Pará Ilustrado - 1943

Alm_a e _Corpo ! Espirita e Maté– ria! - Eis o eterno poêma trdgi– co dos jovens e mancêbos, na qiwdra feliz das dezoi to prf.m·a– veras ! Ao meu amigo Alcides e Washin– gton Braga, camaradas de SO!J-hos, devaneios, ilusões, tristezas e ale– grias ... Um, dois, três. . . Dezesels, dezesete, dezoi– to . . . Nós estavamas parados, caros a·m igos, a margem da estrada <la Vida, sentados sôbre a relva frêsca e macia <la Inocencia. Contava– mos as pancadas dólentes e pesadas do mara– vtlhoso relogio do Tempo e deixavamo-nos fi– car ali, sem saber o que fazer. Formavamos um grupo de garridas pombinhas despreocupa– das e alheias ao -material-Ismo do Mundo . Para nós, tudo se resumia na Natureza, nessa apo– teóse de luz, nesse paraizo de gloria e fantasia que ela nos proporciona, num espetáculo má– gico e divino, por 'IDS,nhãs frias, deliciosas, per– fumadas, ou por tardes meiancólicas e tristes em que o Sól, perdendo-se no horizonte, man– cha os alvinitentes flócos de algodão, espalha– dos pela face azul do céu, com lágrimas de sangue ... Adm1ravamos os campos, as arvores, o mar, o suá:ve ciciar da brisa nas folhas da mangueira e, muitas vezes, ao voltar da escola, deixavamo-nos ficar, embeYecidos, ouvindo o dellcioso concer-to dos pássaros nos bosques; pelos parques .e jardins. O marulho das folhas, o canto das coleiras, uma valsa ou sonáta ro– mântica e melíflua, tudo era motivo para que sentíssimos apoderar.:.se de nós um sentimen– to extranho, elevado, que nos comunicava ao espirita um pouco de melancolia. Os nossos ·passeios, á noite, pelo cáls; os nossos pic-nics. os nossos "voley-·ball". . . Que éra tudo Isto bons amigos ? Nada mais que um reflexo d; ·nossa aversão pela·matéria, e o desejo de viver em contácto, .a,mar, beijar com ternura as fa– ces e os cabelos da mais formosa e amiga de todas as amantes - aquela em cuja aura de sedução nós divagamos, descíamos aos pélagos profundos, sUlbtamos as nuvens, ·percorriamos o Espaço, visitav·amos as estréias, e que nos deixava f.icar, infensos ao torvelinho do Pro– gresso, em plácido repouso, á margem da es– trada da Vida, sentados sôbre a relva frêsca e macia da Inocencia... : a púlcra Natureza·! Vlviamos n1,1m mundo sonóro, vaporoso, lindo, entre os fascinantes meandros do Estudo e a infinda harmonia dum orbe de poesia : .. U.m dia, ,porém, meus bons am1gos, quando mais fervia em nossa mente o encastelamento dos n'(SSOS sonhos, nesse vergél-paradiziáco errt. que ha-bit avamos, passou por nós uma outra mulher... Era t'ormosa, gractl, e,ncanta-dora com-o, aquela que vivia ao nosso lado, na órla do ca– minho da Vida; mas tinha um "it", um certo e fascinante ;predicado, que nos deixou suspt-. rando a sua passagem . Trajava um lindo e transparente vestido de sendal azul, enfeitado com dlsgos de ouro e prata, nos quais se viam– refletido todos os recantos do Universo; tinha cabelos negros_ e ondulados, tês morena, aceti– nada e um porte extranho, leve, que nos pa– recia vê-la flutuando, como se fosse uma de– licada e pequenina particula de algodão se-. tim . . . Trescalava arômas deliciosos e da for– mosa rosa branca, que levava artisticamente disposta em seus cabelos caídos sôbre os om– bros sem1-nús, -emanava-se um perfume súttl que embriagava o espírito e toldava as idéias, tal qual uma volutuosa essencia de ópio ou mancenllha. Penso, estimados amigos, que já deveis ter deduzido, perfettamente, qual o nome des– ta egêria de tão divina beleza, cujos dentes eram feitos de ouro . Chamava-se Ambição. Quando passou <por nós e nos sorriu, nós nos sentimos desfalecer, deslumbrados pela sua formusura e o poder do seu olhar, que nos fez nascer no coração uma mórbida paixão pela sua atraente silhuêta . Não se deteve, porém, por muito tempo ante o nosso gruipo extasia– do . Em breve par-tia, seguia, como se fosse um turibulo a exala.T eflÚ'vios perfumados, sem,pre garbosa e senhora no seu pórte. ta em busca de outros corações, que estivessem, co– mo nós, á ·beira da estrada da Vida, alheios ao ruido e a poeira levantada pelos que passavam em procura da Comodidade, presos tambem a sedução dos seus lábios pw,p.urinos. Buscava outras almas implumes e frias, nas quais po– desse introduzir e calõr da sua châma e arre– banhar para as fileiras do imponente e ensur– decedor cortêjo que a seguia . Seguimo-la, a principio, a,penas com a vista; depois, entre– tanto, sentimos necessidade de acompanha-la, completamente enleiooos pela graça venusta do seu corpo, pelo brilho ofuscante dos seus dentes de ouro . . . •E então, salmos da beira do caminho, l.e– vant111mos, deixamos os bosques, os campos, a sombra. confortante das mangueiras, para pal– milhar as pégàdas dessa mulher fatal, dessa ninfa mistica e funesta . Debalde sentimos ain– da tenyar resistir o coração, debalde sentimos puxar-nos pela própria alma aquela outra hurí, a amante primeira, cantante, nunca envelhe– cida, dos Jovens e mancêbos de todas as éras ... .Partiamos . . . Nada nos retinha. E agora, enquanto este punhooo de-jovens, de esperanças, o nosso grupo, se dispersa, se- Ll---------------- q IJ. ~ TJJ\JIBOftÓSÉ º CURíl ílS D8RmílTOS8S 3-.J~ e Có-ndeJWa a _B.e&za da .fde, lndispensav·e1 na toilete diaria Vende-se em toda- a parte PARA' LUSTKADO -- LI ~4ft,et," âe {JU,(U .A,Ju,,,u- ~ A bibliografia sobre-o· mundo ama– zonlco já se conta em milhares de vo– lume3 . Faltava, porém·; um--romance ci– tadino, um livro vivido~realmente den– tro dos suburbios. Não uma brochura alegórica, enaltecendo as belezas da urbs paraense, que é a "sala de, espera da • .l'imazonia". Havia mister pâ,ginas de observa– ção e de intimidade com a-, h:umanidade h eterogenea que ali hal:l1·ta: Vai aparecer, entretanto, " QUAR– 'l"ElRAO", novela de costumes e· ambien– tes .sc,ntidos nesses bairros da-gente hu– mi'1de, que nem presta ateação .se· a fe– llcldade existe e a·dota uma·· filosofia M,da- special para encarar a·, vida. Oséas Antunes, um dos-distintas in– telectuais do · nosso meio, que tem se volta,do, com intel\gencia fixauora; pa– ra o cenário e o campo humano•desses sêrcs conformados com a sua, situação social, é o autor desta ol»"a; que por est es dias os prélos da editora· da·• "Re– vista da Veterinaria!' entregará' ao pu– blieo . Pobreza, frateri.i<lade no-, de.soont:or– to, h omens, m'lllheres e crianças, resi– dmdo num quarteirão da cidade, som,-. breada de tunels ·verdes, Indiferentes ; a tmio. festejando os .seus santos,. sep~~ vitimas dos seus próprios f'ados . . Para completar a trama., pa!,Sional', dois a,mantes debatendo-se nos se\1$" comp!exos, e depois as pensões·-e ., os clu– mE's, tudo isso focalizado em "·Qu:iut~ TEIRAO", com segurança de~~r~, ~ r– presstonantes: Faltava, não ·resta duvida-;. u.m liYt~, dessa natureza, que fosse uma- fotogra-- . · fia da gente que súa a camis~ e, arrasta, tamancos. E Oséas Antunes, s.®Qlls es- . creve-.lo, num estilo de agua,-forte, com · ! per~onagens que se atropelam. nas ruas \ e nas f abricas, nos bondes e ItM-; usii.M;. 1 aiegres ou desventura,dos, cada qual com o seu dráma e o seu problema.· a . resol,. ver. • ■- ■■ ............. ···~ gu1ndo aquela tentadora visão cujo sorriso-nos · seduziu ,embora realizemos os desejt>s do nosso-– cérebro, façamo-lo feliz, _não podemos · nega~.. meus ·bons amigos, que sentimos nascer no hi~ . no da nossa alma uma angústia inexplicav-eli. um vazio medonpo, no qual ressôa- lugwbre--. mente o pranto dolororido da prima-. e. incgm,-. paravel amTãnte, a nossa loura e adOrada Na-.. tureza, mais uma vez derrotada pelo sorri,so, doura,cto -da Ambição . .. Belem - 1943. ANTHERO SOE1ft0' .................... _ ... Leia e • anuncie em

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