Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1949

DIRETOR PAULO MARANHAO ·e::=JSUPLEMENTOJ ,,.,...... :1 ORIENTAÇÃO DE HÃ ROLDO MARANHÃO COLABUKl'L1JUKt;b i>E BELEM; - I\.IODliU KOCb-', Benedito Nunes, Bruno de Menezes. Cauby Cruz, CécU Melra, Cléo Bernardo, Oaolel Coelho de Sousa. F. Palllo Men• des. Garibald) Brasil. Haroldo Maranhão. Levi Hall de Moura, Mario Couto, Marto •·austino, &fax Martins, NataUcio Norberto, Nunes Pereira. Orlando . Bltar, Otavlo Mendonça Paulo PlinJo Abl-eu. R . de Sousa Moura. Rlbamar de Moura. RUI Gllllher• me Barata. Rui Coutinho e Sultana Levy Rossem– bla t&. DO RIO: - AJvaro Llns. Augusto Fredertco Sob• mldt. AoreUo Buarque de Holanda , Carlos Drum– . mond de Andrade. Cassiano Ricardo, CecWa Mel• reles, Cyro doa Anjos, , Fernando Sablno. Fernando Ferreira de Loanda.· Gilberto Freyre. Josê Llna do Rego, Jorge de Lima. Lêdo Ivo, Locla Miguel Pe– reira. Maria da Saudade Cortesão. Marquee Rebelo, Manoel Bandeira, Maria Julieta Drummood. Mnrl• lo Mendes. Otto Maria Ca rpeaax. Pa ulo Rónal e Rachel de Queiroz. · DE 8 PAULO: - Domingos Carvalho da Sil– va. Edgar Cava lheiro, Roger Bastide e Sérgio Milliet. DE BELO HORIZONTE: - Alpboosus de GuJ• maraens Filho e Bueno de Rivera . DE CURITIBA: - Dalton Trevtsan e Wilson Martins. DE PORTO ALEGRE: - Wilson Chagas. DE FORTALEZA: - Antonio Girá1>,. Barroso, Alulslo Medeiros. Braga Montenerro. .João Cllmaco Reurra e .José Stenlo Lppes. CRÔNICA • CAMUSEOGUM H_ENRIQUE PONGETTI Tenho as melhores noticias da macumba oferecida a Camus em Caxias. Tudo correu maravilhosamente. Os "pontos" novos com música de Villa-Lobos e letra de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeirn esta– vam na pontinha da lingua : as danças, marcadas por Vaslav Yeitchek com cenários de Eros Gonçalves e fi– gudnos de Djanira não tiveram uma falha; o próprio Abdias Nascimento no papel de Pai de Santo nã9 foi reconhecidc; pelo autor de "Calígula" . E' verdade que Camus desconfiou dos olhos azuis e da pele falsa, um tanto pó de rolha, de um circulo que marcava com o ganzá a cadência :..fra de um jongo; mas deram-lhe uma explicação razoavelmente étnica e ele não desco– briu, debaixo daquele primor molieresco, o carioca ho– norário e parisiense efetivo Michel Simon. Excelente "mis-en-scene" a dos três ·irmãos Con– dé do "Jornal de Letras··. Tudo quanto Jacques Tour– neur conseguiu de misterioso e de arrepiante naquela ,.::ena dos macumbeiros forçandc a visita do Zumbi .branco, ali se s;mtia com a vantagem do cheiro de suor, de marafa e de charuto . Augusto :'i'rederico Schmidt em transe, querenc:to fazer baixar ao mesmo tempo as al– mas de Mauá , de Campos Sales como última tentativa de repor nos trilhos o B:·asil, tinha· algo de tragédia grega, dizia mais com Sófocles do que com Joãozinho da Gomeia: "Quem vem, quem vem lá de tão longe - são os anjinhos que vêm ·trabalhar - ó dai-me forças pelo amor cl.e Deus, meu Pai - ó dai-me forças aos tra– balhos meus". E Mme . Minneur no seu vestidinho sin– gelo de filha do terreiro - saia e bata cheirando ,a er– vas de banho de cheiro - contra-cantava sem arra– nhar um "r", tão de Cosme e Damião como o poeta So– lano Trindade: "Quando Ogum chega no reino ~ Todo mundo diz c;aravã. ::.cu Ogum - Ogum Yará Ogum Ma– gê·- Olha Ogum Rompe Mato Auê . .. " Um sucesso ab– soluto, Camus estava encantado. E quando Abdias Nas– cimento reapareceu ::em os disfarces, meio constran– gido, como cachorro que quebrou, não :·..nela, e sim o melhor Sêvre, da casa - Camus _1ão se conteve: "E\ll> queria l:ue o meu Calígula fosse feito, na sua compa– nhia, por um tipo como aquele Pai de Santo". E o Ab– dias, t:iempre modesto, não querendo nada com o cartaz: "Há de se dar um jeitc : eu tenho 1 1m em vista ... vous pouvez restez soceguê" .. . Três macumbas intelectuais 0 possui hoje a cidade: a da Gávea, e de Caxias e a da rua Buenos Aires. Esta manda convites à Academia Brasileira de Letras é às revistas !:';ranfinas como "Rio". Outra noite o repórter fotográfico Richard Sasso apareceu por lá e foi logo abordado por uma romancista esguia e loura, chiquíssi– ma: "Foi ótimo o senhor ter vindo . Eu conto receber hoje as irmãs Bronte, ou pelo menos alguém de sua fa– milia. Mas pelo amor de Deus, veja como me tira ! Es– ses espiritos, quando entram na gente, são danados. pa- . ra fazer rugas !". A da Gávea é excessivamente cosmopoFta. As vezes o Pai do Santo esquece a melodia do ponto e entra com o "night and day", com o "Pigalle" em tempo de sam– ba. Inconveniência de lidar muito com o corpo diplo– mático e com artistas estrangeiros. Há noites que lá em cima Ogum sai com o acento agudo francês e Orixá ganha mais "rrr" do que uma lixa numa superficie ru– gosa. Mas para melhor compreensão do texto não se dispensa, assim mesmo, um intérprete da Agência Cook. Camus, f.elizmente, ·é homem de teatro . Em qual– quer língua ele capta logo a alma típica, a alma since– ra, a alma verdadeira de um povo ..• FLASH -< PERE Nome: Joaó reregrmo da Recha Fagundes .Tunlor. Nasceu em 1898 na. cidade de Natal. Casado, tem 4 filhos . Altura., 1,82 . Sapato, n. 0 40 . Olhos verdes . Colarinho n. 0 38, ma.s .tem e "pescoço forte", na. cla.ssificaçiw do poeta. Manuel Bandeira . Cabeleira curta e meio grisalha, ma.s suficiente. Apesar de não usar óculos, um oculista descobriu, J:e1!enteme nk, que é miope há muitos anos. E' de formação cat~lica.. Só vai a. missas de 7. 0 dia e de ação de graças . Diz que deixou de ir à. missa. por causa dos sermões dos pa.dr es. Gosta muHG dos seus vi-zinhos. Dorme cedo e acorda. de madrugada. . Seu prato predileto : feijoada. brasileira. Nunca jogou e det-esta o jogo . Nunca fumou e tem horror ao fumo . Sua fruta. prl!dileta: guajirú. Se pudesse recomeçar a vida, faria o contrario de tudo o que fez a.té h oje . Bebe com prazer, ma.s com prudência e moderação. Não gosta de l>ichos. E ' médico . Acredita em vitaminas. . Romancistas brasileiros de sua predileção: José Lins do Rego, Gra.cilia.c.o Ramos, Cyro dos AnJos e Jor~e Am Poetas brasileiros de sua predileção: Manuel Bandeira, Cario s Drummond, Xibeirll Couto, Olegário Mariano. A derico Schmidt e Adelma.r Ta.vares E' fatalista . • Teme as doenças h umilhan tes e longas. Uma Exposição De Picasso (Conclusão da 1.• ·pág ,) inferior aos do 'mestre fran– cês. Tais liberdades - diga– se de passagem - só são per– .mitidas pessoalmente a Pi– casso. Fosse outro o imitador e todos aponta1 iam desde lo– go o erro, ·sem a menor in– dulgência. Aliás, era perfeita– mente natural que, no come– ço de sua carreira, ele so– fresse a influencia de Tou– louse-Laut rec. Mas, hoje, de– cvrrido meio século duma vi– da artística cheia de fulgor, uma fraqueza dessa ordem não se justifica. Nesse ponto, a oµinião dos críticos era unâ– rume na censura a Picasso, cuja preocupação em perma– necer moço é a inda evidente. Também não passou sem r e– paro o espírito de aventura do artista, que se mostra. qaase sempre de sprovido de s~nso critico. Por sua vez, ressente-se de coerencia a quase totalidade de seus tra– balhos . E isso não deixa de prejudicar a expressão de su11, obra, pela ausencia de pro– fundidade que na mesma se verifica . P icasso já velho o_uer, a toda força , parecei: jt,~•em e capaz das proezas a que só se atira a mocidade. Vários dos óleos de sua 1U– tlma fase estão feitos sobre madeira, Picasso deixa sem prntura pedaços do quadro, os qua is em breve muda rão de t::malidade, alterando a re la– t :io das cores empregadas . Num desses quadros, o · ama– relo de tibua nova em breve t'.eixará de manter a mesma correspondencia oom os ocres usados pelo artista. Por fim, o abuso das deformações taro– bem termina fa tigando o vl– siLante, na medida em que se terna o problema quase ex– clusivo do pintor, que enfra– quece a sua obra, prejudican– do a composição e os outros valores que fazem a grandeza dos mestres antigos. Mas, no meio das realizações menos fC'lizes. há quadros notáveis, clois ou três dentre sessenta, aiguns dos quais de grande t amanho. Uma figura em a!!larelo, azul e cinza era pa r– tkularmente soberba. Diante d€Ssa tela, disse Llonello Ven– t,1ri, com a sua argúcia habi– tual : - Picasso é semp1·e inte– rrssante, mesmo nos erros que comete . E basta apena.w que faça dois quadros bon, coroo este para que a critica. se sinta no dever de aplaudl– lo. Ao lado desse juízo favorti– ve-1, pude ainda notar que, mesmo os críticos ma is im– páticos a.o modernismo, jli passa1·am a julgar o mestre de " Guernica " oom uma cer– t.1 severidade . Foi esta a im– pressão mais viva que me fi– cou dessa Exposição Picasso, 11a "M1ison de la .Pe.i1s<!e Française ·•. 1 Há dias recebi carta do eminente critico peruano Luis Alberto, Sánchez pedindo-me que lhe ~nviasse com ur– ge.::cia a "História da Literatura Brasileira", de José Verissi.mo . Tive de responder-lhe que o livro se acha resgotado há muitos anos, embora sempre procurado por nacionais e estrangeiros porque é um dos nossos livros fundamentais. Não sei a quem pertencem atu– almente os direitos da obra, se à familia, se a Bri– guiet & Cia ., sucessores de Gamier, primeiro editor. Como quer que seja, convém que alguém se mexa pa– ra que os. estudiosos da nossa literatura tenham uma nova edição, atualizada e comentada, do precioso li– vro. Certo foi Verissimo o nosso primeiro grande criti– co literário. Creio poder- falar assim, sem menosprezo , JOS Junior, "contra forma o intimo louvor, de dize locou sempre a ticas e das sed guém sem restr sis; que foi ent admiração. Ta ou simples anti damentalmente da obra admirável de Varnhagem e de Silvio Romero. caráter. Rome Varnhagem foi sobretudo um historiador, e a história tradizia no tra da literatura era por ele tratada como um setor da vi– da intelectual de um povo; Romero, um critico no sen– tido amplo, mais preocupado com os valores sociais da Romero, que ce peramente a V preendesse mel literatura. Verissimo encarava a literatura de um banado. "Não ponto de vista mais restrito: para ele literatura era apenas arte literária, sinônimo de boas letras. Toda- de mais gr.aça via não se limitou, no estudo de nossa literatura, ao · mos nom~. a ;ir critério puramente estético, segundo afirmou Romero; cholice Ôu a c ocupou-se, com muita atenção e simpatia, daqueles alegria ingênua nossos autores que, não obstante sem qualidades pro- graça não admi priamente literárias, tiveram qualquer influência em absolutamente nossa cultura e a fomentaram ou de algum modo a re- a sua. hostilida velaram. A sua "História da Literatura Brasileira" não nem hesitações, tem o brilho das generalizações, nem os atrativos de lar, um pouco estilo da de Romero . Era, porém, Verissimo um espi- fundo bonache· rito mais ponderado que Romero, e o seu livro abunda mero é o mais em análises que são modelos de critica objetiva, em que eu conheço juizos que sentimos baseados na leitura conscienciosa, co, todas as n no t rabalho de primeira mão. Não se lhe nota em toda como os mérit a obra aquela contradiç·ão que assinalou em Araripe uma das mais o Homem Do s Deu alguns passos na estrada, alongou o olhar por sobre as árvores, e uma impressão de paz empolgou-lhe a consciência, enquanto as retinas se coloriam à luz serena da tarde que vagarosamente se extinguia. Por instantes perdera a memória do crime. Mas, de súbito, atent ando na coloi:ação sanguinea que fechava o ho– rizonte numa volta da estrada, baixou o olhar para as próprias mãos: as manchas de sangue lhe tinham de– volvido, num relance, a jmagem de Fronza morto, es– tendido no chão. Quase no mesmo instante, sustou os passos. Ficou indeciso, sem saber se deveria ir ou vol– tar. Teria realmente praticado o crime ou estaria sen– do vitima da imaginação doentia, que às vezes o tortu– rava? O sangue lhe manchava os dedos e as mangas do paletó. Então, com rapidez, deu de andar, agora em sentido contrario. Onde teria ficado o corpo de Fron,. za? Sua memória se tornava espantosamente confusa. Num começo de delirlo, alteou a voz: - Fronza ! De longe, as quebradas da serra lhe devolveram a voz, num tco que mais o aturdiu. Rt:lanceou a vista em volta, como se..- suspeiLasse que alguém se viesse aproximando de sua pessoa, para assassiná-lo pelas costas. Depois, vendo bem que estava só, acele:,;ou os pas– sos, sempre a inspecionar a margem da estrada, à pro– cura do corpo . Ouviu, à distancia, o rumor de um car– ro . Num salto, receando ser surpreendido, enfiou pela mata, procurando esconder-se . Galhos e cipós quebravam-se e t orciam-se à sua passagem. Os ramos dobravam-se, no impeto de sua fuga. E João Gabriel, possuido por uma violenta sen– sação de pânico, aquietou-se afinal por trás de um tronco, de modo a coar, na direção da estrada, seu olhar espavorido. Seu pavor cresceu ao perceber que o car ro diminuira celeremente a marcha e estacara nas proximidades do lugar em que estaria estendido o cor– po de Fronza . A noite vinha do alto, como se t ombasse das árvo– res . Mas a luz solar ainda se diluía no espaço, lutando com a sombra densa que lentamente a dominava. Perto, t alvez à dis tancia de uns vinte metros, um Trê RESUM Surpreende na porta do ba tomara. ao sair chofer desconhe serta., onde os luta corporal, I Encontrando n Gabriel conseg em seguida. . De se no ma.to . riacho coleava mor das águas. escuridão em b nos vãos aberto são de OUTir du o ouvido - m se punha em m diziam. Quando a sentido do riac va -lhe os movi lhe uma das mãos e os pun à estrada. Ia n caiu. Sent'Ol.1-se olhos cerrados, Ao despert farol de um ca sua pessoa. Er rer. Era o luar serra, cintlland da. João Gabrie ta. E recomeço ra do corpo de sos lentos, depo havia desapare crime? De mo de perto as m sangue: tornav

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