Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1949
fJoiidngo, ff ai - Ieverelrõ é1i lt49' homem in_gênuo, que não en– tendi& coisa alguma do mun– do~ ~urx= Wôtt-Tif\., :..=:.===....:.,___....;,;;..;;;.;.;.;..------~- MÚSICA J 11111111ÍI Il li llllll111111111111111 Abro o livro "L'inlÇiatton à la Musique", publicado sob a direção de seis ll~e.s músi– cos e musicólogos, - entre outros, ReJDOld Hahn e Paul Landormy - e dou com o.s olhos no capitulo dedicado a Franz Josef Haydn. Depois de algumas linhas, relatando episódios da sua vt– &\ doméstica, o informante assim conclui, com estas pou– cas palavras que traduzo fiel– mente: { Entretanto, a vlda oculta de um artista constitui talvez o mais forte material para a sua -obra. Este mundo é um sistema de coisas invisivels manifestadas visivelmente, diz São Paulo. Há ocasiões de enorme tensão, em que o ar– tista, ou por efeito de um grande sofrimento, ou de um estado de euforia resultante da sua comunicação com es– se sistema do universo, vi- HA~DN 1 bemOl (magnificamente tnter– pret&da em dJaoO por Horo– witz) e depola - do co~nt.o com este gênio de invenção, como este conawtor dlnAmi• -oo do elemento sonoro, com este ordenador, plástico de tant.as combinaçlSes melódicas até então dispersas e indls– érimlna.das - dizei-me se a imagem do bonacheirão Hay– dn pode ainda prevalecer em vosso espirfto 1 Para reforçar, com toda a lealdade, meu testemunho so– bl'e a ~andeza de Haydn, de– vo declarar - na minha qua– lidade de mozarteano apaixo– nado - que algumas · vezes preliro - o mesmo a Mozart - partloularmente no plano da música sinfônica. Depois disto nada mais posso acres– centar. Resta-me somente fa– lar, fazer um apelo aos nos– sos maestros pare. que inclu– am de vez em .quando nos programas de .seus concertos algumas composições' de Hay– dn, mestre de equilibrio e de . aflrmac:li.o vital, que tem mui– t.o a dbier ao homem moder– no perturbado pelo mats gi– gantesco conflito de todos os tempos: pois Haydn é um dos homens "que possuem a cba,.. ve". xn "Era um homem honesto, um pouco ingênuo, que não foi perturbado por nenhwna grande paixão. Foi feliz, de uma felicidade simples e tran– quila cujo segredo trazia con– stgo mesmo . MURILO MENDES _Sue. afinidade artlstlca e afetiva com Mozart é um dos caso& mais interessantes da. hi.stórf.a da música. Estes dois -bra de maneira incomum - e desta vibração persistem vestfgtos transfiguradores na sua obra. Uma obra de arle completa-se com novas dimen– sões aj níadas quase sempre depois da vida temporal do seu autor que não consegue esgooo.r sozinho o significado da sua. substancia. E' neste sentido que o auditor - no caso da miísica - participa da própna criação, acrescen– tando alguns traços 1- fisio– nomia do artista desligado do temp0. "Tel qu'en lui - mê– me enfim l'éternlté le chan– ge". Assim não procederam os autores de "L'Initiation à la Musique" - -livro que, pu– blica.ão em 1935. · parece tê-lo <1ido cento e cln"!uPnta ar>os iates, quando Haydn ainda era bem vivo e pouco visi– vel. •• (Copyright B. S. I., com exclusividade para a FOLHA DO NOBTE. nesie Estado). - Suas sonatas, seus trloe, teus quanetõs, suas sinfonias, seus oratórios dão o testemu– nho de um&- arte encantado– tt, delicada, espiritual qu~ às vezes atinge a grandeza pela . única. virtude- da proporção arquitetural". XXX Quantas vezes me inclinei sobre a fotografia do belo re– tr,ato, pintado por um anõni– ·mo, exJstente (existirá ain.1 da T••• > na galeria do caste– lo de Esterhazy, procurando surpreender o segredo daque– le que escondeu sempre sua intima amargura! O rosto longo, de um oval quase perfeito, os olhos sere– nos, o nariz enorme, termi– nando em forma recurvada, a. boca que parece aceitar tu– do. . . se não fosse essa dob~a amarga no seu canto. Aparentemente é o Josef Ha.ydn da versão oficial: essa. bonhomia, e&!a jovialidade, que transparece nos "allegros" das sinfonias, nos finais dança.a,. tés das sonatas. E' claro que ta1.s elementos são de grande import.ancia, e _ garantem a saúde, - na sua mais alta concepção - de uma obra que 'se baseia nos ritmos po. pulares · e que procura atin– gir a serenidade. :Mas que a ultrapassa. Que jA traz mes– mo o poderoso fermento ro– mântico, palpAvel nos "an– dánres" e nos "adágios" de muitos quartetos, sonatas e sinfonias, Procura! ouvir es– seE. admiráveis quartetos - op.20 e op.55, por exemplo, ou u sinfonia~ "Milagre", "S&.lomão" (1 a 6), "Militar", "Londres", "Oxford", op. 86 96, tal concêrto de cravo, co– mo op. 21, ou tal sonata de pia.no ,. como a no. 1 em mi espirftos essencialmente no– bre e eleva.doí completaram• se pela a.proxlmaçlo e co– nheclmento mútuo. A influ• êncla de Haydn sobre :Mozart fóf · de fato enorme; entretan– to, o Conde de Satnt-Folx e Paul Bekker estabeleceram de maneira deflnltiva a teo– rl& da reciprocidade de tal influência. Detalhe digno de nota - fol sobretudo dep0ls da morte do • autor de "Don Giovanni" que esta influência. 11e acentuou. Ela se revela manifestamente - para s6 citar um exemplo - na sin– fonia op. 98 da edição Breit– kopf e Kaertel,l e em outras da mesmá época, escritas du– rante a estada de Haydn em Londres, nos últimos tempos de sua vida. SOLEOAOE (Conclusão da 1.• pág). Está acesa. e independe de tl, Diante do. teu nome, Inoessa.nte e doura.da, fulgirã. ' - Nada mais. Poder-se-la ob– jetar que este livro é desti– nado à vulgarização da mú– sica. no melo de leigos e ama.– dores. Seja. como for, nio vejo desculpa alguma para que se mlnlstre!I\. noções tão tnrompletas, julgamentos tão simolistas sobre alguns dos ma iores nomes da música. Prefiro antes crer aue aquela fórmula traduz de fato o jui– zo dos seis ilustl'es sobre llque– le que elevou, com :rara sa– bedoria técnica, gênio de in- ---..ençã.o e profundo sentimen– tb, uma das maiores e mais e.stáyeis construções musicais Que existem. SONETO D6 RONSAR0 Em outro livro de mulher - "Caminho", de Ilka Bru• nilde Laurito (São Paulo, Ju– .lho de 1948), real)arece o te• ma da soledade, mas desam– para.do, agora, de sr.ntlmento afirmativo que coroa a ins– piração de Maria Isabel. Aqui a soledade não ultrapassa a fase de frustração, de espe, rança incerta. - XXX _.(Especial para a FOLHA DO NORTE~ neste Estado), ' De resto, o mal entendido não se-limita a Josef Ha.ydn. Até 1919, até o momento da publicação da obrn de Her– man Abert - paralélamente à publicarão da obra defini– tiva de Théodore de Wizewa, e G . de Saint-Foix - o en– gano subsistiu oom referencia a Mozart. Até hoje ainâa se · FOI PÃ!lA VõS QUE ONTEM COLHI. SENHOR~- ESTE RAMO DE-FLORES QUE ORA ENVIO. _ NAO NO HOUVESSE COLHIDO. E O VENTO E-O FRIO tT:t-LAS-IAM CRESTADO ANTES DA ÁURORA. -· r1contram ·pessoas mais ou - menos cultas, que conservam de Mozart a. Imagem ofereci– da peloe cartões postais d-o século 19 - um mocinho de cabeleir.a empoa.da tocando 1,0 cravo .ou rio pi-ano umas composições frlvolas, superfi– dais, sem conteúdo humano . MEDITAI NESSE EXEMPLO. Qtra SE .~GORA - NAÓ SEI MAIS DO QUE O VOSSO TRO MAe ROSTO NEM BOCA DE MELHOR FEITIO A TUDO A iDADE ALTERA SEM DEMORA. - Aliãs, em geral pouco se .sabe sobre os fatos exteriores da vida dos grandes artistas. Em vez de consultar suas obras, em vez de procurar .surpreender através delas a. revelação - ao menos aproxi- · roada. - de sua vida intima, de sua alma - a maioria das ,pessoas segue o método · in– v rso. SENHORA, -0 TEMPO FOGE... O TEMPO FOGE... lUM .DIA MORREREMOS". E AMANHA JÂ NAO SEREMOS _O QUE SOMOS HOJE••• Haydn ' viy,eu obscuro até -o instante em que conheceu o Príncipe Esterhazy, casou- - se com uma mulher de edu– ~çã.o vulgar, estabeleceu-se llO castelo do Principe coma maestro... e pronto, Era um POR QUE É QUE O VOSSO CORAÇAO HESITA? O TEMPO FOGE... A VIDA É BREVE E É VA... P-OR ISSO... AMAI-ME... ENQUANTO SOIS BONITA. A preocupação das "descobertas" dominou também a nova geração paraense de poe– tas. Eles marcaram a sua posição diante do ;problema estético e emocional que -a poesia brasileira apresenta nestes últimos três anos, através da conceituação de Haroldo Mara,. inhão em seu artigo "Poesia em Pânico", es– tampada no primeiro numero da revista "En– contro". Depois de mencionar "o dilema e a pluralidacfe -de caminhos que, ma.is do _ que em 22 ou em 30, se· esµ\ esboçando em nossa vida !iteraria", afirma o jovem poeta paraense: "0 desencontro das '1>referencias estéticas, embora não pàreça., é bem mais expressivo do que por ocasião -0os famosos suc~sos liderados por Mãrlo de Andrade e seus companheiros. Ai se abria um abismo entre duas gerações: eram duas · concepções de vida., duas fisionomias, doa comportamentos vigorosamente- marcados; •• Mas é preciso- esclarecer e repisar sempre que a. renovação se fez menos num sentido FORMAL do que num sentido propriamente ESSENCIAL. . • Nos nossos dias, é bem d1- . verso o e11,rater da revolução que se pres,. sente, já; nas atuais manifestações e ten- - 4encias dos poetas mais novos do Brasil. O ~ 11>roblema, sendo ainda de- procura de solu– ções essenciais para a poesia, é também um ' problema de FORMA" . ,'. Paulo Mendes, aborpando o problema decerto por .outro angulo tem uma pãgina '. mnito lúcida em "Encontro" sobre pureza e f forma da poesia contemporânea, donde des– _taco este trecho que p_ode ser com vantagem ' aproximado no tópico extraído do trabalho de Haroldo Maranhão. "Toda poesia contemporãnea estã mar– cada dessa preocupação de pureza. . . Mas que de enganos, de equívocos e de erros, nessa. obcessão de pureza. e na busca incan– savel da essencia. .poética! A extrema rare– fação da poesia, a cuídada eliminação de al- (Tradução de MANUEL BANDEIRA) o-. li ENCONTRO'' Da ~Java G·erocõo -Do Pa.ró - ' - - - . -~ - - ';__ José Sienio LOPES - guns elementos que ·sempre se associaram a ela e que talvez sejam conversiveis à sua. essencia, e a supressão do que dé perturba– dora.mente humQno ela pudesse conter, ori– entarani,..nâ para uma concepção rlgorosa, mente abstrata da beleza e para o inatingi– vel ideal do absoluto; Poesia, que adquire, também, pela sua -força da simplificação, um tom hermetico e se faz, freqttentemente, inínteligtvel. Poesia que é s6 J?ara poetas e para uma pequena. elite de iniciados". Em suma, temos ai aque1e mésrno pro.– blema- que durante o II Congresso de Pee– sla do Ceará, no meio de certa esteril agi– tação superficial em volta de nomes e mo– dos pessoais de se afirmar, inspirou à pro– posição consubstanciada desta forma: "A Poesia atual, sem desprezar as conquistas dos movimentos literãrlos do passado, so– bretudo do Modernismo, pesquisa e experi– menta uma renovação e.stettca de ritmos e processos- artlsticos, a fim de que forma e conteúdo se completem no expressar as - realidades do presente". • . E' curiosa observar, desta altura, como a nova geração- de poetas, em todo o Br~– sil, apesar de_tão d!!'sligados, sem co~um– cação sente quase de maneira identica os mesmos problemas e lhes dá dentro do campo estético as mesmas soluções. · O rt!– almente notavel é verificar como as novas formas poeticas repontam nas composições dos moços do Norte, do Centro e do Sul, co– mo se poderã facilmente depreender da lei- - tura de revistas re:presentative.s como ·"Or– feu", "Joaquim", "Encontro", e também "Clã" 1 que sem ser uma revista rte moços no mesmo sentido de "Orfeu" ou "Joaôrum'.', contém a melhor produção dos da nova ~– ração do Ceará. X X X "Encontro" dá-nos a marca da no~ ge-1 ração do ·Pará. Moços como Benedito Nu– nes, Mario Faustino, Haroldo Maranhã?, -Cauby Cruz, Max MartiÓ!!,:- RuJ .Guilherme, ao- lado de uma. turma de genté ·mais' ma.– dura, porém extraordinariamente pcrcept:~ª como Cléo Bernardo, Paulo Mendes, Mar.o Couro, Cec:1 Meira e outros, começaJ'll a realizar o seu "encontro" com os moçllô tle todo o Brasil nesta intensa fase de rr.nova– ção literária e valorização do esfotçrJ inte– lectual que se verifica.- em todo o_ !laiS-. A geração do Pará tem um lugar JY.'C',?mine:nte a ocupar no cenário mental deste momento: - .,.- ., ;;t .. Pobre nota isolada à procura de acorde - e é companheira da nos- -talgia' imrootente, e da lan- guidez: Não busca vencer-se a si mesma com as próprias forças, mas se refugia no rei– no de impermanente e do fu– gaz. E perde-se nas formas: da nature7A, sobretudo da na– tur za vegetal, o que lhe per– ffl.íUrá descortinar o "milagre das renovações tranauilas". Ou dissolve-se em cântico, em música. em dança. Não .se espere encontrar a, Intensidade artlstica, a beleza formal, que nascem e:m parte •:o tiroclnio atento e se en– contram tão manifestas em ''Visão de Paz": A substan– cia ·destes versos é feita de aspiração ainda não Sil,ttsfelta, de expectativa, de perplexida– de, de hesitações, de insegu– ranças. Ilka. Brunilde Lauri– to pôde transfigurar tudo is• so em versos que se acomo– dam bem à realidade de sua e-xperlência. Caminho , é livro de estréia, e de autora ainda multo jovem, mas já rico de poesia. O mesmo não se pode di2i2r de muitos livros- de es– trela.. Para remessa de livros: Rua Haddock Lobo, 1625. S Pau~ lo (Capital) . a cultúra. literaria da. maioria dos seus com– ponentes, a força expressional çie seus poe– t~s, o ~rr?jo que lança, por exemplo, Ma. rio Faustino a compor uma tragédia, cre– denciam, o grupo de "Encontro" como um dos ma.is promissores na marcha afirmativt\ das PROVINCIAS llt_erarlas. .1ã não é possivel obscurecer este :fato do que as gerações ma.is novas reto.mam e renovam a tradição da- ôultura o prestigio '- intelectual que durante algumas décadas , esteve obumbre.da e.o Brasil. Já não é pos– slvel falar-se - (os- "velhos" gostam tanto de falar em incultura e atraso da mocidade 1) em decadencia literãria e artlsticà no Bra– sil, à vista do surto de realizaçõ,o..s indiv,.i.– du-als e de grupo que vêm dando às provín– cias tim sentido novo de independencia e autonomia cultural cm :i:elação ao centro da llter:i.tura : de suces!'O que sempre foi o eixo Rio-São Paulo. Por certo algo de instavel se observa nes– tas realizações da nova geràção. Algum• causa de ."pretensioso"-se poderia notar eII\ cert:i.s atitudes, mas há a relevar o entusias– mo e a ofervescencia do talento criador dos moços, às vezes iludi.dos sobre o valor das: verdadeiras obras ·que resistem a.o tempo e \lltrapassam as escolas . Mas a verdade é que houve o mllag.re do ressurgimento literario em nossa geração e na geração mais moça, muito se -podendo esperar, cada vez mais, dos que vêm par aí, meços que lêem o que estudam, que já não ·se contentam com um diploma rr,eramente p:rofissiol)al. mas frequentam cursos de ex– ,tensão cultural, adquirem os últimos li– vros q,:ue nos manda a velha e sempre nova c;ultura eutopeia e conhecem. sem ilusões, & verdadeira propórção da cultura das gera. ções que lh~s vão á frente. (Do "Utútarlo'', de For&alesa)
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