Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1946
2.ª Página FOLHA DO NORTE Domingo, 22 de seten:Jn-o de 19(6 **"***""•'-••···••***"***•••"'*"'**lrlt*••·······*~•····· .. ··Jf· .. ·~ emoção com que este "artüi• cial" colliia no campo as nô res mais singela$ e naturais" {Pág. 2761 mais sêco. E preciso multo Ct.Jidadô com a evolução do estilo. Vêr o exemplo de Flaubei;-l, Jâ disseram que Flauberl, de tanto pULir "A tentação de Santo Antõnto" terminou estragando a obra um.a agonia de rodas as horu. como foi a Wosoíia de Pascal e o misticismo de Santa 're– resa. Agonia q'ue se reflete nas páginas de ''Agonia do Cris– tianismo", de Unamuno, e naa páginas desse admü•á\'el "Jor– rin l de crítica" * i ·Espeoia.l p:n·a. & FOLHA no NORTE . NOTAS Llf ERARIAS i 0 "JORNAL DE CRITICA", DE ALVARO LINS 1 Estuda atnd.a l''rau Martins o ccitico José Veríssimo, e velho Rui. Escreve um traba• lho bem documentado sõbre o 13a1·ão do Rio Branco Quanto ao estilo, Alvaro Lins, parece, está se tornando u A literatura. disse-o o pró prío J\lvaro Lins, é uma ago– nia de todas as horas" Pois bem. a .sua critica eriadora é NOTA - RE'messa oc livros - Caixa Postal - 293 - For– taleza - Ceará. 1 :A'-lr• • • *• • *• **** *• * * ""** ABDIAS LIMA ,.._. ,,_ ,,..,..,,.. if• .,_._ ,,.,,__. +"- " .. • >t- Que,m escreve sôbre livros tem necessidade de estar em contacto com os criticos. No Brasil, não sabemos quem exerça a arte com mais digni– dade do que o sr. Alvaro Lins. E'. portanto, nesse mes– tre que vamos buscar estímu• lo e sugestões para fazer dessa colµna um cantinho de orien• t ação lilerária, uma coluna que inspire confiança. A primeira impressão que o autor de "Jornal de crítica" (3. 1 série - Livraria José Olimpio Editora - "Rio - 1944) nos transmite é de que não é somente um agônlca no sentido unamuniano como no– tou Aluísio Medeiros, ist:> é, a~nico em face de Deus. mas igualmente em face das l)bras que esluda. últimos Cartazes RlO - via aérea (A. U.) - Acaba de ser reeditado o ro• mance de Adriãno de Abreu "Dias de Ml\io", obra, aliás. sôbre a qual a ccltica muito pou.co se manilestou por oca– sião do aparecitnento da prl• meira edição. Adriâno de Abreu é filho do grjlnde his– torJudor Ctipislrnno de Abreu- ••• Ivan Pedro Martins, que fez t&nto rumor com a publtcação há três anos do roma n c e "Fronte.ira Agreste'', apresen– ta-se agora com uma obra no mesmo gênero : "Caminhos do Sul''. lançada pelaa Livr.µ-ia do dlobo. ... 1 '1V[em6rias de Judas'' . de P etrucelli DeDa Gatine é um velho livro que sempre encon– t ra leitores e já várias vezes edi tado em português. Lan– çou-o agora. mais 1.1ma vez, a Editora Pongetli . ••• Da mesma edilora "O Talís– man '', de Walter Scott. ro– -mance histórico que >Se -desen– rola no tempo das Cruzadas. ll'i!r ConcluÃo clA 1.• página Para êle e o critico João Gaspar Simões "uma obra que se procura esludar é como uma realidade quE se procura compreender". E enquanto não at)nge !I OUREJ~ da obta. isto é, o "núcleo existencjal" Alvaro Lins permanece insa– tis{eito. As suas conclusões têm para nós quase o pêso dos axtomas S1,1bemos que na procura da verdade é mais do que um crítico: é um apóstolo. Isso não quer dizer que srmpre realizan10s un1a leitura passi– va dos seus livros. Por e,cem• plo. não gostamos do tom po– lêmico de ''Notas de um diá– rio de critica". As nossas sim– patias ou os nossos ódios são uma cousa. O nosso julg11_men• to literário é outro. Tristão de Athayde, silencioso e solll.á– rio diante da cainçadrt, deve ser wn exemplo a seguir. Aliâs, Alvaro Lins cita La Rochefoucauld: "Quando o nosso ódio é muito intenso, ficamos abaixo daqueles a quem odiamos". . Foi m;iis feliz do que nós. Compreendeu .e guardou na memória Csic) a "Pedra ,io ca– minho", de Ca!'los Drumond de Andrade. Para nós essas peqras não passaram ainda da categoria de pedrl)S: cousas intragâveis. Receamos até que o sr. Carlos Drumo11d fique conhecidio. amanhã, uniCB· mente alravés desse poema, que não reprel!lenta a sua poe– sia. ll:, cousa dolorosa, sería o seu segundo atestado de óbito. Independência intelectual, probidade literária, mestre da critica. Vamos ilustrar a tri– logia . Nessa 3.• série de "Jornal de critica" o autor, entre tantos autores nacionais, que &te mais elogia, é um austríaco: Otto Maria Carpeal,lX. Afonso Arinos de Melo Franco zangou-se com a apre– ciação de Alvaro Lins a pro– pósito de "Dirceu e Marllia" ÃSI vezes entro na, pa.s&e absoluta de mlm mesmo E a minha esséncia é alguma coísa de palpável E de real. Ou.t.ras ~ezes, porém. ouço vozes chamando por mJm, Vozes vmdas de 1onge, vozes distantes que o venlo traz nas [tardes mansas•-_ Antes de falar do poeta, desejo transcrever um lrecho do estudo 'já citado p.o sr. 'Tristão de Athayde e no qual · nos ofe– rece do h01nem de ação um pernl que dilicilmeote poderá ser euperado em compreensão e agudeza: "O homem do quoli• d.iano, longe de ter horror à vida ativa, tem por ela esse .r;ôsto profwido que é uma dilS notas originais da psicologia do século XX. A ação, para o home111 moderno. não é um meio, como para o bemem do século XIX, mas um fim em si. E t~i., para êle. wna finalidade que diríamos esportiva. O hom~ do século XX ama a ação pela ação, por esp(rito de aUdácla ou ave1,1tura. e não como o b\,lrgnês do século passa– do. Esse espírito esportivo da atividade é o que encontra– mos no ''pomem" Augusto Frederico Schmidt. Conhece todo o mundo; já andou por meio Brasil; foi já duas vezes aos Est!ldos Unidos; vive melido em negócios variados; já vendeu larnnjas, aguardenle. modas, .reméçlios. madeiras, livros, que sei eu; sabe rir e fazer rir; é ex.uberan te. mãos largas, es,pi• rituoso, amigo de ho1nens de Estado, de milionários, de co– munistas e de maltrapilhos: tem vários escri\(lrios comerciais, como fundou e dirigiu várias revistas literárias: lida com mul ~o dinheiro e morrerá pobre. E' o lírlco da vida ativa". • Foi, aliás, como gerente de uma serraria em Nova Iguaçú qnc êle escreveu o seu primeirc! poema, Canto do bra.slle lro. Escreveu-o "ouvindo o aplto noturno d,;>s l1"ens, nun1a solidão ter1·ível, como ·confessou em entTevista a Franciscv de Assis Barbosa. E esta estréia em 1928 era lnconlestaveltnente uma voz de oposição ao que estava domlnante desde 1922. Êle o.ão pretendia, no entanlo. destruir ou anular o modernismo, quer na sua. qualidade de movimen1o, quer nas s1tas .figuras repre– sentativas. Nem isto seria possível, pois em Uleralura os lugares são tão intransferíveis quanto numerosQS: um movi– men lo não destrói outro, uma figura não apa~a outra, mesmo nos combates mais ferozes. O que fez o sr. Augusto Frederico Schntldl foi paralisai• uma determinada t~nd~nc4a do moder– nl.sm -0 quaudo já se ia desdc;>brando em poncifs. r"1as seria crimplesn1.e1;1te arcaica a sua obra se se llvesse mostrado estra. nha a um tnovimenlo 1ão poderoso e tão caractc.rlstico de uma época. Retomando, para continuá-la, uma tradição mais antl• ga, aproveitou, ao n1esn10 l.empo, aquelas conquistas do mo– dem ismo que não eram contingentes· e efêmeras, que per• tenciam à poesia e aos seus valores substanciais. Fechando uma ~orta. abriu, oulfa: encerrando uma fase do modernis.mo , ruia se deteve prei,o ao espólio: continuou-o e ultrapassou-o. Nos primeiroo versos do Canto do brasileiro, dizia o poota: "Ni,io quero m!1ís o Brasil Não quero ma.LS geografia Nem pitoresco. Quet"o é perde.r-me no mu:ndo Para fugir do mundo'". Desde então, os próprios títulos dos seus livros já cons– titue1n às notas de reíerênc;La de seu itinerário. Está assina– ladu pela desordem de p~nsan:iento e. forma, pela ansiedade, pela angústia. pelo desejo de Libertação. Debate-se apaixona– anmenle aro. busca d'e urna solução para a sua poesia. o que tlldica qt;Je também está procurando uin sentido para a prc$prla alegando que o jovem profes• sor de Literatura do Colégio Pedro ll não tinha lido o li– vro Alvaro Lins releu-o. E aqui está a sua opinião defi• nltiva: uma obra falhada. Corüt, Pintor Revolucionário E' um mestre porque nos ensina a pensar €!e o diz e antes dêle já o dissera Fa– guet: o crítico é um bomen1 que ensina a pensar. Há cento e cinquenta anos Nos seus livros hã inú1neras nascia Jean Batispte Corot passagens que vão beneficiar que havia de ser 11m dos o romancista. o poeta, o crítico maiores paisagi;;tas franceses ou mesmo os simples not-lcia• Era julho de l7<le Quanto ao ristas literários como nós. fila exalo c;lo 11ascin1e:nto. dl• ~e pró(>rio nos fornece ele- vergem os biógraf_.,_ A data mentos para este trabalho. precisa aliás só tPm impor– Por exemplo. eis o ret,ato do tãncia para os nstrólogos. seu estilo: Qualquer que tenhl\ sid,o o ''Ideal do estilo: un1. mãxl- dia exato em que nasceu Co– mo de trabalho para transml- rot, o certo é qu.e o recem• tir a impressão da ausência nascido veio ao mundo epm de. trabalho". "(Notas de um uma bôa estrela, son um signo d.i,ário de crltiea" - pág. 179) favorável aos artisl:ls Da i porque Alvaro Lins não Quando se contetnpla a bela pode oferecer um 'l'odapé li- fologratia que nos resia de terario com regul<)riqade. E ' Corot (de abril de 187:\J. ve– ttue a sua vigilância critica "vnos um velho forte cheio de val ao ernemo. Uma página corpo, com ·u•a máscara vo-– dessP. homem, que parece ser luntariosa. como qt,e esculrk "visjtado por iluminações" da na pedra brancJ de seu toma-lhe um tempo enorme. Fin~o natal, a Borgonha. Urna Por isso, a sua obra só sei·á figura de operário conscien• compreendida deün.itlvame11te cioso - como se disse - feliz ~elos pósteros- O'-! será .m~ de poder madrug1r no lra– tlvo de um "perpetuo ju1zo balho e trabalhar todo o dia. colocando.,se na eategoria da- com seus pincéis e trota5 co• quelas obras a que se refere loridas. Como um escn:up11\o– Azorin so artifice francês, Corot teve . As melhores pâg'inas desse sempre o cuidado de ta.ze.r l1vro que estamos comentando obra perfeita e muito amor ao são as que lalarn de Mallarmé, trabalho quotidiano; mas nãc. de Brutus, de Afonso Arlnos teve. jamais, qualquer respci• e da poesia inglesa. to às regras técnicas da ;Jintu- Sõbre Brutus: "Parece pe• ra nem observou :\S 'receitàS'" queno ~ante de César porque avoengas. Essa m~rcante per– César t1nh.a _tod~s os pode:ces, sonalidade artistica. aliás, se e Brutus o.ao tinha senão a estampa na sua fisi•Jnomia re– sua co_nsciência de cidadão. belde e indi!erenle. Mas nao será verdad~ - e Tinha o aspecto ilsico de este era o pensamento do ca- um artífice "dos bons tem– tólico Péguy - q_ue ~m movi• pos'", .ou melhor. de um menta !1a consc1ênc1a moral camponês. E a vida de tun pe– tem mais valor do que toa.os aueno burguês que vive de os poderes da terra 1 (pág. suas rendas, sem dramas pa- 302>: téticos. sem amores singula• Sobre MaUarmé: "Paul Va- •res ne1n episódios rornanescos. léry, por exemplo, assistiu à Sua obra. todavia. ·Coí de um FisionomiaDeUmPoeta vida . Em Canto do liberto lança os vestígios dessa ânsia de libertação que a sua m0<;idade tornava um pouco sem orientação e sem destino. Partir em todos os sentidos e em tôdas as direções - será o tema principal de Navio P1:rdld.o, Êle transmite a idéia, naquele momento. de um navio real– mente perdido: um navio que as ondas atiram para todos os lados, sem rumo e sem porto. Depois, a mesma angústia e a mesma incerteza ,farão com que se veja comq um pássaro cego, que percorre o espaÇO sem encontrar ponto de apôio: é a época do Pássaro Cego. A sua in§piração vai se lornando mais densa e 1nais consistente na mesma proporção em que o poeta começa a apóssar-se de maiores conhecimentos técni• Por ANTOINE SIMON (Copyrigtb do Snrviço Francês de Informação) pintor-poetii, de Ulll grande artista. Curioso contraste.- de um lado. uma vida prosaica, igual a d-e milhar~ de bur– gueses de seu tempo: do outro • lado. criações originlllS rtue ilustram o infclo de \lma epo– ca nova da arte da paisagem e mesmo d a pintura em geral. Millet disse de um quadro de Corot •que possu1a a léla o aspeeto de ter sido feita por al~em que ignoravJ!. a pin• tura e que a teria pintado como podia, com um t,rande desejo de fazer bem , E :iessa frase rC!iumia, sem dú– vida. o julgamento de 1.odos os ointores da época. Quando Corot estudava na Itália. seus companheiros de estudo ca– çoavam de sua maneira de pintar, rnanelra sem µrece– dente, afasta.da de toda tradi• ção. ri<i icula, por consl'Qltên– cia, aos olhos de seus çole– gas . .. E. de falo, o arti<1la co– rajosamente abandona\'R todas as normas da escola da pai– sagem histórica então em voga. Ao invés de fi'equen~r o Loune e os mus~us, C'orot percorr.ta as Oor~t !l.il e os prados, as clareiras e os ribei• ros. Estud.1va na Nature::a e sõbre a Natureza. Recusava– se a Imitar os '"'.l'erl"as do Sena" dos velhos quadros r.o5 amarelos d-e st>us ver ~ ws rançosos; p1eferia ini:pirar-se di.etamente no que via e sen– tir o cinzento azulado de u'a manhã de primavera ou as ne– voas docemente escur11s ãe uma alvorada de outono. Tratava.se, certarnente, de uma Inovação. Outros, os pai sagistas românticos com Theo• dore Rousseau à frente, l eva- riam mais ndtan, ►. .uJ'ld>l "Afia maneira de pintar. Mas Corot tinha oulrru: ori• ginalldades: rompe decidida– mente com o nábiro clá,sico, digamos de Rubens, de pre– ceder por melo de soml.lras transparentes e luzes erbali– das e mistura o branço a todas as suas côres. G1,1stave Geoffrey relata que o ointor Henri Danger, que muitas ve– tes, quando moço. assh,l1ra. Corot pinta-r, lhe contava que o mesn10 para ter.minar um quadro mlslw:ava todas as CÕ• rês de sua palheta. os azues. os brancos, os amarelos. os ocres. para obter um tom elnzentc, esverdeado com o qual dava harmonia ao seu q~dro. "Olha, rapaz, isto é segredo meu. . . "leria êle dito a Dan– ger - Não deves contar a ninguem... " Millet enganava-:se, no en– tanto. quando se re~usava a acreditar que a pintur,\ de Corot era uma pintura espon. tãnea. Corot tinha técniea e processos próprios, que não tirara de nenhum de seus pre– descessores .imedia.los, técnica e processos que não pertm– ciam a nenhuma estota. Não ei-a um artista sem "métooo•·. pelo contrário. tinha um mé-– todo "pessoal". Dessa ruptura com a com. posição e preceitos "oficiais". dessa impressão dlreta, dê.~:;e amor de minucias iam sair dl.scip ulos. Primeiro Slsley. depois os "in1pressionistas", depois toda a pintura moder– na, pelo menos alguns de seus earaéterísticos. Uma revolução na Arte. 1;:eaUr.ada por um poeta da pintura: eis o :iu.e !oi Col'ot. de dogmático, de didático, de apologético. E• mais um sen– Umento do que uma doutrina. Dal a sensação de vida de fôrça, de "poderio'' (se11tido cristão e não nietszcheano) 'q~ emaua tanto da sua poesia como da forma em que ela se ex– prime, num espírito de humildade e não de orgulho. Isto. talvez. porque o seu tema fundamenlal e essencial é a Morte.. Há oult·os que lhe são também muito constantes como a Noite. o Mar, o A,1nor, mas t<1,os convergem para a sensação da Mor– te. Eis. por exe.inplo, a sua visão do Mar; "Eu vi o mar 1 Tinha uma grande pa.recen_ca com a morte, Par~ia o leito em que a morte descansa E a sua impressão da noite; nas suas noites'". cos e linguísticos. Aparece. então, o C&nto da Noite , no '11.ual "Quero morrer de noite. o seu lirismo vinha encontrar. R.final, aquela temática e aquela, As janelas abertas, .forma que lhe eram ma.is propícias. As :;uas i,;nagens, as Os olhos a fitar a noite enorme"'. suas metáforas, os seus símbolo;; - encontravam uma substân– cia h1.unana e literária à altura das suas e.'Cigências. Antes do Canl,o da noite, o sr. Au,gusfo Frederico Scbmidt era um poeta representativo da sua época. embora já constituindo um dispensável doctuneutáJ·io de certo momento literárJo: depois do Canto da noite. um poeta que já dispõe de um grande es• paço den.lro da literatura brasileira. O "navio perdido'' en– controu. afinal. o seu port.o; o "pássaro cego"' conseguiu, afinal, uma visão do mu11áo. O poeta fez a volta ao mundo para chegar ao seu ponto de partida. Arnpllando-lhe a visão, aparece na sua obra uma tendên– cia profétiça. O Criador e II sua Criação empolgam o poeta com a mesma intensidade- Deus eslá no alto da sua poesia, 1nas nela se enconJram lugares para todos: para os hon1ens mais miseráveis e para as coisas mal~ insigni:flcantes. E' um êrro, porlanto. que se comete [r<1uentenlente. o de afirmar que o sr. Frederico Sclmúdt reagiu contra o quotidiano, contra o piloresco. conlra as coisas simples que o moder,iísmo su– perestimava como temas prediletos. O poeta não desprezou estes len1as; elevou-os e valorizou-os, naquela oroem de grandeza onde se acham todos os elementos que olhamos como emanados de Deus. Isto é tanto mais verdadeiro quando sa-' bemos qúe a vida. a realidade. a materialidade não são nunca, em si mesmas. poéticas ou anti-poéticas. o.,q,ue aparece como tal vem da nossa interpretação, do ideal com que as anima– mos. E' negl.e sentido que tõda arte é ide3lista. A visão de Cervantes transfigurando os moinhos re.presenta, de certo modo, a visão de todos os art.istns ante a realidade. As vezes, pórem, o 1 )1.le parece alucinação de poeta vem a ser depois uma ,ealir\ac;l.e objetiva. Veja-se, por exemplo, esta estrofe do poema "Profecia". em Pissª'ro Cego, publicado em l930: "Como o pássaro triste que anuncia a tempestade, Quero ta1nbém. Senhor, chorar o triste momento. O lie1·rivel momento que pressinto vir chegan<to t A lemp~-tade vem crescendo d e longe Caitâ violenta sõbre a.s nossas cabeças, Tivesse eu mil vozes e gritada em tódas ela&. Gritaria para avisar que o instante tremendo não demora. Tivesse eu mil braços e sacudiria com todos êle$, S~cudiria os homens Que estão dis1.raidos e ausentes. Os ho1nen11 que não escutam e não querem escutar, Os homens perdldos e desviados. amaldiçoados e loucos". Do criBtir1nlsm.o do sr. Augusto Frederico Schmidt pocle– rlaríamos dtzêr que Daniel RaJévy disse do de Peguy: é um cristianismo Joven1 e cal)az de desórdens Imensas Nada tem · Talvez porque seja muito grande o seu amor à vlda, êle procw:,a antecipadamente sentir o que está do lado oposto, et que ve como aventura final que seduz e faz mêdo ao mesm.:. tempo. No sr. A.ugusto Frederi.co Schmidt, o conhecime11t1> poéllco começa por 1J!ll3 sensa~âo; a sensação se transforma. em idéia. a Idéia em imagens, e,as imagens em símbolos. E es'l:e prooesso se revela não só na substância poéllca, mas tam– bém na forma en1 que se e."l:prlme. Revela-se nesles versO!f longos, melódicos, repetidos em vocábu106 como se se desdo• brassom em ondas. Será inevitável, então, a sua exuberânoia. verbal e a ànsla com que multipl ica as palavras para que trans1nitam· a sua riqueza de símbolos. Resu.inindo apenas neste rodapé, a propósito das l'oesw Escolhidas, opiniões já manilestadas em dois estudos sõbre Estrela Solitária E' J\hr Desconhecido, desejo deixar no leitot: a in1pres$ão direta do poeta. e não dos comentários críUcos Que êle provoca, transcrevendo assim do volun1e agora pu• blicado um admirável soneto, no qual o último verso se destaca com uma singular beleza: ''O desespero de perde-te um dio Ou de vir a deixar-te neste mundo, Habita o coração inquieto e triste Enquanto a noite rola e o sono tarda Olho-te, e o teu mistério me penetra; Sinto que estás vivendo o breve engano Dêste mundo. e que irás também, um dia. Para onde foram essas de que vieste. - Essas morenas e secretas musas. Tuas avós, ciganas de olhos negros Que te legaram tua graça triste. Lembro que esfolharás na eterna noite A rosa do teu corpo delicado, E OU()O a n_ç,ite chorar corno uma fonte". " ( t) Augusto Frederico Schmldt, Poeatu 01eolhfdu, Amerla-. l:ldJt, Rio de J'aneiro. 1946. ----- Para remessa de livros: Rua Duvivier, 18, Apt. 5C2• •
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