Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1947

, romél,nce con1 que o sr. O Adonia~ Filho estréia nas letras ·de ficção, Os Servos da Morte, dá-me opor. tunidade de registar a ocor. rência no BrasiJ d a mesma onde de neom.isiticisn10 que nos últimos anos vem carac– terizando as literatu-ras f,ran– cesa e de lingua saxônica e c;iue représenm.. segundo o sr. Maurois, os primeirós sinto– mas de um "mal.do- século", o que conco1,da com o diag. nóstico "romantismo do século vinte". do crítico francês An– <lré Roussea1,1x. A un1a eufo– Tia daquilo que com certa do~ de "naiveté" c:ha.mamos no B rasil "romance social" . isto ~. romance documentário, des. "1igado de sérios compromissos p sicológicos. visando, antes. re– ·tratar as peculiaridades de uma socí-edade. de urna ·regíão o u de. u-m grupo. sucede ago.. ra o "romance psicológico", dj';nsamente carregado não só dQs conflitos de consciência, que :i primeira vista o defi. n e-m. n1as, nota-dame.n!e. de uma infiltração acentuada e caracteriz-adora de sinais mís– t icos ou sobtenaturais, · Duas obras de ficção. sur– gidas a pequeno intervalo l.Ulla ôa o •.1t.ra. servem-nos de mag– nif3ro exemplo para essas afirmativas: a excelente nove– l-a do St'. Reinaldo Moura. "Um rosto notúrno". gue repe. .t e mais viva e mais arroja. .dã,meJ1·te as sqnda-gens em pro– fundida4e que já tinha expe– ri:rnentado em "Intervalo pas– sional" (e que ainda surpre– endein, partidas de um pó_eta s ín1bolista, de um discípulo. dessa corrente poética. emí– nente.ment:e misti-ca e "espiri• tual")'I' e o presente ro1nance 'do sr. Adonia'S Filho, onde tão b elas qualidades e tantos si– T1-ã4$ inçonfundrveis àe perma. nencia se misturam eom a.1- g vn s defeitos de técnicas fa– cjJmente reparáveis para que1n __ disDÕe de tant-0s recursos. E' v.erdade que recursos n1ais propriamente i'!lte]ec– tua is do que de vocação ro– man ~sra. criando uma incóg– n iita que s6 no futuro pode– rá resôlver definitivamente. Q uen1 sabe. até, se o conheci– mento que o sr. Adoni::rs Filho d-emonsira possuir da arquite– tura rqmanesca não o leva a ,ima es,pécie de virtu<n;is-m-0 . , , • • • 1 ·- ·- --- Domingo, 3 de agosto de 194'1 - . Diretor: PAULO MARANBAO NUM. 37 Neomislicismo Na Literatura Brasileíra rior qua,Jid,ade p erturba ern a.1-guma coisa a espontaneida• d-e dá obra..de-a,rte. Essà preocupação é visível princi:J>almente I:ª fei:1 ;u.ra ~-0s diálogos, todos el es dêmas1a– damente "litérari'os". demasia. damente dista.nciados çla na– turalidade da conversaçã,o em geral e da, conversação que se supõe nos personagens, em pa.rticular. Repetindo o ambi-ente pesa– do e misterioso "Wutherin,g Hei•ghts'' . o · sr. Adonias Filho ANTOLOGIA (Copyright E.S.l. coiri exclusivi<la<:le para a FOLHA DO NORTE, neste E sta-do) desenvolve uma dialogação to mais fãcU de evitar quando que pe,i:ten{:e a seres de condi- se sabe que, embota Os Servos ção sóéial e cultural superior da Morte se. p,,_1sse no mei.o ca. à das suas criações e dessa caoei·ro da· Bahia. não tem ver. forma origina ·um d~feito dis. dadeiramente, nenhum com– sociado.r na obra, prejudica. ~ promisso regional, nem sendo fundamentalmente a unidade a dôr local de vaJor sensível que deve existir. no romance, na hisfória: esta poder-se-ia entre o,· personagem- ~ o seu desenvolver indi' fere11temen.te mo(!.o de expressão. Coisa tan. no outro ambi·el}fe e só ganha- ria se a vivessem personagens de uma situação in~electual e !,ociru. mais elevada. Há uma disjunção en tl'e aquilo que o roma1i.ce represen'ta e os in. térp,etes que 1:> vivem; há um desnjvel entre a alta q,ua1ida– de do. Ji'l71'o com relação à baixa categoria dos herois. Cr iando figuras de u.m ll,tra– sâdo meio rural brasileii:o. ainda po.r · cima des;ligadas com:pleta.1nente d€ ludo aqt1 i– lo que no mund-0 represel'lla polimento e cültura pare-ee. r -~---------------------·--------------- 1 • • SEQUEI O MAR. MATEI OS ·PEIXES. VENHO DO VICIO, DA LAMA ESCURA. QUERO DE Bli.UÇOS CAIR NO CHÃO MINHA PALl\:VRA. CAIU NAS PEDRAS. SOU VOSS.O MUDO SENHOR MEU DEUS~ V·'l::?JTO VIOLENTO TIRAR MEUS OLHOS, DEIXAR QUE O FOGO VENHA LAMBER MEU CORAÇÃO, QUE VALEM OS OLHOS NA ESCURIDÃO ? SEQUEI O MAR, MATEI ·o MUNDO, AVES DO CÉU COMEI MEU CRÁNIO, - JO.RGE SECAI MEUS TÍMPANOS, EU TENHO MEDO DA IRA SANTA. · DEIXAI SOMENTE DENTFI.O DE ~IIM . A PRIMITIVA DOR QUE REINOU. VENTO DE BEUS SOPRAI MINHA DOR, A PRIMITIVA. DOR QUE REINOU. DE LIMA - me que o sr, Adonias Filho deu-lhes, não uma capacidade exágera<Ía de conflit~ J?Sico– lógíoos (que afi'Ilal se admitem j~almente possiveis .J?At'a _to-– dos 0 s homens) mas uma im~ possivel facilid,ade de "expri– milos" logicamente no diálogo ou no mouólogo. O. que j_ã é de acei·tação basta•nte proole– mática. ·Pois é sabido que o 1,11e.smo para pessoas (!.e ele• vad'a ''r';ln"" cultural e sociai ..,, . . certos estados de conscl€llC1a s~o a 'í.ti 'ciln1ei1 te "realizaveis" pela con1:i$sâo a sl mesmo ou ' a outrem. e permanecem o mais das vezes na indistint a nebulosa interior. sem p.ossi– bilidade de tradução consei. ente. De res-to. r aranlente se consegue ess·e exame lógico dos f,enoinenos anteriores se'l;ll cai, n o equívoco terreno li• terário; por isso mes1no pouco sincero e da! pouco natural. Quando não se r~liza a que• da -do,; abismos 11'.aiçoeiros e viscoe'nto-s do ridiculo. assas.• sino in1píedoso de obta.de 3,rte. Se ísi;o aco-ntece, eri.tâo. com oi; per-.sonage_ns cate,gorizados. con,1·0 os aristocra,tas Derrtor– _gam ou Wus]ey, por exemplo, isto é, se mesmo êsses perso,, nagerrs para manterem veroo• sirriilhança devem evitar a fa.. cilidade eNag.eracta no traduzir a sl,la vi{'la interior-. muito m.ai.or são as diiiculdades e os cu'idados do ronlancista que, · como o sr. A~onias filho. _di~• põem-se a movimentar r\lst1• (l°Os cam•po,neses. mars ou me. •nos ali.enad.os no. duplo se,rt• ti(!.o da palavra: afilstaçlos éla no-nnalidade por um tra~o d;e lou,cura. e do 1nundo por uma p a!'ede de isolamento. ' E'. de fato . o defeito miiior dêst:e romance: a c;liafog&.ç~a que s.e mantém íninterru'Pt/4!.• -Tnente a uma altura qtte os -per~-on-agens, pelo que 1í o~ s U• gere e nos exprc:;5,$a o auto?', não po<le1n alcancar, e também a sue ânsia de dizer tuilQ- de exp.rimir coinplet.ámente. ~qui. l o que déveria :!nteS" sug~rlr ou p e ~mít.ir ao leit0<r qu,e compJe,, ta,~se. Os m~nores att,s dos !Je• hóis são Jogjcamente dPScr:ios pelo $r. Adonias Filho, do n,es. mo modo oor aue o.s seus me. n or es , en time-n los encontram tr!lducão l1xageradamente li• terária • O :;_r. Ad.onias Filho parece. ast :n1. ' ter construido' o seu 0 li• vro coin 1.1::n1 excesso ·de espí– rito c'rítioo, com um C'1,ll(!.ado extremo de a1Jálise. nao o. obrigou a construir o ron;iançe d·émasiadamente lite. rârio. on,de a µreocupação de se manter no nivel de supe- ,,,____..,:;.._______..0,.________ ·------------------------ Desapareciin.ento De Luisa ?ede-se a quem •souber 1 ,_ __ do paradeiro de Luísa Porto avise sua residê11cia à rua Santos OTeos, 48 A vise urgent<a so!itaria mãe enferma enírevada há iongos anos, erma de seus cuidados. Pede-se a quem avistar - L uisa Porte, d~ :trinta e sete anos, Oue apareça. que escreva. e · que mal1de dizer onde es:tá. Suplica-se ao t'eporter amadoT<, ao caixeiro. ao ma-ta mosquitos, ao Iranseunro. a, qualquer do povo e das cl~sses médias, até mesmo aos senhores 'ricos, que ienha'Ih pe11a de m:ãe aflj.ta ' e lhe restitua,n a filha volatilisada ou pelo menos dêm informacõ~s. . ~ E' alta, magra, more.na , rosto pe.nugento, dentes alvos, sinal de nascença junto do olho esquerdo, levemente estrábica. Vestidinho s~inples. Oculos. Sumida há três· meses. Mãe entrevada cliamando. • Roga-se ao povo c~ritativo desta cidade • qu~ fome em consid,eração um caso de familia tfigno de sitnpa 1 especi 1. L'lisa é de bo,nt ger.tio, cor r1:11 iga, 1rRHalhadora, reügiosr ~ IUl Í'~!A. Cti.i • ' -- Carlos DRUMMOND DE ANDRADE - (Especial para a FOLHA DO NORTE, n""te Estado) Levava pouco dinheiro conf.igo. (tflocu.rem Luisa,). De ordinário não se demorava. (Procur.em Luisa). Namorado isso não tinha. (Procurem. Procurem). Faz tallla falta. Se todavia nãp a encontrarem nem por isso deix em de procura2- com obstinação e confiança que sempre Deus [recompen~:3 e talvez enconire. . Mãe, viú-va pobre, não perde ·esperança. L uisa ia pouco à cidade e aqui no bairro é onde melhor póde ser pes- [quisada. Sua maior amiga, ·depois da m ,ãe enferma, é Rita-Sant'Ana. costureira, moça des~:tnpedida, a qual não dá notícia nenhuma, limitando-se a res:ponder: Não sei. "- O (ple não deixa de ser um tanto exquisiio. Somem tantas pessôas dial'iamente numa cidade como o Rio de janeiro que falvez. Luisa Portó jamais seja encontrada. ' Uma vez~ em 1.898 ou 9. sumia o próprio chefe de polícia que saira à tàrde para uma voltíl no largo do . ' Port o e ~té hoje. A mãe de Luisa, ainda jovem, leu no "Diário Mercantil", ficou pasma. O jo_rnal embi·ulhado na m,_emória. • Mal sabia ela q u e o casamento curto, a viuvez, a pobreza, a paralisia. o queixume sel:'iam, na vida, seu lot e que SUíl úni,;a filha, afavel. posto que e_strábica, se dispersaria sem explicação. Pela úliima v~:z: e em nome ·ele De\li> Todo Poderoso e cheio de -misericordia procurem a moça. procurelrl, . essa que se chama Luisa Porto • • e e sem namoraao. Esqueçam a lula política, ponham de ladq preocupações comer:ciuu; percam um pouco de tempo indagando, perquirindo, remexendo, • • Não se arrepanderãd. lltão há gratificação maior do que o sorriso de mãe em festa e a paz intima consequente às bôas e desinteressadas ações. puro orv,alho de alma. Não me ve:nha:m dizér que L uisp se suicidou. O santo ,lume da fé ardeu sempre e,m sua alma que pertence a Deus e a Teresinha dô Menino Jesus. Ela não se matou. Procuren1-na. , "Fa:mpoucô foi vitima de •desastre que a policia ignol;'a t~ Conclusão ~ a!' 11.a,.) '

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