Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1949

1 \ ~ SONETOS 'DE LEDO 1v·o. / - SON TO D_ITO- MAUNAl SONETO DA INICIAÇÃO SONETO DA· CONF DÊNCIA :• . . De chegar ao partir é de querer que floresça a semente do fantástico, de viver par.a a vida, sem nascer, 'e dar um moviment'o ao mundo estãtico, de chorar e sorrir, de renascer na substancia do elemento plástico e nos comunicando que o teu sêr torna ·o mundo mais vásto e mais elástico. de sonhar diariamente, que tornaste legendária a nós outros, que aguardamos que em teu ser matinal nunca anoiteça. Maravilhoso é o mundo que fundaste na fonte de uma infancia 4ue esper;amos jamais estanque, nem se desvaneça. Para este instante, trazes õ clâniõr natural com que o corpo enfim desperta .. Em grito e pranto ·e lágrimas e dor - ' és cristal, e eu clarão que te penetra. De tua solidão emerge o amor em clara e silenciosa descoberta . e sem usar as mãos eU: colho a flor 1 • que me lembra uma concha meio aberta. Chorando de alegria, eu me aprefundo no amplo rio nupcial de tuas pernas como se houves.se descoberto o mundo. Sem pecado e sem morte, que -existamos , . e nossas vidas sejam sempre eternas. Sendo mqrtais, a isto é que àspirarnos. - - r Foste flor de cristal e maresia, tangida pela brisa fluotes enté .. Antes foste depois, até que um di~ ficaste instantanea eternamente•: Em tua soinbra ã sombrà se esvaía em· voz predestinadã de nascente. Sabendo-te de amor, eu não queriã . ser de teu riso um simples confidente.: D mar em meus ouvidos ! Que erã o mar para o amar sempre do meu peito, ·pará a· vastidão de ijiarço em mini ressQante ! Que era a vaga à certeza, se ao amar eras rotina e sortilegio, rara .flôr incrustada em meu vulgar Instante ? SON.ETO DE ABRIL SONETO DOS . 20 A.NOS Soneto Da Rosa Passageira- Agora que é abril, e o mar se ausenta. . . ) • ,J secando-se em sí mesmo como um pranto, vejo que o amor que te dedico aumenta seguindo ~ trilha de meu próprio espanto. Em mim, o teu espírito apresenta tôclas as sugestões d,e um doce encanto que em minha fonte não se dessedenta por não ser fonte dágua, mas de canto. Agora que é abril, e vão morrer ~ as formosas canções dos outros meses, assim te quero, mesmo que te e~conua~ amar-te uma. só vez tôdas as vezes em que sou carne e gesto, e fenecer crirno uma voz chamada pelas ondas. Que o tempo passe, vendo-me ficai no lugar em _que estou, sentindo a vida nascer em mim, sempre desconhecida de mim, qu_e a procurei sem a encontrar,: Passem rios, estrelas, que o pas_sar é ficar sempre, mesmo se é esquecida a dor de ao vento -vê-los na descida , para a morte sem fim que os quer tragar .. Que eu mesmo, sendo h_µmano, também passt: - mas que não morra :Q.unca este momento em que eu me fiz de amor e de ventura. Fez-me a vida talvez para que amasse e eu a fiz, entre o sonho e o pensamento, trazendo a aurora para a noite escura. r:·:A::E:~R~EDADE .SONETO .DAS ALTURAS Fr I n do 1 ,8.ssageiro, õ am<·i· terreno mais sofre acrescentando ao permanente. Melhor fôr~ ~oasse, se é pequeno o engaste em que se encrava o seu presente. Intimidade surta de um aceno o amor foge ao consumo do inerente, e em nós inoculado sem veneno só fica quando passa brevemente, Amor que emigra, sombra de impre_vista clareza, a solidão não se imagina prPsa ao·ençanto do desencanto. Entre o amor ido e estar amando, dista ó estar sozinho que não se confina entre ir amâr wn dia .e te;r ª1X1-ª-ªº •. As minhãs esquivaiiças vão no vento alto do céu, para um lugar sombrio ·onde me punge o descontentamento que no mar não deságua, nem no rio. , Às mudanças me fio, sempre à.tento ao que muda e perece, e ardente. e frio e novamente ardente é no momento em que luz o desejo,.poldro em cio. Meu corpo nada quer, mas a minh'almá em fogos de amplidão deseja tudo o que ultrap_assa o human<? entendimento. E embora nada atinja, não se acalma, e sendo alma, transpõe meu corpo mudo, ,e aos ~éus pede o_inef.avel e não_o vento:1_ .Procuro a rosa feita de semente, água, folha, esplendor, estrume e espanto.: Nesta rosa, bem sei, s_e abriga o canto que nos faz fulgurantes de repente. Pi_stilo, estame, flor - é tão ardente• 1 a rosa que meus olhos ptiscam tanto que ela perece eterna sob o. manto do fugidio orvalho do presente. Glória da rosa clássica ! Ntun dia o trabalho dos deuses completamos tecendo o sonho puro e sempre inutil. Iguais às rosas somos, 6 Poesià. Completos, -damos tudo, mas passamos nada deixando aõs outros de iiicõiisútil. ,. SONETO DA GRANDE , ·L-UA ·BRANCA Vindo de junho, a noite lembrã õutubró e seu lúcido sol é lua branca - que nos jardins se curva e lhes ãrranca a flor que em minha infancia lhes tescubrõ. Esta calma noturna, eu a perturbo criando um rio que ninguém estanca e indo beber na grande lua branca um mês que não é. junho, e lembra outubro ; A lua parte, sem que eu a persiga certo de que ela em mim permaneceu escondida_no olhar de minha amiga que silenciosamente ficou nua e sem pudor nenhum se ofrreceu ·ª m~, que !!?:~ _e!_ltregárª à pranca lua,:

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