Folha do Norte: Suplemento, Arte, Literatura - 1946

•~##,#,#. ' r::~:------1 i - - 1 Bfa,CH -· Murilo Mendes Domingo, 16 de junho de 1946 --- _, __ ,_....,, JIM-A GEM '!Das Horas l Duetor: PAULO MARANHÃO NUM. $ Há vànos anos u,n c:onJ1ecido J>$Ofessor e musicólogo norte– amei·icano d e passagem pelo Rio, surpreendeu -me con1 a declara– ção de que a música de Bach só póde ser con1preendida pelos p ro testant es. Só mais t 11rde p ude decifr ar o enigma contido para m i,n ein semelhante afirmativa. É que a obra de Bach tem sido alvo dos inais diversos conceitos de interpretação. Conforme a sensil>ilidade dos povos, ou a de· cet·tos grupos· que representam detenninadas tendências, ou ain– da a de certos indi víd uos que se colocam a pri9ri n um único â ngulo de visão (ou melhor, de audição) a t>bra d e Bach m uda de aspecto e de significado. Al– gun s criticos, conservando-se nwn plano puramente histórico, chegam a restringir a importân– cia de Bach no panorama J!e,·al do rlesenvolvimento da 1n·:.sica; por ,exemplo, o nosso caro JVlário d<' Andrade pôde escrever q ue "Bach viria saudosista e auacro– n ica n,ente apontar p ara t rás o passado". Ora, se f icarm os fir– mes dent ro dêste critér io de ex– clusivo aperfeiçoa1nent o téctú co ter cn1os que restringir ainda muito mais a importância de Beetl;loven, Chopin.. Schumann ,:, tant os outros. que já. encontra– ram o terreoo mais do que pre– par<1do . ap_esar das "inovações" qu<' fizeram . .. Escrevo es,ta crônica precisa– mente no dia em que Manuel Bandeira completa sessent a anos de idade. E o registro dessa -<lata pertence mais às secções da vida literària do que às d a vida soda!. Pelo que sei, o poéta Manuel Bandeira não tem uina conside– rável biografià, nem pr:>duziu retumbantes acontecirMntos nos do1ninios da sociedad,;:, e1nbor-a seja um ser sociável. com o ins– tinto, a genel'osidade e a nol:>re– za do sen timento da ami2acle; pelo que posso avaliar, a sua his– t6ria é de ordem l iterár ia, uma existência explicada e realizaqa na arte da poesia, uma vida bruscamente sacrificada no pia• no pessoal que se transfigurou idealísticamente no plano da li– teratura. I,nagino que a -vida de !'<Ianuel Bandeira, que hoje já se pôde indicar co,no u ,n modêlo para as riovas gerações, não te– nha sido feliz no sentido comum, mas a verdade é que, no estra– nho uni verso dos artista s. quase nunca se encontram juntas a fe– licidade individua l e a grandeza esté t ica . Pois é a desgraça que torna 1nais densa aquela agonia que serve de fermen to para as cr iações superiores na arte. Nas obtas dos homens tranqu ilos. e maciamente feUzes. há uma to– nalidade de · satisfação, de pre– guiça. de tepidez, que as torna irreparavelmertte- medíocres. O destino não ma.rca c9m requin– tes de crueldade senão os seus eleitos. Isola -os ron1 a lgun1 so– friment o esscnci,il ou alguma desgraça ir re,n ediável para que. na solidão das horas, possain- se desenvol ver ao máx1mo a paixão. a excitação. a tensão, o clima moral dos desesperos sufocados e vencidos pelas potências da vontade, den tro do qua l se pra- . ticam atos decisivor ou !'\C ela– boram obras de exceção. Fe– cha m-se todos os caminhos - e d o bom êxito profissi-0nal . e do equillbrio doméstico, o dos a,n o– res. o da fortuna, o dos prazeres efêmer os. o dos sucessos aciden– t ais - e s6 f ica o insubsUtu ivel cam in ho : o ela porta estreita. E a v ida t em que ser p erd ida num sentido para ser ganha no · outro. Em Ma nuel Bandeira há essa legenda de grandeza de wn ser humano que perdeu .a vida no sentido pessoal "para gan há, la no sentido artístico. O pro-' ble1;na que o destino colocou diante dê,le não foi o ·da · felici– dade, 1ru,s o da gl ória. JORNAL DE CRfTICA Uma Poesia E Um \ decepção dessa pequena aventu– ra: "O n1'eu carnaval sen, nenhtnna [ale~ria" Em "Rihno dissoluto", aparece um certo sentimento de ligação con1 a vida - ·•o que eu adoro em ti é a vida" - ao lado de uma mais. audaciosa experimen– tação de ritmos e processos p oé– ticos. A renovação qu e se esbo– çara com o poema "Os Sapos", ainda de "Carnaval'', vai-se apresentar, na plenitud e de seus lmpetos, em "Liber tinagem". A o lado de "Os Sa~os" será preciso, porén1, não esquecer o poema "Debussy". cuja música Wladi– mir Weyd{é define como uum mo.sàico sonor<r. um mundo .iu – d itivo fragmentado e descontí– nuo". Manuel Bandeira a êsse tempo, está nas vésper as da re– volução literária do modernis• mo. Em ·'Poética", no "Libertina– gem' ' , encontra-se a sua profissão de íé modernista. É um rompi– mento co1n o passado, um pro– grama de anarqu ia e turbulência no plano literário - uma espécie de maoifesto poét ico que sob certos aspectos nunca ser ia de todo executado pelo seu autor, uma vez que a sua personalida• d e tinh a fôrças lnti1nas. par-a do– minar e vencer aquilo que E'.ra somente o transitórío de uma época, aproveitando dela apenas os ';'.alor es permanent ~ de reno– vaçao e progresso. Mais um livro de Cécil J\feira brilfta na arena da publicidade como palp itante documen1·0 da inteUgência desse 1noço, a ano– rar, desta vez, em âmb itri de n10Jcle para a debulha da sua ca – pacidade de pensar e exprimfr– se entrP. a filosofia e o devanei o , ''Imagem das Horas". o no1nt por que se dá a . conhecer o li– vro. As horas, no discurso do tempo, são perfeita e tot3hr.~n– te iguais. Uma não d ifere d a ou– tra . Todas contam sessenta nü– nu t os exatos, segundo a mar• cba do relógio do sol , do de ~reia 01.1 do superfino automatico 1110- derno, que sopra a vaidade d<:>s que não sabem o que fazer ue · dinheit·o. Nome (Espec ial para a FOLHA DO NORTE no Es tado - do Pará ) ' ~~~##-li ~.,.~ - Alvaro Lins - Cécil, é claro. cogita das ho– ras que vivemos. nenhuma i gual a outt-a. Vale "Imagem das Ho– ras" p-0r imagens da aln1:1, idé ias, fantasias, fragmentos de son hos e r ealida des. Outros t.endem a considerar Bach únicamente como . músico :religioso. pondo sua ar te a ser – viço da comunid ade protestante !ou. algum<1s vezes. a serviço tia lgreia > Católica. con10 n o caso d as Missas pa ra a côrte de Dres– d eJ. Esqueceu-se de que naquela época a vida profana , a pesar da decadência religiosa. ainda es– ta;va um tanto impregnada do concei to de sacralidade. Bach com todo seu p rof undo mL<ticis– mo. foi um hometn el'lraizaclo na v ida tempor al. pai de vint e filhos. $empre às turras com o Reitor ~ Escola de Leipzig e c om outr as renitentes a.utorida– des. Mas, insisto, . o conceito de, vida não era a.inda separado d o d e .-eligião. Aquela gent e . de re••o. é que estava certa : i;.eli– g i.ão é v ida. e não nega çã,r de v•~ - . :f:. uma corrente que i,ncara a obra do autor d."ls · -;Paixões" denh·o de um - Cl'itério de puro for malismo,. como se ela fugisse à interpretação, como se a fan– tasia estivesse ausente dela . l\1ontados em tal opinião, confe– rem a Bach o titulo de clássico ~em p~r. cento. e, mais do que lSto. ngtd9 e escolástico cem por cento. Outros, pelo contrár io, acel– t:n_n-~o soinente como poét a ro– mant ico. procurando extrair dos Pr-elúclios. das Fugas e dos Co- ~ ConUnúa na 2.a p ágina Sem 9-ualquer hipocrisia ou ostentaçao, Manuel Bandeira compôs uma espécie dé mâsc.ara para o seu convivio cóm os ou– t r os homens : apresenta-se com um sorr iso permanente com a cordialidade no,·mal , coin o as– pecto natural dos que vivem en1 sociedade, e sõ · nos olhc;>s. em baixo da yivaeidad~ e do brilho a!~t~~u!ºâ~~:~ que est ão por com a "Cinza das horas" , livro editado e1n 1917. essa história de uma transf_iguração. Como é di– ferente êsse canto poético da– _quêle antes· lançado pelo jovem de quin~ anos, nos bancos do Col égio Pedro II l O primeiro poem~ da "Cinza das hor as"- logo apr esen ta o contraste, nessa fi– siono,nia de um ser humano marcado pelo destino : • "Sou Dem nascid o. Menino, Fui, como os demais feliz. Denois. veio o meu destino E tez de mim o que quis. Turbou, partiu, ab ateu, Queimou sem razão nem dó Ah . que dôr 't Magoado e só. - Só - meu coração ardeu : Ardeu em gritos dementes Na s ua paixão sombria .. . E dessas horas ardentes Ficou esta cinza fria. - Esta pouca cinza fria .. . H Depois dessa apresentação, te– mos no poe1na seguinte - o · senti– do dos seus versos, a sua manei– r a de fazê-los como se neles colocasse a sua própria =~ên – cia : "Meu verso é sangue", e mais expreslvo ainda : ·"Eu taço versos como quem morre" . E não se poder-ia imaginar maior tris– t e-~a do que aquela que -se r evela nestes versos : "Eu faço ver sos como quem [chora dellencanto..." De desalento... de Ou no soneto "A Ant ônio No– bre·1 : "Com que magoado ·olhar, ma – [góado espanto Revejo em t eu destinó o meu [destino 1 Essa d ôr d e tossir bebendo o ar [fino A esmorecer e desejando tan– [to. . . " De repiante em cretesópolis, no ano de 1912, um poema se f echa com êste verso cortante e amar– gurado : "Ah , como dói viver quando falta a esperança !". :tvlas no soneto com que- encerra "Cin- 7.a das horas", , 1e jâ se fixo~ def i.nitivamente numa .:ititude de · renúncia, já escolheu e ace itou a posição que lhe serà caracterís– tica : "A vid a é vã como a sombra que [p assa . .,. Sofre sereno e d 'alma sobranc~i- , (ra Sem um grito sequer tua des– [graça .Elncerr<1 em ti tu;i tristeza inteil'a, E pede humildemente a Deus [que a faça Tua dôce e constante compa– [nheira" :t a p osiç.ão do solitàrio. O mundo d~ Manuel Bandeira con– centra-se de certo modo no seu quarto. Não em uma casa, mas en1 um quar to : "O meu quarto resume o passado e m tõdas as casas que habitei" . Identifica-se humanarnente, por isso, com os seus objetos como e1n "Gesso" : "Os meus olhos, de. tanto 9lharem Impregriaram-.na da min'.ha hu- Imaniclade irônica de tisico" .E t r a,nsmiti rá d epois imortali– dade ao sett apãrtnnie.nt o d a Lapa com o poema " últlma can– ção do bêeo" , que é o canto de um solitário ao vêr despedaçar– se uma parte de si mesmo na dest ruição de um quar t o com . o qual $e identl.ficara con10 se êle fôsse um outro ser humano. A partir do livro seguinte, "Carnaval", :tYianuel Bandeira parece 1~.:scar uina evasão da– quêle estado de tristeza e deso– l ação que é o fundamento de "Cinza da s horas". E coloca-o em contacto com o delírio aparent e – mente al egre do carnava1. E1n "Sonho de uma terça-feira gor– da" constata, no entanto, que não estava ali - "fóra de nós" - a possivel alegria : "Era - A de ntro de nós que estava fa alegria proíunda, a silenciosa ale- [ . .. ,. grta . .. E no "Epílogo", com qu e en– cerra "Carnaval", encontramos a Anselmo, ser absti·ato no l ivro, tanto pode ser Aôâ(), redivivo E egresso do· p araíso no meio d a gente. como outro rapaz qual– qu"er , que ama e n ega, du vid i a sós, com os seus b otõ~ e a fir• ma em público. Não penso q ue Cée!l se t enha retratado . Andõu catando quid i– dades, aq~:i e aH. Depararam-se– nos, páginas fóra, vá rias infân– cias, múltiplas juventudes. su– jeitos maduros. E valentudiná– rios que de si deram nada no verdc;r dos anos. Há escritores q ue entorn\lm a proJ?ria vid !! nas páginas que plas1nam, simulan do falar de outrem, Há até que,n, como RI– ver" en1 "La Voraginc" , para confundir o leitor. arme o truque de ser o livro um inédito d o es– p olio de imlgínârio Ar tur· Cova, que nunca n lnguem viu t ão gordo. Alerta ·em reiaç.ão a essas sutfle• zas de beletristas. atino que t em nada d e c onfissões o li\!1·0 de Cécil, onde se miniaturrun reta, !ho,; de a lrr•.a~ e co-r;içõe~ apa• nhad02 no recheio de lndi,·i dua– Jidades nu.las, mediocres ou fe• cundas. Deve de ser isto . O tJ'lerlino · levado, que se em– bezerr a a caminho da escol a, e nesta repudia os atrativos da al• f abetização, preferindo disputax aos passarinhos, do alto d,1s ra- 1narias , as aureas goiabas pen– dentes, não é o vivacíssimo Cê- • cil, p~ecoce gln:,siano. como o conheci. por acaso, cm 1925. n1as o filho de tal ricaço. que teima em meter un1 · canudo à mã o do herdeiro orelhudo como un1 coê– lh o - para não tirar dà ' bá ia cwli• mal de n1aior porte, em cujo proveito existe a índústria das e$poras . Cfcil fe.chará os .:>lhos. no seu gabinete de estudos, para con– templ ar, abstrat:nnent e. o qua– dro de párias .que súam a vida inteira• .fore,pj ~ndo no pesado, Cruzam-se neste momento uma tendência pessoal e uma tendên– _ci a poética no destino de Manuel Bandeira . Porque "uns tomam eter, outros cocaína"' - ête in1a– gina também uma fótma parti– cular d.e embriaguês : "Eu já tomei t risteza, hoje tómo ale – gria". Esta é uma fase. a que está refletida em "Libertinagem·~ ·e "Est réia da Manhã", na qual o poéta se afasta um pouco do seu implacável individualismo, da sua mel ancolia intransferível, do seu l irismo tremendamente i nterior~ ta . l!:le parece cansado da sua posição de solitário e die– sejoso de uma libert•ação q).!e o coloque ,taais diretamente em contacto com a vida. Estão em "L i·berlinagem", por exemplo. dois grandes poeinas em que canta cida des : "Evocação do Re– c i:Ce e "Belém do Pará". Ai se encontra1n t.ambem os poen.1as supra-realistas, impulsos de li– bertação pelos movi1nento3 irna– ginativos. ~como "Not u·rno da Parada A:m'or im" e essa obra– pr ima da poesia modernista no Brasil que é "Vot; -n,e e1nbor a pra Pasagarda". Mas Pasugarda é apenas um sonho, un1a evasão itnpossivel. O poéta não se des– liga da sua r ealid,1de essenci al, e ao lado da9-uêle poema, . no mesmo livro . la se ach am "An- ~~ Contin á a n,t 2.a pág ina dorinha" e "Poema de fi nados". De 1nodo sen1elhantc, a verdade é que Ma1u1el se!á ,,Poss1vel sentir ~xt~riormente o "homem triste - çomo êle propno. se intitula num dos seus poem~s - que . e a realldade fundamental da sua ~utênt1ca natureza humana. As vezes, quando ~~.,.,,,..,.~~~~~,.,.,.##-~##,J'i Ócios De Um Espírito Sonolento i Bandeir a nunca s.e pôde entregar inteiramente ao que havia de anárqujco e destruidor no movi– mento modeJ·nista. A partir de "Libertinagem" i,to é certo. êle' escn,ve os seus poemas menos significativos. os si rnpl esn1ente anedóticos ou a pe– nas nulos na verdadeira ordern poé tica - exen1- plos : "Pensão fa,niliar", "Comentário musical", o veJo, recordo-me dêstes versos : " O meu semblante está enxuto. mas a alma, em gotas mansa~ 'c hor a. abismada no luto · d a s minhas desesperanças . . . " J. Alvarez Senior ~ Ouso .. interpretar o que se poderfa chan 1 ar a at~tude p eJsoal de Manuel Ba11deir a, a figura social qu e ele compôs sem artífice 01.1 cálculo co!"o o r~ultado espontâneo do pudpr, do espír itÓ ar1stoctático, da altiva conciência ' com que deli– ber ou guardar pai:a si mesmo e para a arte O seu sofrimento. J_' amais pratlcól.l a vulga1·i~de de explorar ~entimentalmente a ·sua d oença; não quis s~ _comun1c~ com os seus semelhantes em con:fi– denc~s..quetxumes e lamentos. E u rna parte da supenor1dade da obra de Manuel Bandeira pro– .vém dêsse orgulho de .solitário, da sua recusa em pedir socoz:ro~ sentlme11tais; da cap acidade vir il de conviver d1ar1amente com a dôr sem se acovardar diante dos seus p erigos e t ormentos. Se a SlJ<1 doença, a sua tristeza e o seu sofrimento estãõ pre~entes em toda a sua obra poética - isto se v~riflca º!-1 'de modo indireto, com a transfigura– çao ar tistica, ou com u·ma sensação de "humour" d~quêle ''.humour" que significa recusa à compai~ :xao e à p iedade. Na o se petrificou a sua sensibili– dade em ódio à vida, n o melancólico r essentimento dos _venc1d<?s, mas t ambém não se amoleceu em sentu.:_nentahs_mos excessivos ou t ransbordantes. o que ele ouviu textualmente do médico em Cle– vadel - "O sr. t em uma excaval)âo no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado" - colocou no poema "Pneumo-torax", com \1m senso de "hu– moµr" que amplia a comoção, e ·nó quar se en– COI)tra o ver_so que. é , a meu vêr, o mais signifi– eat1vo, o mais exphcativo de toda, a sua obra: ...... : A vida inteira que podia ter sido e que n ão ...,1 • _Em artig_o na "Revista do Brasil", o sr. Fran– cisco de Assis Ba.rbosa divulgQu um soneto de Manuel Bandeh-a, quando estudante do Colégio P edro II aos quinze anos. Oferece naquêles -ver- 110s de adolescente uma paixão d a vida. uma ale– gria, uma espécie de exaltação e deslumbramento q ue se torna agudamente dolorosa em compar ação agora com •a melancolia, com a voz sufocada e nostálgica dos seus ~poemas de "homem t riste". Estudante . da Escola\ Politécruca de São Paulo logo depois do prime,ro ano, a doença corta-Ih~ •b r uscamente a carreira profissional. Em seguida. vem a experiência dos sanatórios, a luta contra a morte, o heroismo dos seus silêncios de soUtário. Mais tarde a entr.ada pela porta estreita, a re– núncia à vida e uma oferenda como que total à •rte poética. A sensação da morte aguça-lhe o itentido da sobrevivência pela arte. E começa SE pudessemos ver s empre - a. mulhe r a quem nos unimos c om os olh os dos que a. desejam, entã o, sim, o __nosso amor seria eterno. Q primeiro a m or .s ossob ra no m ar do esque– cim ento. O últ imo é que s obren ad a.. ~~♦ ' ffA um ôlho a t ravés do qual s urpreendem os coisas que de outro modo não v eríamos nunca: é o ôlho d a fechadur a . ~~~ A mulbe.r é um d emônio, que trás o inferno •consigo, quando se d eita a.o n osso lado. ~~~ ffOºMEM e mulher, q u a ndo noivos, t ra9ai;n p l anos, que o dia seguinte do m atrimô– nio modifica. ~~~ JODA· a g lória tem o seu .ro ch edo d e Sa.nia. H elena.. - ~~~ A MAR e sofrer - dois verbos eterna m ente associados. ~~~ Q sel o d a família é o lugar onde o homem , Julgando-se onipotente, se p ermite exer – cer, sem t emor a. represá.lias, os seus a.tos de mau humor ou brutalida d e, eont ra. a esposa in def esa e os f llhot1 inocentes. f: uma fórma de c ovardia muito generalizada. ~~~ Q amor permanece. Os amores é que _pas– sam. ~~~ A paixão amorosa é como um corpo peza.do , que se despenha nágua.. Primeiro enca– pela ondas, que vão, depois, suavemente. morrer a. distância. ~~· QRDINARIAl\ffiNTE, a ·mulher definitiva não é aquela com quem nos casámos. ~~~ NAO compa r e m !)S o hoj e a o ôntem. qual é um dia bem diferente. ~4~ O d esejo, o prazer e o fastio andam 'DO amor. Cada j untos ♦ ~4> Q amor· dá à mulher, no e no fim, um eito. ~~~ começo, um tron o, CONHEÇO mulheres qlle são oomo a famosa -torre de Pisa. Vivem inclinadas par a os nossos braços e não eáem nunca. ~ ~ ~ AS v iolências e as _injustiças enraizam o ódio e s u gere m a. v ingança. ~ -4~ A m orte é uma nuvem e sp essa, que nos in– t e rcepta para sempre o esp e táculo d a. v ida. ♦ 4>~ EM amor não se projete nada p a ra toda a v ida. nem sequer para o dia seguinte, por.que dentro da pró pria v ida tudo é finito. 4>~~- . . C UPIDO tem à sua d isposição mil p alavr as banais, e sã.o estas q u e perdem as mu– lhe res . ·~· Q m a trimônio é a por ta p or onde & mulher tem aeesso na se nzala. ~~~ A intimidade absoluta s epulta o a.mor no tédfo. · ~~ NKO são raras as mulheres adoráveis, que ja.ma.ts s erão a dora-das. ♦♦♦ EXISTE um a n tagonismo eterno entre a Na– tureza e o Homem. Enquanto aquela perpetuamente se renova., êste envelhece, de– elina e morre. "Porquinho da índia", "Poema tirado de un1 j or– nal:', "O ma ior", "Madrigal. t ão engraçad inl10" - ao mesmo te.mpo em que, por outro lado, en1·i• quecia a su a poética coin problemas e pr oc'essos inteirainente novos, ·mas verificando bem, foram muit o pequenas e reduzidas as suas concessões ao espírito da época. A sua posição histõ-1i.ca colo– ca~se naquêle conceito de T. S. Eliot, se o apll– carmos ao Brasil : um poét a inovador e r evolu– cionar10 não quebra inteiramente; a ordetn tradici onal : insere-se n ela, mas de tal m.odo. que a sua presença perturbadora determina tti na r e– visão ,de todo o passado. Junto a êste conceito geral de Elipt, uma proposição .particular e agu– damente crttica, de Otto . M. Carpeaux : "Está assim detenninado o l ugar h fstó:rieo do poéta : num momento decisivo, cruzou-se com a evolução da poesia brasileira o caminho que levou o poéta Manuel Bandeira para a realizaçjio da sua expe• r iência- pessoal". " Na "Lira dos cinquent' anos", .afinal, sentimos restabelecido o equilíbrio sent imental e litení rio da per sonalidade de Manuel Bandeira. :i!:le nos oferece nesses l)-Oemas da .maturidade o que pode– ríamos ehamar a sua f ilosofia, feita de com– preensão e aceitação do destino . Na "Estrêl a da Manhã", em "Momento num café", já se lia : "t:lste sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade" - verso que se completa com êste da "Li,;-a dos clnq.uent'anos" : • "Morrer sem uma lágrima, que a vida r\ão vale a pena e a dôr de ser vívida" Em po,:,mas como "Testamento" voltamos a encontrar a mesma melancolia, a mesma sensação de irreparável tristeza dos versos de "Cinza das horas'' , apenas mais depurada e mais tranquila . A sua estética atingiu a perfe ição em poema-s como "última can ção do bêco", mas não serã jgualment,:, ; 1·iste a beleza ? "E a beleza é triste Não é triste em si. ·mas 1>elo que há nela de fragilidade e Incerteza" Por que nessa crõnica, uma pequena hon1ena– gem 110 poeta Manuel Bandeira, a propósito dE w;na data de aniversário, escolhi de preferência êste seu tema : a tristeza, a desolaçã<>, a solidão de um h omem mutilado pela doença ? Porque isto CJQ>llca, antel! de tudo, a nobreza da súa. v ida a:a,=- Co.ntixnía Da 2.• N h• .

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