Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1946
• - ·•·••-1tli*lt*-**·lrlctt·...,....'+<, UM CASO DE PRE– Confissões DoSolitário Benedito Nunes 8 - Compreendereis S c h o- penhauer ouvindo Bee– thoven. A "Apasslonata" é o p oema da vontade humana construindo e modificando. O domínio estâ em Beetho– ven; a compreensão em Cho• pin. Este nos descobre a hu– manidade e por êle entramos no Amõr . --xx-- 9- A música dá. ao homem um pi:ofundo estado de apercebimento que nos apro– xima da natureza e nos faz .compreender a significação do Absoluto de Degel. Sob a ação da músicp de– saparece momentaneamente o , choque dos contrários e só preval~e a tôrça do Espíri– to. --xx-- 1 o- O Eterno de Krishna- m~ti talvez correspon– da à noção de divindade do • elho Sócrates: A libertação moral, a a.firmação do homem, livre de todas as limitações. xx-- f 1 -Três cap{tulos da Suma Teológica do m o n g e Tomaz deixaram-me numa abadia distante sem poesia e aem amôr. NOTA BIOGRAFICA : COCIDADE RIO, via aérea cA. U.) - O poeta Olegário Mariano reve– lou aos seus colegas da Aca– demia mais um caso de pre– cocidade prodigiosa: uma me– nina de 16 anos que faz ver– sos como gente grande. Cha· ma-se Margarida Filkel, é descendente de russos e tem um livro de poesias realmen– te surpreendedor: ''Meu ama– nhecer''. Olegário Mariano es– Cl·eveu um. elogioso prefácio para o livro da nova poetisa. BEST-SELLERS RIO, via aérea - A sra. Leandro Dupré, fa– zendo grande concorrência a l!':rico Ver~simo, acabará sen– do a romancista !I!BÍS lida do Brasil. Os Uvros da escritora paulista se multiplicam dia a dia em novas e maiores edi– ções. É interessante saber que o romance de estréia da sra. Dui>ré, lançado por uma edi· tora de São Paulo, teve 'as despesas pagas pela própria autora. O sucesso animou o editor a fazer a segunda edi– câo já por sua conta e a com– prar os direitos autorais' de outro romance. A essa altu– ra, tornando-se a u t ê n t i c o "best-sellers", a sra. Leandro Dupré achou melhor ela mes– ma fundar uma editora, ~ão querendo saber dessa histó– ria de dividir os lucros com ninguém. Resultado: a edito– ra da romancista vai de ven– to em pôpa e - diga-se de passagem - as suas máqui– nas trabalham quase que ex– clusivamente imprimindo os romances da escritora-pro– prietária. Os Que Colaboram Na FOLHA F . Paulo Mendes nasceu em Belém a 10 de janeiro de 1910 . Fez os seus estudos nes– ta cidade, sendo ba– char el em D i r e i :t o. ·• .. ' ; Desde 1944 é cate- ;,, i drático de Literatura da Escola Normal do Estado. E' professor, também. do Colégio N o s s a Senhora de Nazaré e do Colégio Estadual "P a i s de Carvalho". 1 ' Tem e o l a b õ ra d o nas revistas "Terra F. Paulo Mendes Imatura" e "Novida- ' 1 des" e nos jornais FOLHA DO NORTE e "O Estado do Pará". 1 , Publicou em 1944 o ensaio "Raízes do Romantismo", :tendo em elaboração vários 1 1 trabalhos. (COPl:'.RfflTD 00 SERVIÇO FRANCES DE INFORl\lAÇAO) Em sua agenda de 1864, Stéphane Mallarmé linba conser- vado esta primeira versão de uma estrofe de "Pitre Châtié" : • Pour tes yeux, pour nager dans ces lacs, dont les quais Sont plantés de beaux cils qu"un matin bleu pénelre, J'al, Muse - mo!, lon pitre - enjambé la femêtre Et fui not.re ba.rqus ou fument tes quinquets. Sabemos, entretanto, como ficou o poema na edição defi• Dillva da:, "Poesias Completas". :li: o célebre e conciso: Y~ux. lacs, avec ma simple ivresse de renailre ... etc.. Por acõrdo unâniml! de interpretação, o texto inicial tinha f orçado o sucesso popular. Para maior satisfação do autqr, e segundo decepcionou a maioria de seus admiradores. Não encontramos em Mallarmé um só vemo que não mar-' que assim brutalmente a dramãtlca dualidade de fra<?assado. Não queremos dizer, certamente, que Mallarmé seja um fracassado. Mas como todo valor humano, o fracasso tem duas medidas : a relativa e a absoluta. Aquela depende ape– nas de êxito comer~ial da obra; esta só tem valor no ideal do escritor. É, pois, fracassado quem não exprimlr ''tudo" da mensagem de que se sentia portador. Assim Mallarme póde ter conquistado, com seus ensaios, o ouvido das massas; não hesitará em. negar, mais tarde, as "concessões" que julgou incompaüveis com a pureza de sua arte. Compreensível, amavam-no. Quando lhe creooem as asas, não sabe mais acompanhar seus contemporâneos. É o oposto dos aventureiros das letra:;, como Verlaine ou Rimbaul. o mais bw·guês dos escritores de seu tempo. De indomável imagi– nação, fica. enlTetanlo, p-risioneiro de seus chinelos, ourives doméstico do pensamento vagabundo. Filho de funoloná.rio, ainda c:1·.iitnca encontrou Béranger. Mas su.i vocação hesita muito tempo entre o atraLivo do esctitórlo e o da pompa %eliítiosa. 7 • ao- •- a- o- •- e- a- •- D• t• a- •- •- •-~a- •• o• a- 01•• APONTAMENTOS LITERARIOS HAROLDO MARANHÃO 1 - 1 - 9 a H _ n _ ll _ l),e Mário de Andrade escreveu poucos dias antes de mor- rer esta advertência: · "Guardar as cartas consigo Nunca mostrar a ninguém. Não as publicar t~bém; De indi!erente ou de amigo, guardar ou rasgar. Ao sól carta é farol". Vinganta de quem sabia exploradas pelo cabotinismo as suas cartas. Ensaio de um padre contra Eça de Queiroz. Mas a um padre seria permitido escrever a fayor 7 Como deve ser melancólica a velhice de um escritor que sente falhadas t6das as suas tentativas. Não sei por que, em dadas ocasiões, eu slnto uma es– tranha inclinação para associar êstes dois nomes : Rllk.e e Debussy. Perfídia de Edgar Cavalheiro: dizer, em "Obras pri– mas da lirlca brasllelta", que a popularidade da poetisa Ana Amélia não vem dos seus versos e sim da sua notável atuação junto às classes universitá.rias do Brasil... 3 Se se institUÚJse um tribunal de penas llterá.rlas - quanta gente teria de ser proibida de escrever 1 De Monteiro Lobato: Virgilio está para Homero como o jornalista estã para o escritor. ,, Não que me ponha com bisantinices. Mas uma escri– tora do prestigio da sra. Lúcia Miguel Pereira não devia mais recorrer ao arquivo das frases catalogadas (insacfável sêde de saber, por exemplo). Ainda mais quando Dlllll livro de responsabilidade, como é o seu ensaio sõbre Ma- chado de Assis. 1 A campanha de ataques que se está t azendo contra Ãlvaro Lins é uma reação natural, comum em literatura, dos que se sentem espoUados e feridos pelos sucessos alh1l.ios. Inúteis, porém, tôdas as tentativas. Alvaro Lins tem o seu espaço assegurado na história das idéias, con– temporâneas. Mas quanta gente já é escritor I • Sente-se um cansaço de fórmulas e de idéias, ao mes– mo tempo que se percebe uma atmosfera ansiosa de rena- i vação, renovação em lodos os sentidos, principalmente no sentido da poesia. - • - Q- 0 _., ■ d tt _ ,__ ó _ 'G _ , _ 0 - 0 _ , _ c _ o_o_ O_ ll _ 0 - D~ Prelúdio Em Dó Menor Com as mãos cravadas num teclado de túmulos, Um demônio de cabelos agitados Riscou na paisagem da eternidade Um prelúdio em dó menor. E os Lázaros levantaram-se com IIJI carnes ainda em e pedaços Para presenciarem o desastre da noite derradeira. Só um coração de poéta permaneceu parado. o seu corpo havia desaparecido No mistério das ei;trêlas. J OAO MENOEB • No Tempo Do Simbolismo • JEAN BALENSI (Copyright do Serviço Francês de Wormação) - Serei poéla ou... bispo, disse êle aos 17 anos. Tendo perdido a mãe, o novo casamento de seu pai e a incerteza dos internatos - em Auteuil, no Liceu de Sans - decidiram-lhe a orientação. O snobismo de Auteuil procura diminuir o aluno plebeu. Mallarmé lembra-se então de que seu pai possui uma casa : -Sou o marquês de Boula!nvilllers. Conquista assim a paz. Escreve seus primeJros versos. As estrofes de inspiração lamartiniana sucedem os . .. cânticos. Encontra finalmente seu meio : na r ua de Donai, em caB8 de Catullo Mendes. Uma moça de vestido vermelho reina na– quêle pequeno andar térreo onde -reunem François Coppée, Léon Dierx, Hérédia, Verlaine. Em vão colocam, nas revis– tas, seus primeiros artigos : Mallarmé está ainda muito pobre para aquela boêmia loura. Para melhor compreender Edga.rd Poe. aprendeu inglês, VaJ ensinar trencês em Londres. Ao regressar, tornou-se pro– fessor de inglês num liceu francês. Começa então a vide in– certa na p-rovinc:ia. Casa-se, tem uma filha, corrige cópias, Mas sôbre sua mesa, são ainda testemunhas de seu sonho uma gaiola de bengalis e uma correspondência acadêmica c.om os felibres de Avignon. Sua carreira rá-lo enfim voltar à Ca– pital. Seu circulo de amiza<les llterá.rias estreita-se cada vez mais. Leconte de Lisle, Anatole F1·ance, Victor '.FJ:ugo, Theo– dore de Ranvllle, consideram-no mestre. Mantêm intactas suas primeiras veleidades d~ int:renslgente liberdalle. Redige sozinho, da primeira a última Unha, a "Dem1ere Mode". jol'ílal • • NOTAS LITERÁRIAS • ABDIAS LIMA "POEMAS QUE NINGOtl\1 QUIS", DE MATOS PEREIRA O livro de poesla "Poemas que ninguém quis", ainda inédito. de Matos Pereira, nasceu nas horas de recolhimento e silêncio. Depois de lêr ê&<es versos demoradamente. perpassei-os na memória, à beira do oceãno, procurando a alma do livro. Crêio ter encontrado. A nota caracter[stica da poesia de Ma– tos Pereira é a lirica e a paisagística. Como parnaslano só encontro stmile no Cear~ em 1 'Suges• tão de Beethoven", de Cruz Filho, na qual o grande aêdo ae alçou aos maiores poétas da ll:ngua nacional Matos Pereira recitou-me seus versos durante toda uma tarde e me senil deslumbrado como o Agrlpino Grleco ou– vindo Catulo. Andava eu desiludido. Os artistas não passam apenas por crises de completa esterilidade intelectual, mas também por momentos de agonra moral. Aparece no nosso caminho um poeta e substltue a Natureza: brotam rosas. p:lpilam pássaros, rebentam ninhos. 'é assim o poéta Matos Perelro Seus pe• diiços de mármore produzem tal mi)Qgre. Em "Cantigas do jangadeiro" tem notas que Juvenal Ga• leno inveja.ria : "Maria, êsses olhos verdes, Que eu vejo sempre a cismar, À noite falam de amôres... De dia, falam do mar 1" O cemitério para o poota é um templo amigo. Ali, trava estranhos diálogos com a Morte. "M ORR E R ... Morrer. . . não pensar mais, não sofrer mais, não mals sentir, ouvir e vêr as misérias do mundo; deixar, para quem fica, os problemas fatais e rei.ornar ao pó e ao süê.ncio pro!undo ... Servir de adubo à terra, e aos pobres vegetais dar mais vida através do verme hediondo e imundo; regressando (quem sabe?) em lírios virginais que uma noiva trará contra o seio fecundo .. . Els o que peço ao Deus Supremo do Unl~erso; e o Espírito Perfeito - o Gênio Criador - não há de ser, espero, ao meu pedido averso. A decomposição, assim, não anus.a horror, e eu cantarei, feliz, o meu último verso e nunca. nunca mais, saberei o que é dôr 1" Nessa poesia, Matos Pereira se revela extraordiná.rio. Os homens fiquem com ''seus problemas fatais", suas dõres, seus absurdos, sua impossibilidade de realizar a felicidade. 'tle vai "servir de adubo à terra", e dar mais vida aos pobres ve. getals, "através do verme hediondo e imundo". Mas o poéta cantará, f eliz, se regressar em Urios virginais. Poéta na vida e na morte, Matos Pereira deixa o mundo sem tristeza se ressurgir em fórma de flôr "que uma noiva trará contra o seio fecundo". Humilde "Na casinha em que te vi", puro em ''Eva" e. sobretudo, llrlco. Em "O poema que ninguém quis" : "Quanta est.rêla por ,u:ás da noite escura.. , Quanta müs1ca e filr ao amanhecer 1" Mas o poéta p=a, com tôdas as melodias oe sua alme, incompreendiço, infeliz. Ninguém o vê, ''ninguén1 veio me alegrar a vida... O livro inclúe sonet0$, poemas, quadrinhas. Bõas qun• drl nbas, algumas quase perfeitas : "SAlJDADE • Saudade é o ninhe vazio que o passarinho deixou ..• É fumaça que persiste Depois que o fõgo apagou". "OIPRES'?ES Habitam neles, as almas Dos que toram pe.rstguidos, O vento, quando os açoita, Arranca-lhes m.ll gemidos". Muitos versos de fundo religioso. Muita Jronla espalhnda por essas pâginas. E também muita belt'za. Concluo minha apreciação dos "Poemas que ninguém quis", com essa certeza: não penetrei no livro. não soube ~ransmitir sua pureza: sonhos de noivos, rumor de florestas. aguas cantantes. Voltarei, quando êsses poemas !orem banhados de sóJ. NOTA - Remessa de livros : Caixa Postal - 293 - Fortaleza. ' . ~undano. A_ssina Marasquin em lugar do dJrelor; Ma rgue,, nte de Pontis é a autora das frivolidades, Mis Satin, taz a cr~nlca de Paris. l!l êle que, anonimamente,. se ocupa do "Carnet d'or" e das rtibrica.s; tea,h·o, estações, viagens, pequena correspondência. Mas o jornal definha e desaparece. Mallarmé vive então em seu universo triangular: o liceu, a casa, os versos. Nasce-lhe, então, um fJlho, que passa apenas pela vida. O poéta só tem tempo de reconhecer nele suas próprias orelhas pontudas. No se,1 lelto de enfermo, a criança, bôa e croel ao mesmo tempo como seu pai. apanha as moscas durante o dia. para pregá-las na parede com um alfinete junto a uma taboleta onde se lê ~ "Condenadas à morte". Consternado com a morte do tilho. M'allarmé aceita o consôlo da única ventura amorosa de sua "x1stt>ncla. Encontrou Mecy Laurent, no atelier de Manet. O dentista que a protege, instalou, para elo, na rua de Rome, uma sobreloja de molduras e plantas verdes. em estilo rococ6. Em cada um dos inúmeros enfeites do apartamento, Mallar.mé coloca um distico Qtle define seu p11pel incerto. Tendo pago êsk tributo à fantasia, a ligação torna-se co~ mum, e a rotina de .funcionário poéta recon1eça. Cada noite lhe traz a bora de glória quotidiana. Com uma blusa de !Ja– nela azul e um chale de lã quadriculado, de costas para a lareh:a. recebe em sua sala de jantar. salão-escritório, amigos. discipulos, confrades. Embora se sinta como o membro mais sólido do simbolismo, nada tem de chefe. Só fala do slmbolo com a d!so.rição do iniciado superior. Se dirige a conversa é quase conffdenclaimente. Preparou-a de antemão, como seus cursos de professor. Sábias manobras descobrem o parado,xo pacientemente preparado. Parece cada vez propôr a chave mâgica de sua poesi'l. Tudo parece então luminoso e simples. Ninguém estará de acôrdo com seu vizinho. no dia seguinte. !!. respeito do que ouviu, lado a lado. Mnllarmé, com a mesma medida, determinou sua saída do mundo. Fica de cama três dias apena,s, na tranquilidade esti– val de sua casa de campo. Depois desaparece incógnito, diante da mals benigna das doenças, :1!:ste ator timido tenninava seu sucesso. Deixou a cêna antes da apot.E-Ose.
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