Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1949

íla. Página FOLHA DO NORTE Domingo. 10 de abril de 1849 1------ -----------·----- -,-- ~--- ------ ------ ----------------~- -~---- ------- .à morte de Gandhi / (Poema inédito especial para a FOLHA DO NORTE) Aqui se detêm as seteias azuis e os cavalos de asas. Aqui renuncio às flores alegres do meu íntimo sonho Eis os jornais desdobrados ao vento em. cada esquina: u A ssassinado quando abençoava o povo'~.-. Na vasta noite ouví um pio triste, uma dorida voz tie pâssa,o . · E, acordando, procurava um lugar lõnge ê ininteligível. Eras tu, então, que suspiravas, débil, no pequ eno sangue fi11al ? Eróm teus ossos longínquos, atrayessados pela morte, Ressoando como bambús delicados ao inclinar- se do dia ? uLes hommes sont des brutes, madame,. , O' dias da Resistência, com as rocas fiando e m cada casa . . . O' Bandi Mataram, nos pequenos harmônios, ent re sêdas douradas . . "O' ch6 ile Da,jeeling, Senhora, tem um aroma, de roscis brancas . . . 11 Ruas, ruas, ruas, sabeis quem foi morto além, ao outro lado do mundo ? Sombrios intocáveis da terra inteira,· - nem s oveis que devieis chon:11 ! "'Vó~, Tagore, cantais como os pássaros que de manhã recebem_alimf;n to, Mas há pássaros famintos, que não podem can tat,... E o vento da tarde abuna cs telegramas amargos . Os homens lêem. Lêem com os olhos das crianças soletrando fáb ulas. E caminham. E com;n!mmos ! E o mais cego de todos /eya um espinho entre a alma e o olhar. São também cinco horas . E estou vendo teu n ome entre mil xicaras . Na curtt;1 fumai;a do chá que ninguém bebe. uQue queria este homem? Por que, este homem, ao mundo?'• - Eu não sou mais que a vasi.'ha de barro amassada pelo Divmo· Oleiro.· Q;Ja!,rlo niío precispr mais de mim, deixar-me-á cair. Oe.í::ou-te cair . Bruscamente . Bruscamênt6 Ainda restava dentro um sôrvo de sangue . Ainda não tinha secado teu coração, fontasm r, heroico, pequena rosa desfolhado num, lençol de linho, en tre palavras sa('ras .· O venio da tordé VC!m e vai da lndia ao Brasil e não se canso . Acima de tudo, meus irmãos, a Não-Violência. Ma s te.dos estão com ·os seus revólveres fumeq ant es no fundo dos bolsos. E t11 e"as. na ,verdade, o único sem revólveres, sem bolsos, sem mentira, - D2::mrmodo até as veias, livre da véspera f, do clia seguinte . " Les t.ommes sont des brutes, ,,,adame" • O yento leva o tua vida toda, e a melhor par te da minha. _ Sem bandeiras . Sem uniformes . Só alma, no meio de um mundo desmoronado. E'.itiio prost ernadas as •mulheres da lndia, coma trouxas de soluços . Tua fogueira está ardendo . O .Ganges te leva rá para longe, Pu:;;hado de cinza que as águas beijarão intim amente, Que o sol levantará das águas até as inli.-..itcis mãos de Deus . " Les hommes sont des brutes, mada-,,,e'~·. Tu, que dirás a Deus, dos homens que encontraste? (Uma cabrinha te acordará terna saudade, talvez}. O vento sopra os telegramas; oscilam máscara s, os homens dançam." Eis que vai sendo carnaval aqui. - (Por t oda pa rt e). As vozes da- loucura. e as da luxuria retesam ar cos vigoroso!/, O uivo da multidão reboa pelos mil planos do c_imento. - Os .~antos morrem sem rumo;, abençoando os seus matadores. A última voz de concórdia retorna ao silencio do céu . E,stiio caindo as flores das minhas árvores. Ve jo uma soiidão abraçar-me : - · Chegam nuvens, nuvens, como apressados sim bolos. O vento junta as nuvens, empurra tropas de e lelante~. Voai, povos, socorrei o esquálido santo que VÓ! amou ( Descai pelos meus braços uma desistência de beleza e de heroismo .-. Que correntes havia entre o teu coração e o m eu, para que s~lra meu sangue, ~abendo o teu der ramado ? O vento leva os homens pelas ruas dos seus ne gócios, dos seus crimes. Leva as surpresas, as curiositlades, a indileren ça, o riso. Empurra cada qual para a sua morada, e continua a cavalgar. 0 vento vai levantar eh.amas rápidas, o vento vai levar cinzas leves. Depois, há-de escurecer . Vai-se chorar muito . Vão ser choradas, enlim, As · lágrimas que andavas contendo, detendo e m diques de paz . Deus te dirá: 11 0s homens são uns brutos, meu f ilho. · Basta de canseira. Vamos soltá-los, para que v oltem- ao cáos, e o oceano ferw,). E partam, e regressem, e tornem a partir e o regressa,. :Vem ver destes meus palacios azuis a batalha-feroz dos e,ros. E' preciso voltar ao principio. Eu também vou fechar os olhos .' · Por isso, ordenei que te. quebrassem com violência. Não há mais JJumanidade paro ter-te a seu ser vi~. Exala comigo o teu sôpro. -Até podermos outra yez abrir os olhos ; Quai,do os homens chamarem por nós" . O vento está dispersando as falas de Deus entre as mil línguas ,!_o fogo~ ~"'"==~=====~~"."º ,.,. -il mcac de cinza dos teus velhos ossos, Mahatma .' . - • ,

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