Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1946

A O W t"91,, _ _ _ Cl _ fl _ O •n- fl I n - 0 - •-11 - ~ • OTEATRO De · Jean Anouilh Por ROGl::R BASTIDE (Copyright do Serviço Fran– cês de lllformação) SàQado, 7 de setembro de 1946 Dlretor: PAULO MARANHÃO • • ~~~--fl-D - o-.n 1:1 _ 0 _ 0__ 0.. NUM. 11 Leon Bium EO Matrimônio CÉCIL MEIRA Jean Anouilh é, sem íavor, um dos maiores nomes do teátro francês contemporaueo. No âno passado o públ tco sul– americano teve a oportunida- Antologia De Definições De Poesia Somcmte agora uma editorã brasileira lembrou-se de man• dar traduzir o livro de- Leon .Blum sôbre o matrimônio. Li– vro q11e há anos fez grand~ sucesso em França, que foi muito discutido, multo e.xami• nado, tendo a seu favor votos favoráveis e contra. É ineká– vel que o livro nos impressio– na, impressiona mesmo de– mais, e ninguém termina sua leitura sem ficar numl\,,espécle de estado de choque, quer re– jeite, quer aprove as conclu– sões do autor. Mas não é para admirar que o leitor se sinta em tal situação. quando seu próprio obreiro vacila em suas últimas páginas. Fica indeciso, r sem a coragem da afirmação absoluta. Poderâ parecer, a principio, que Leon Blum agi-u com equillbr:lo, não chegando de de aplaudir a sua tragédia "ANTIGONE". Atualmente a MANUEL BANDEIRA Companhia de Ledoux, em • tow·née" na América Latina, exibe duas de suas péças Poesia, arte mais antigas, o "RENDEZ- de fazer versos. Dicionário de Larousse *** O poéta é aquêle que nomeia. sical, à imaginação, de nobres fun– damentos às nobres emo9Ões. *** Platão . *** Rusl d n *** VOUS DE SENLIS" e "LÉO– CADIA". O momento é, por- Poesia, tanto, oportuno par8 esrudar arle de fazer obras em verso. Dicionário de Littré O poéta, sem. outro talento que o de A poesia é a arte de excitar a alma. *** Novalis *** à obra de Anouilh, .,aa origi– nalidade e significação A primeira vista. o tema essencial das suas J?6.;as é o conironto do homem com o Poesia, arte, obra do poéta; e..xpressão elevada de pensamento ou senU– menlo elevado em métrica. imitar, mediante certa colocação de palavras .e .expressões .figuradas, sabe tão bem dar a cada parte as Aquêle que quiser conhecer bem sua seu pa!ll;ado. Em "Y'AVAT'I'– UM PRI SONNIER". um fi– nanceiro falido, Ludovico, sái da prisão onde passara .16 anos, e encontra-se com a fa– milie. a bordo dum "yacht". Ao aperceber-se que seus pa– r entes e amigos não p:issi,m Dicionár io de Oxford *** Poesia, descrição ou pintura da Natu- "' côres que lhes pertencem, que, ou t ale do oficio de sapateiro, ou trate de guerra e outros assuntos quais– quer, seu discurso. ajudado pela medida, pelo número e pela harmo– nia, persuade aos que o ouve.m e não julgam senão pelos versos, de que se acha perfeitamente nas coi– sas de que trata. Tão grande e po– deroso é, por natureza, o prestigio da poesia 1 · Porque penso que sa– bes o que são os versos dos poétas quando se lhes tira o colorido q ue lhes empresta a mú!tica. alma deve procurá-la em compa– nhia do poéta : ali é que ela está aberta e se expande o seu coração maravilhoso. NovaUs *** reza, em estilo harmônico e métri– co, diverso do prosáico. Dicionário de Mora-Is A poesia é o real absoluto, e_fs o núcleo a afirmar sem alternativa. Os princlpios assim pecariam pot excesso de paixão. Contud(\ não se trata de a1innativas absolutas par parte do grande socialista francês. E se êle as– sim desdobrasse seu pensar s6 *** Nem todos os que escrevem em carnes, par mais doutos que pareçam, são poétas. da minha :filosofia. Quanto mais uma coisa é poética, tanto mais é tal'l)bém reat Novalls Ronsard *** de tratantes vulgares, 1i~uras grotescas e abjectit,;, ati1·a-se à , água, fugindo a nado. "LE VOYAGEUR SANS BAGA– GES" é a história de um an1- nésico finalmente r econhecido pele. verd;ideira familia. As provas são inegáveis; o doen– te, Gastão, não póde duvidar; mas recusa-se a reentrar nu,-n *** Fazer um poema é engendrar. Todo poderia ser elogiado. Nada disso. 1!:le vacila e.'l:atamente Nem todo homem que escreve em verso poema deve ser um individuo vivo. no ponto de vista que deten- é poéta. Jonson *** Platão Novalis *** *** Poesia é a ficção retórica posta em A critica da poesia é um absurdo; dizer de, na tése que êle cansativa– mente desenvolve no decorrer de toda obra, para afinal de– cair, recuar, ficar numa atitu- O verso é para a poesia apenas um or– namento e não causa. Sidney Smith *** p assado que lhe causa horror, preferindo constituir uma fa- Poéta é, não aquêle que escreve com - milia à margem da lei. ''LÉOCADIA", a terr.eira péça, explora o mesmo t1ma mas de maneira mais ás;:,era, m ais ligeire. e mais fanlás•í ,~. .Um jovem principe, que f'P.~ deu a mulher amada procura A reconstitlZix o cenário cio seu drama e não vive senão parA métrica, mas o que finge e fórma uma fábula, pois fábula e ficcão i:.'io, por assim dizer, a fórma e a alma de tõda obra poética ou "poema". música. Dante *** A poesia sical. chamaremos pensamento mu- Carlyle *** Em suma, eu definiria a poesia de pa- se uma coisa é poética ou não, já é dificiL O poéta é verdadeiramente um insensato e por isso é que tudo acontece realmente nêle. O poéta representa, no sentldo próprio da palavra, o sujeito-objeto: a alma e o mundo. Dai o infinito de um bom poema, a sua eternidade. de de quem falou demais e arrependeu-se de ter dito tan- to. No 1im de seu volume êle procura em vão convencer-se da veracidade de suas propo– sições.. . Teria eu coragem - pergunta - de admitir em minha própria filha tal ma– nelfa de ser, fal modo de agir? NovaJls .Jonson *'** *** lavras como a criação rítmica da beleza. Edg-ar Poe A poesia é estritamente a linguagem da E a dúvida surge bruta, inde– finida, sem solução. Entrega a melancolia da recordação; a vida, porém, torna-se mais poesia é uma silnili-Criação, e laz coisas que não existem, como se elas exlstissein. A ficção é Donne *** a essência da poesia. *** Prosa: as palavras em sua melhor or- dem. Poesia: as rtrelhores palavras em sua melhor ordem. *"'* Col erldge Imaginação; e a imaginação é aque– la faculdade que representa os ob– jetos não como são em sf mesmos, mas como se moldam, por oull·os pensamentos e sentimentos, numa infinita \'ariedade de fórmas e com• e.o tempo o resullado Iinal, quando é sabido que ou o princfpio defendido é justo e réto, para ser adotado ou en- tão somente a exp~riêucia, ~ ContlnlU 11a a.• pàgina Dryden· Poesia é a apresentação, em !ó1'lDa mu- binações de poder. Bazlitt CCLX - Não vamos acreditar que a primE\ira virtude sentir ~ediocre,. contingent, mortel. D'ou avalt pu me venir diante de uma derrota seja a humildade da conformação. Esta cette pu1ssante Jole? Je sentais qu'elle était lieu au gout du é a segunda. Antes, o que há a fazer é uma operação de th~ et du gãteau, mais quelle le dépassrut infínimeut, ne de– defesa, às vezes heróica, para que a sensação da derrota não ~~t pas êtJ::e de m~me nature. D'ou venaitelle? Que signi– se instale na nossa v:da interior, envenenando, sem que o sin- firut-elle? , ~u l'ap~rêhender ?" Proust escreve então uma tamos, os movimentos dos nossos atos e os impulsos da sensi- da_s s~as paginas mais agudas de anâlise e lnterpr etacão para bilidade. E isto será o mesmo que impedir o episódio da atingir_ a realidade causal daquela sensação. 1l uma longa derrota de se transformar num estado de decepção. A der- excursa.? no mundo subterrâneo da serrsibilidade. E encontra rota, quase sempre, independe de nós mesmos e acontece como a ~luçao repentinamente numa lembrança. Aquêle gôsto es– consequência da determinação dos outros no objetivo de nos peCJ~ era o do pedaço de "madelrune" que lhe oferecia a tia fechar os caminhos. Será dar-lhes uma nova vitd'ria ter a Lêorue, quando, ainda criança em Combray, ia cumprimentá– fraque1.a de permltir que a derrota seja incorporada à nossa la no seu quarto aos domingos de manhã. Essa lembrança vida ú1Uma. O essencial, como exerclcio de consêiência, é traz-lhe a imagem de Combray, e através de Combray. pela conseguir que nenhum dos nossos atos de amanhã vá marcado in1aginação e pela memória, começa a se construlr lentamente elas sombras de Ulna derrota de ontem, decepção, amargura -o universo prousllano de A la recherche d te d 0 sentimento. _____ u mps per u. r~~...o-JXr..,...,.~~.,~.,..0,1 CCLXI - A geografia e a cronologia sempre foram gues- · 1 · JORNAL DE CRÍTICA tões como que lnsol-íveis na arte do romance. Não houve ou- qo recurso senão adormecê-las com um artificio, no bom § sentido da palavra, com um artilicio lcg[tlmo. Uma arte do ou espaço total, quando na verdade o seu quadro de ação estli n· ■ D e 't· dentro de um limitado _terreno ge~gráflco; no_ mesmo sentido, 1ar10 e r 1 lCa o seu papel é transmitir a sensaçao de eternidade do tempo, ou da sua supressão, quando só póde jogar com uma bre_ve parcela dêsse mesmo tempo. CCLXII - Notas :M-ra um estudo sõbre Manuel Bandeira, com a tentativa de e:;,:plicar l<lda a sua obra poética através de um só dos seus versos. O ensaio tomaria, então, a fórn1a de várias llnbas de interprete.ção convergentes )'.)ara esse trecho– chave que seria um verso isolado e explicativo. Parece-me fâcil a escõlba do verso, que é êste: "A vida inteira que po– dia ter sido e que não Ioi". Tôda grande obra de criação, poesia, romance ou critica, contém êstes ve_rsos ou trechos singularmente marcados que são como chr.ves para explicar t odo o sentido de uma personalidade ou de uma obra. E quem sugeriu com ma.is evidência, para ser aplicado em outros ca– sos, êsse processo crítico de pesquisa, foi Marcel Proust. Em A la r echerch e du k:mps perdu há dois t.rechos que são tipi– camente chaves para a compreensão do espirita gernl do ro– inance. Um está em Du cotê de ehe'll Swann, quando num dia de lnverno, êle começou a comer, por Insistência de sua mãe, um daquêles bôlos "Petites Madeleines". De repente lhe vem esta sensação : "Un plaisir délicieux m'avait envabi, isolé, sans la noction de sa cause. D m'avait aussitõt rendu l es vicissitudes de la vle lndifférentes, ses désastres lnot.fen– i;ifs, sa brieveté illusoire, de la même !açon qu'opere J'amour, en me remplissant d'une essence pré<'ieuse: ou plutôt rette essence n'étalt pas en mo!, elle était moi. .T'avais cessé de me ALVARO LINS K tli'spcc:ial para a FOLHA DO NO RTE no Esta.do do Pari) Q ~""°°""~.0--..M X,0-0--~~.#'"4 outro está em Sodome et Gomorrh e, quando êle volta a Bal– bec, onde estivera ainda adolescente em companhia de sua avó, morta um ãno antes dessa sua segunda vlsita. Tudo pa– recia normal e banal, quando de repente êle assinàla: "Bo~– leversement de toute ma pe.rsonne". Abaixa-se, muito fati– gado, para se descaltar, e ao tocar no primeiro botão da botina, eis o que lhe ocorre repentine.mente: "Ma poitrine s'enfia, remplie d'une prêsence inconnue, divlne, des sanglols me secouérent, des larmes ruisselérent des mes yeux". Era a "presença" de sua avó, que o ajudara nas mesmas cii:cunstãn– cias alguns anos antes na primeira estada em Balbec. Só agora, atravé;:i dessa se_nsação, vinha-lhe a dôr que deveria ter sentido quando Eila morrera. Só naquêle momento percebia "realmente" que sua avó estava morta porque a realidade somente existe depois de recriada pelo pensamento e porque o calendário dos factos nem sem_,Pre coincide com o calendário dos sentimentos. E explicando êsse complexo mecsnismo da vida interior, Proui,t escreve, então, uma frase que póde ser isolada para a compreensão do espírito do seu romance : "Car ux lroubles de la mémolre sont liées les inlermitlences du creur". Uma verdadeira lei psicológica. S ConcJOe n.a 2.• pàg. ~ Conllnúa n a a.• p6.gjna ~agi.no que é vossfvel a interpretação da obra de M~I Bande1r~ atr~.:és do ,erso "A vida Inteira que podia ter sido e que nao !01 . Al está a história do poéla, de uma existência su:ocada, de um deJtino cortado. A vida "que não fol" expr1- m.1u-se tôda pela poesia, e nessa ci1·cunslãncia enco;ntramos um dos elementos fundamentais da sua pureza humana e de sua ~andeza poética. Sob êste aspecto é uma obra singular na ~tstória de nossa poesia, comparável somente à obrn de flcçao em prosa de ME.eh.ado de Assis. Todos os outros poétl\S viveram e vivem . Ilaturalmente, ou então morreram cedo. l\Ianuel ~andeira é o único caso de um poéta brasileiro que se transfigurou durante tõda uma existência, que exprimiu completa e exclusivamen1e pela arte literária uma vida "riue podia ler sido e que não foi". • CCLXIll - Já se dlsse da arte do romance que é um espêlho, uma lmage1n da vida. No moderno romance p~l~o– lóglco o espêlho est.-\ partido e a e.rle do romancista consiste em dar unidade aos fragmentos. CCLXIV - Disl!e M. F., mini!!tro da ditadura num dos seus tolos discursos rt1diofõnicos: "Pensar é fácà e aglT é di!icil". O ouvinte logo se lembrou da frase de Goethe: "Agir é fácil, mas pensar como é diiicil I" E o que fazer entre Goethe e o min-l$-lro? CC!u'{V - Sõbre As farpas : - Para Eça de Queiroz, Pias foram um episódio da mocidade, a primeira e,cpres-;;ão das suas idéias e da sua maneira : a sua perSO])Cllidade e o seu estilo já se encontram nas Farpas, mas na fi,.se adolescente· a sua glória é a do romancista, e estas páginas da mocidade 'u– garam-se-lhe ao nome como acessórios, pois, mesmo no jorna– lismo, só depois ating~rá aquela altura e aquela segurança dos ensaios de Notas con temporâneas. Para Ramalho, elas foram a realização de um destino, a obra de tôda uma vida; tudo o que êle tinha em idéias, em cultura, em originalidade, em ca– râter moral, ofereceu às F.arpas: fez delas a sua 1nanelra de Influir sôbre a vida social portuguesa; escreveu outros livros consideráveis, mas a sua legenda de glória ainda hoje é a de autor das Farpas. Ramalho já está desde o principio no do– mlnlo de sua fórma; ela é a de wn adtor que escreve alta– mei1te bem, que conhece todos os rec.1,1rsos de expressão da língua portuguesa. I!!ça ainda eslá em lu1a com a fórma mas já se sente nela aquêle dom superior de eserever bem. muito raro em qualquer literatura : o do criador pesso:il de um esfilo. De resto, cada um linna o estilo mais ndequaào ao seu gêne110 de trabalho. O de Eça : estilo pa1·a a ficção, para a obra de arte em si mesma: o de Ramalho: estilo para • crítica. para o estudo social. IJQilp- Conch)e oa a.• 9à&ma

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