski, , hé. Tchekhov sobre- : tudo e Gorki. E "A morte de · Ivan Ilitch", de Tolstoi, que . iVocê mesmo me recomendou i f. erto dia, talvez seja o maior ; onto de todos os tempos. Ai Você vê os meus critérios.· Mas não gosto, absolutamen– ,w, de Maupassant". · . 1 "Vejo bem a relação entre la sua aversão contra Maupas– fsant e a sua· admiração pelos ,contos de Machado. Talvez a. ! •J.mitação .de Maupassant te– .,nha estragado outros contistas !J>rasileiros ? " • - 'OS BONS CONTISTAS ... E . OS OUTROS • "Não sei se é isso. Não quero fazer o critico literário. Mas é verdade que ·nunca houve, com exceção de Ma– chado, grandes <;ontistas no ·Brasil. Apenas houve indiví- , O MISTÉRIO Shakespeare . tras ordens religiosas mas - kespeare, teoria que recebeu o "es franciscanos ·são magni– ~poio de dois professores bri- ficos como de todos os dia– tánicos; um da Univ.ersidàde · bos". Dai não se sabe com de Oxf9rd· e outro da de Li- certeza se o apelo ao Inferno verpooL não encerra porventura . um Agora é um estudioso amé- elogio. "Es vuesa merced, por ricano, professsor . de Inglês ventµia, ladrón. ?". , Graci- d U · · d d liano gosta dos criminosos, pe– a mverS1da e e Chicago, 10 menós na ficção. Que pen- Carlos Pávila que se insurge não só contra s11.ria ele do "Comprador ·de . os partidãrios de· Bacon, mas Fazendas"? Arrisco-me · a contra toda a espécie de subs- perguntar. "E Monteiro Lo– titutos que a critica vem dan- bato"? · (Copyright E. S. 1.. , ~ · exclnslvi~de para a FOLHA no NOR'.J'E, neste Estado) . do ao bardo· de Avon. ..Segun- A resposta .vem pronta: propriedade cómum. Não lhe agradou isso por .certo e, já nesse campo, moveu processo contra os seus editores Dodd, Mead an Co., a quem exigiu 250.000 dólares por "não ter protegido devidamente ós in- · teresses comuns". O processo foi anulado mais tarde por ele próprio. · Até hã · pouco, e depois d-e um debate que ocupou mais de 4.000 volumes e ensaios, pa– recia que tinham razão os que se negavam a admitir que o do .esse· mestre, Bergen Evans, "Não conheço". Ev.identemen– terceiro dos sete ·filhos de um não são nove os candidatos, e .te . Graciliano· conhece multe. ª"Ougueiro de stratf· ord.:on- iro d te Ent 1 bem os contos de Lobato. " s ezesse • re · e es, Mas não quer conhecê-los. Em . ·Avon _(John Shakespeare) h~-· 11-parece outta mulher, além compensaç·ão, acrescenta: via produzido, depois de aban- da rainha Elisabeth. E' Anne "Mas conheço alguns bons donar a escola e toda educa- Hathaway, por trãs da qual contos brasileiros · que todo cão aos 13 anos, monumental se .alinhou uma forte falange mundo ignora" . obra poética e dramática. o feminina ansiosa por provar TESOUROS IGNORADOS DA que ficava por estabel-ecer pa- que a obra imortal foi de uma LITEltl\TURA BRASILEI- recia ser qual dos "preten- mulher. O professor Evans RA dentes" era realmente o autor, zcmba de tudo ii;to na última Basta isso para provocar a Mas nos últimos tempos a edição do "Saturday Review maior curiosidade. · Pescol>rir chamada escola "anti-stratfor- coisas novas, e boas, na litera- diana'' bavia ficado um pouco tura brasileira é um fraco meu. E não sei de guia mais seguro numa floresta de fal– sas .celebridades e de valores injustamente esquecidos do que esse critico insubomãvel ao meu lado, que não quer ser critico e ·que no entanto, d09 · fundos escuros de uma· livra– ria, ihimina uma literatura inteira. , "Hã uns tempos", começa Graciliano, "andei estudando ,aquilo · que se chama conto brasileiro. Sérgio Bµarque de · Holanda abriu-me com a '. maior gentileza os, digamos, · tesouros da Biblioteca Nacio– nal. Passei lá três meses, fo- i lheando velhas revistas e jor– .na:s. Quanta coisa obsoleta, . quanta besteira I No entanto, eu já dizia a Você que os ver- . dadei,ros contistas brasileirós são individuos que escreve– ram, acidentalmente, um ou .outro conto sofrivel e às ve– zes notável. Fiz algumas des– cobertas. Raul Pompéia (não gosto, -aliás, do "4teneu" ! 1) tem um conto·muito bom: "O til.bury de praça". Os contos de Medeiros e Albuquerque, em geral, não prestam; mas "O ratinho tique-taque" é exceção. Do Mário de Alen– car ·descobri um conto notá– .vel. "Coração de velho". Outro esquecido, Domicio .da. Gama. tem só ·um conto bom, mas é realmente bom e se . chama mesmo: "Só" . E quem conhece os contos de Alberto . de Oliveira? Quem já leu "Os .brincos de Sarah"? Pois, eu li · f; gostei" . O OTIMISMO DO VELHO .· GRAÇA Hé. tantos anos que conhe- .. ço · Graciliano, mas raramen– te ouvi dele tantas afirma– ções positivas de uma vez. Será aue o velho virou oti– Dllsta? "Então", pergunto, "Você já pensou em reunir essas obras primas desconhe– cidas do conto brasileiro?" - .. Obras primas, não quero cli- 2er; de contos bons, isto sim ". - Insisto: "Será, em tode caso, uma boa, digamos, flo– resta de exemplos". Mas Gra- duos que escreveram, aciden– ta1mente, um ou outro conto bom. Posso citar "Os demô– nios", de Aluizio Azevedo, al– guns do velho Affonso Ai'inos, ·Uma das esplêndidas ilustrações de SANTA R.OSA para "Crime e Cas~ao"1 de Dostoievski -ciliano Ramos não tolera es– se· meu acesso de otimismo. "Boa ", pergunta, reincidindo. "Você acha?".

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