Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1947

• • Domingo, 8 de abril de W T FOLHA DO NORTE a.• Págf• POETIGOTERAPIA , ............... .............. .._. -- Pierrl DESCAVES -- ' PARIS, Março - E' um fa- lo: n.un- ca a Poesia foi mais popular , ou melhor, n.unca se 9eupara91/tanto com ela, como hoje, E a:nça. Duas recen- 61!8 manliéstações ilustram ês– • i.t1\oresse e, podemos dizer, & se interesse prãtico. René Al– bert Gutman dá à publicidade uma ''Introdução à leitura dos ~tas franceses", num grosso volume, com a preocupação id.e aju<1ar os leitores, porque o a utor estabelece a premissa .t.e que, ~n<io a poesia desti– nada a todos Ce não apenas • alguns cenáculos de inicia– itosJ , tão somente a poesia q ue sobrevi~u e passou de 11.lDl século para outro, é a que despertou as mais profundas ~ ãncias no maior número díe corações. Isto posto, não convém julgar (como foi su– eerido por Julien Benda, num recente e sugestivo estudo) essa poesia, sob o ponto de ftta dos poetas, mas, em re– lação aos que a ouviram, en– lend~am, difundiram e apre– ciaram, René Albert Gutman aconselha o isolamento dos .,ca,ndid,atos à leitura poéti– ca". Um outro perigo para o lei– tor de versos é a T. S. F. qu.l não sabe "respeitar os silên– eios... Para que tomemos con– tacto com um poema, é ne– eessário que se esteja isolado e em silêncio. Se o poemti agrada, não devemos hesitar: le iamo-lo, Togo, em voz alta, m usicalmente, para apreciar– llllOIJ a qualidade sonora das ,wogais, o fácil cw-lizamento itaa consoantes, a sua suavida– de, ou então o seu áspero mar– lêla.m.ento, etc... "Enquanto llãt> iÍoubermos ler um verso, DM saberemos apreciar um poema", diz, rud~te, o nos– • ini.çiador. Todavia, no as– .,.., há coisa melhor: Mme. ~ -Guill~t acaiba de publi– ma- um livro intitulado "Poe- • ' • • ' ticoterapia", no qual esta des- oendente de Claude Bernard expõe com a maior seriedade, como c1.trou doentes. . . cóm transfusões de poesia. De fato, professora na Escola de Psico– logia, Mme. Lucie Guillet de– diêou-se, atentamente, ao as– sunto que estuda. Parte do prltreipio de que o fluido poé– tico poae ser considerado como a sintese de três poder1<s: o rit. mo, o som e o pensamento; lembra que Hipócrates, no seu tempo, fe,z da poesia a auxiliar da música e, baseando-se nis– to, esforça-se para determinar 11s qualidades sonoras que es– (ão em concordância com as l eis harmoniosas do organis– mo que se q uer curar. Um fluido poético determinado po– de ser comunicado aos doen– tes, mais principalmente aos n&vosos, aos deprimidos, aos ansiosos. A "poet!coterapeuta" deve saber, evidentemente, que o alexandrino clássico é u•m regulador excelente e ... a té sonifero escondido, não passa de um simples calman– te; q ue o d~assila,bo influe nas nevroses; que o octossl– Ja,bo tem efeitos, mais ou me– nos, tônicoo, de acôrdo com a colocaçâo da cesura; que os versoo de 5, 8, 7 e 9 silabas cam,l:>a.tem as obsessões. Enfim, na aiplicação, d~e-se consi– drrar ainda outros elementos, como as sonor idades graves, agudas, doces, vibrantes, ave– lu_dadas, as surdinas, oe rit– mos. Supõe-se que semelhante home<>patia exige tato, dedo e medida. Victor Hugo escreveu pro– féticamente: "Queres curar teus mal-es e atenual' as tu.as tristezas? U os poetas s.a,grados. Me– dita junto aos seus tronoos de suplicio. Um verso é um socorro. To– do livro é uma esmola". Sem tomar ao pé da lebra - • • -n ..... _..._ ... -- !¼TEZ L (Conclusão ela últ. pâgina) acolhedor, .1ma pa.lavt-a bôa. Um dia, ouviu a voz desejada.. Entwetanto, áspera, ·mandando que a de:.. a$Se em paz. Pre– tendeu balbuciar uma. descul– pa, mas deante .:aquele· pavor que ela manifestou no olhar, fieou, por sua vez, mudo, des– norteado, como no dia em qu:e as>su,stára a mad· ::iha. Não q_l,le1·la fa.~r mal. Nada que. ri,a. Ela não acreditava al99im. E certa tarde, veio protegida por dois policiais, que se ati– raram sôbre o homem, com as precauções de quem Ilda com um louco. :S:le assustou-se, encolheu-se, volveu os olhos em busca i:ie uma proteção, e viu a moça do sinaL de lábios cerradoo, fitando-o t,ri– unlante. P esado ciu:etête de borracha caiu-lhe sôbre as costas. Era a primeira vez que alguem lhe ba.tia. Não encontrou a madrinha pa,ra gua.rdã-lo entre aquel~ ura– cos, onde ê}e esqueceu que a vida não é igual para todos e n un.ca chegou a saber que dentro do mundo social paira o amor tambem existem escalas. P&-se a an– dar, cabfa babco, pensativo; es– quecido dos gua-rdas que o la– deavam, e nem se apercebeu, quand:, eles se escaparam. E lá se foi , desembaraçando en– tre os dedos agitados todo um novelo de idéias confusas cambaleante, equillbra.nd <> os passos apena.a por in&tinto • • por um caminho tortuoso, descendo..• e do verso -, as worias de Mme. Luci-e Guillet, só pode– mos nos regozijar vendo com q ue carinho, nestes tempos de calamidade, estamos cercando e cuidamos de u tilizar a divi– na poesia, que já é por ela mesma e por destino, um ma– ravilhoso meio de evasão. •••••••• • • P UEDO escribir los versos más tristes esta noche. Escribir"' por ejemplo: "La noche está estrellada • • • - • •• - • y tiritan, azules, los astros a lo lejosª. ' El viento de la noche gira en el cielo y canta. Puedo escribir los versos más tristes esta nocbe. Yo la quise, y a veces ella t ambién me quiso. En las noches como ésta la tuve entre mis brozos. La besé tantas veces bajo el ciel9 infinito. Ella me quiso, a veces yo también la quería. Cómo no baber amado sus grandes ojos fijos. Puedo escribir los versos más tristes esta noche. Pensar que no la :tengo. Sentir que la he perdido. Oir la noche inmensa, más inmensa sin ella. · Y el verso cae al alma como ai pasto el rocío. Oué importa que mi amor no pudiera guardarla. La noche está estrellada1 y ella no está conmigo. Eso es todo. A lo lejos alguien canta. A lo lejos. Mi alma no se contenta con haberla perdido. Como para acercaria mi mirada la busca.. Mi corazón la busca y ella no está conmigo.. • La misma noche que hace blanquear los mismos árboles Nosotros, los de entonces. ya no somos los mismos. Ya no la quiero, es cierto, pero cuánto la quise. Mi voz huscaba el vien:to para :tocar su oído. De oiro. Será de oiro. Como antes de mis besos. Su voz, su cuerpo claro. Sus ojos infinitos• Ya no la quiero, es cierto, pero tal vez la quiero. Es tan corto el amor. y es :tan largo el olvido. Porque en nocbes como ~s:ta la tuve entre mis brazos, ~i alma no se contenta con haberla perdido. Aunque éste sea el último dolor que ella me causa y ~tos sean lo<i últimos versoii que yo le escribo. • P{\BLO NERUDA • .,. Movimento Literário aua prestigiosa coleção "Espí– rito Modemo". A proposilo, recorde-se que por ocasião da 11\la eleição para a· Academia, na vai,& de Alcantara Machâ– do, tol muito citado um ensaio do sr. Geiuuo Vargas, escrllo nos tempos de estudante em Porto Alegre - "Zola e a cri• tica". Ensaio na verdade, mui– to mais ci l:id-o do que lido pois, ~gund o parec'e. a não ser o sr. João Neve;;, ningu-em o conhece h<.' ie em dia. AGRIPPINO GRTECO ·EM S. PAULO Esteve recentemente em São Paulo, aonde foi pronunciar uma conferencia sôbre Castro Alves, o conhecido critico li• terário Agrippino Grieco, que, falando aos jornalistas da pau– licéia, acentuou q ue sua via– gem era de carater apenas cul– tural. roa). O livro adquirido f ol pu– blicado em Cambridge, Mas– sacihussets, em 1640, e intitu– la-se "Bay Psalm Book". PROXIMAS EDIÇõES "Poesia até agora", seleção de poemas de Carlos Drum• mond de Andrade. (Livraria José Olympio). CART:\"i DE ROll.1A.lN ROT.LAND , O ilustre autor de "Carcassas Gloriosas" esclareceu ainda que a Livraria José Olympio Editora publicará as suas "Obras Completas", em 11 vo– lumes, sen<io que o prime:ro a aparooer será "Evolução da Prosa Brasileira", seguindo-se os demais em rápida su-cessão. UM LIVRO RARO E CARO Recentemente, nos Estados Unjdos, um conhecido e rico negociante e coleciona.dor de livros raros, o sr. A. S. W. Ro– senbach, adquiriu uma das obras mais preciosas q ue se conhecem na terra do cinema, pela impressionante quantia de 151.000 dólares (aproxhna– d.amen t.e 3 milhões de crU%el- - Ulisses", de James Joyce, em tradUÇão de Hamilcar de Garcia, a se-r lançado pela Li– vraria do Globo. - "Morro dos Ventos Ui– vantes", de Emily Bronte, em comemoração ao centenári o dl> seu aparecimento. Edição da Livraria José OlympiQ, em tradução da rom~ista Rachel de Queiroz. que é hoje uma das nossas melhores e mais ativas t~-adutoras. --0 segundo volume da "Introdução à Antropologia Brasileira", do prof. Artur Ramos, obra que vem sendo lan98,da pela Editora da Casa do Estudante d-o Brasil. - "Zola e seu tempo", d'e Matthew .Josephson, será o próximo lançamento da Com– panhia Editora Nacional, na Os ano,c,:•)S de Itomain Rol– land, o í nes(}Ul'civel autor de ' 'Jean Crislophe", agrupando– se em torno da viuva do es– critor, sob a p residencia de Paul Claudel, tomaram a si uma tarefa l.mensa. Depois de aua primeir a assembléia geral resolveram Juntar t oda -a cor– respondencia do romanoista, por meio de cópias ou micro– filmagem das cartas mais in– teressantee. A todos que pos– suam cartas do escritór, pede• se q ue comuniquern 9e'US dó– cumentos à entidade "Les Amis de Romain Rolland", 89, Boulevard de Montparnasse, Paris". - .1 N V E NC I O N I SMO (Contm~a na últ. pãgina) tulos interes6alll muito pouco. Mas no caso do tamente por onde uns nos distinguimos dos invencionismo, como doutrina, e estabelecida outros. Chegamos afinal à afírmação im– a sua origem, não é d emais assinalar o equi- pli.cita, de todo gratuita, de que a arte 1'igu. voco e a confusão que &e desprendem de sua rativa é id-ealista, e a arte abstrata {perdiol formulação estética. Assim, declara o mani- concreta) é materialista, como sé materialismc ~to da Associacion Arte Coner-eto-Inven- e espiritualismo não p udessem insinuar-se em cion que "s6 por um mal-entendid o idealista qualquer modalidade de expressão artistica. foi possivel chamar de a-bstratas as expen-· A estética inve~ionista dev-e apresentat ências estéticas não representativas". E o sen- obras assexu,ad-as, de onde a curva esteja pros– ti_do anti-idealista do grupo argenti.no .e con- crlta, porq:~ a curva, por seu sensualismo, ~,ado pelo seu analista Juan Jacobo Ba - nos 1-embra a figura, a ani!<lota, a oireunstân• Jarlta, num lívro interessante, rico de suges- ela subjetiva, que não interessa ao puro con– tões sôbre a poesia moderna, "Literatpra de ceitualismo. Por sinal q u,e foi ai que ,se m•· Vanguardi.a" lCol,ección Universal, Editorial nifestou a cisão entre os estetas: em def esa Araujo, Buenos Aires, 1946) , que anota o "ma- da linha curva (e quem, entre nós, humanos, teria,lismo dinamico da t.eorla algo, ~o ter- não a defenderia?), separou-se o sub-grupo reno d-a arte, assim como - excuses clu peu Madi (palavra inventada, como convinha), 'e - o materialismo dialético, no terreno eco- que, P<)6,to advogue uma arte "1natemálica, nômico... O invencionista pretende a,lcançar fria, d inami.ca, cerebral e dhdética", reco– a comunhão social pela arte pura. Não há e\ti- menda em francês: ''E' preciso manter ll,lert11 dentement.e atitude lntelectual mais indivi- os sentidos". dualista do que esta - e a negaç~o extrema Este, em Unhas genús, o "novo h umal'llS• do individualismo, ill<iiv.iduallsmo é. De resto, mo" ~ nos vem do Práta, e que Ba jar liai curioso materialisn10 êsse, que se despoja das considera a primeira t.~ndi!ncla ~ yanguarda formas organizadas da matéria para concebê~ oriunda da América Espanholà. Mas. receio las e recciá-las iut.eleotualmeote, ao sabQr do muito que não seja original, e nada haj'à io- • espírito de invenção de cada qual, que é jus- ventado. . ......................................................... ,, ... . . .. 1 . De Osvaldino •••eeeeeeeeeeee•••••~Ml COMPOSIÇÃO Varanda aberta Sôbre o ocidente, Menino tímido Debruçado em poentes Aves revoam Acima das fragas: Referve a espuma Na linha das conchas A graciosa vela Arfa no horizonter A onda é uma égua De crina açoitada. Palmeira esguia Se refrata em sabre,. Basta leve brisa: Glissando de imagens Sussurram lá dentro Na zona de sombra Faces antigas Revendo retrato• O grito o sequestra Para o fundo do mêdo; A guela do sono Deglute o enlêvo • • 1 • Marques • ••••••••••••••• MOTU - PERPETUO Não vôa o tempo Não fogem as hora• Ai ! somos nós Oue decorremos. Guinchos estrídulos Na demissão Do ventre escurQ - A luz ofusca ! Buço azulado Mamilos duros Voz de falsete Entremeada De graves tons Na transição Da pubescência. - O amôr irriga Rugas vincadas No pergaminho Da testa alta Bôca apertada Pranto nevoenta Olho alongado Para o princípic:,. - A vida abate ! Clamôr inutil Contra a avidez Da terr a escura - •

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